segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Era da mobilidade

O final de cada ano – pelo menos nesta época atual, caracterizada por um sem número de facilidades proporcionadas pelos avanços tecnológicos – vem sendo marcado, entre outras coisas, pela mobilidade. Multidões, em automóveis – cada vez em maior número, mais velozes e sofisticados (posto que não mais seguros) – se deslocam freneticamente de suas cidades de origem, em direção ao litoral ou ao interior, como se fosse algo obrigatório, enfrentando riscos, desconforto e toda sorte de chateações. Óbvio que não são obrigadas a isso! Mas as pessoas agem como se fossem. Abarrotam rodovias, inseguras, esburacadas e pessimamente sinalizadas, chamarizes de acidentes em sua imensa maioria, como se não houvesse amanhã. Para muitos, não haverá mesmo. Claro que me refiro aos tantos que perdem ou vão perder a vida – por negligência, imperícia ou imprudência, próprias ou de terceiros – em desastres evitáveis, mas que não evitam ou não evitarão.

Mas não são apenas as estradas que ficam superlotadas nessas ocasiões. Observe-se, também, que isso não ocorre apenas em vésperas de Natal e Ano Novo. Repete-se antes de qualquer feriado, principalmente quando ele cai no meio da semana, o que permite que se “enforquem” dois ou três dias úteis de trabalho, para desespero dos patrões. Os aeroportos, inadequados e ultrapassados Brasil afora, superlotam com multidões ansiosas por embarcar para os lugares mais distantes tanto deste país-continente quanto e, sobretudo, para o exterior. Isso não acontecia antes? Bem, depende a que “antes” nos referirmos.

Se a referência for ao ano anterior, ou aos cinco ou dez anteriores, não há muita novidade. A diferença está apenas na quantidade. O contingente desse pessoal que foge de suas cidades como o diabo foge da cruz tão logo apareça oportunidade para tal, sem sequer medir riscos e/ou desconfortos, cresceu muito e tende só a crescer, principalmente em decorrência da melhoria da capacidade econômica de parcela considerável de brasileiros. Contudo, se nos referirmos a vinte, trinta ou mesmo cinqüenta anos atrás, essa mobilidade não deixa de ser espantosa, embora já nos pareça “normal” de tanto que vem sendo repetida.

Não há dúvidas que isso decorre da evolução dos meios de transportes. Esse “nomadismo” contemporâneo desenfreado seria inconcebível, digamos, na década de 30 do século passado. Até porque, antes do governo de Juscelino Kubitschek, o País sequer dispunha de rodovias, nem mesmo das esburacadas e mal sinalizadas de hoje, de que tanto nos queixamos. Tínhamos, apenas, cinco ou seis, se tanto. E no século XIX? Bem, não há o menor registro, em livro algum de escritor da época, de, digamos, “congestionamento” de cavalos nas picadas da Serra do Mar, por exemplo, que demandavam às praias do litoral paulista (nem de qualquer outra, de outras partes muito menos desenvolvidas do País). E nem de carruagens ou tilburis, de famílias mais abastadas, as únicas que poderiam se dar a esse luxo (que não lhes passava nem remotamente pela cabeça, por razões óbvias). Ademais, os banhos de mar nem mesmo eram hábito da esmagadora maioria dos nossos ancestrais.

As viagens para outros países, então, eram extremas raridades. Só eram feitas, salvo uma ou outra exceção, quando indispensáveis, em geral para estudos, ou para negócios, ou para tratamento de saúde em centros mais avançados do exterior. Raros eram os que faziam turismo, como se faz agora. Afinal, o avião sequer havia sido inventado. E quem quisesse conhecer a Europa, os Estados Unidos ou a Ásia, por exemplo, teria que viajar em navios que, mesmo que luxuosos e relativamente seguros (mas não totalmente, pois até a embarcação que “nem Deus poderia afundar”, no caso o Titanic, foi parar no fundo do oceano), eram lentíssimos. Uma viagem de São Paulo a Paris, para citar um caso, que hoje se conta em horas, era contada, na ocasião, em semanas. E, para localidades mais distantes, contava-se, até, em meses.

As seleções de outros continentes, por exemplo, que participaram da primeira Copa do Mundo de Futebol, disputada no Uruguai, em 1930, viajaram para lá de navio. Por isso foram tão poucas as que participaram e muitas delas até desistiram de participar da competição em cima da hora. O mesmo aconteceu com os brasileiros em 1934 e 1938, na Itália e França, respectivamente, que tiveram que viajar, ser não me falha a memória, duas semanas em um transatlântico. Já imaginaram?! Caso os transportes aéreos não evoluíssem como evoluíram, tornando os vôos seguros, confortáveis e rápidos, não tenho dúvidas em afirmar que as Copas do Mundo, as Olimpíadas e todas as outras competições esportivas  internacionais sequer existiriam. Afinal, exigiriam esforço demais por tão pouca coisa.

Fico imaginando como serão os feriados, sobretudo os de finais de ano, digamos, no século XXII (isso, claro, supondo que o mundo sobreviva até lá e que nenhum maluco promova sua aniquilação). Como serão os transportes na virada de 2113 para 2114? Nossos descendentes demandarão praias de qualquer parte do Planeta, como fazemos agora, ou optarão por viagens mais ousadas e infinitamente mais longas, hoje impossíveis, para alhures, para algum  remoto planeta além do Sistema Solar? Isso, hoje, está muito além da imaginação. Assim como nossos hábitos atuais estariam, ressalte-se, para nossos ancestrais, caso ressuscitassem e vissem como nos comportamos hoje. Enfim...

Boa leitura.

O Editor

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