sábado, 20 de março de 2010


Osman Lins revisitado

* Por Luiz Carlos Monteiro

Dois livros contendo ensaios sobre o escritor pernambucano Osman Lins e sua obra foram publicados por ocasião da passagem dos 80 anos de seu nascimento. Nascido em Vitória de Santo Antão, a 5 de julho de 1924, após a adolescência o autor de Avalovara passou o restante de sua vida entre o Recife e São Paulo, tendo feito algumas viagens ao exterior.

Publicado pela UFPE, Vitral ao sol – ensaios sobre a obra de Osman Lins, com organização de Ermelinda Ferreira – reúne colaborações internas e externas à universidade, incluindo também depoimentos das filhas do escritor. Os textos trazem a empatia e a admiração de leitores especializados ou especialistas na obra osmaniana, que analisam a sua prosa em manifestações modelares como a ficção inicial, ligada ao regionalismo, e posteriormente sustentada nas descobertas e inovações estruturais mais independentes e arrojadas. É também analisada a ensaística dos “problemas inculturais brasileiros”.

Mesmo o seu último trabalho, A cabeça levada em triunfo, inacabado, merece um ensaio da própria organizadora, onde se pode ler que, “sentindo-se próximo do fim de sua vida, Osman Lins, crítico de si mesmo, põe simbolicamente a cabeça a prêmio no seu romance inacabado, antecipando as decapitações futuras, os desmembramentos e esfacelamentos a que sua obra estaria sujeita com a sua partida”.

A ruptura dos limites entre a prosa e a poesia no texto osmaniano é enfatizada com rara argúcia por Lourival Holanda: “A prosa de grande densidade poética de Osman desfaz as fronteiras: porque seu sentido não se separa da musicalidade, de um certo ritmo, próprios da poesia, da melhor poesia”. Lourival é fundador do grupo de pesquisa Sol – Sodalício Osman Lins, que vem realizando encontros e eventos destinados ao estudo de literatura, e neste momento comemorativo mais específico, à obra de Osman Lins.

Em Vitral ao sol podem ser lidos também textos inéditos em livro do próprio Osman, de enfoque mais jornalístico que acadêmico, onde se destacam, por exemplo, uma “homenagem à memória intelectual” do crítico Anatol Rosenfeld e uma análise comparativa das obras dos pintores pernambucanos Eliezer Xavier e Aloísio Magalhães.

Osman Lins – o sopro na argila, organizado pelo mineiro Hugo Almeida e publicado em São Paulo, pela Nankin Editorial, segue também a linhagem acadêmica. Do mesmo modo que em Vitral ao sol, alguns ensaios aparecem excessivamente carregados de citações de origens diversas e misturam a prosa acadêmica que se reivindica mais racional e pensada com os mais medíocres lugares comuns.

A estética da recepção faz-se presente num texto da tradutora francesa Gaby Kirsch, que mapeia como se comportaram edições dos livros O fiel e a pedra, Nove, novena, Avalovara e A rainha dos cárceres da Grécia no Brasil, na França e na Alemanha, em termos de público, crítica e editores.

Sandra Nitrini, responsável pelo arquivo de Osman Lins na USP, estuda um livro diferenciado em sua obra, Marinheiro de primeira viagem, que é um relato de uma viagem à Europa, escrito como prosa memorialística com entradas de ficção. Num bloco desta coletânea é avaliado ainda, sob enfoques diversos, Avalovara, e igualmente, noutro bloco, A rainha dos cárceres da Grécia. Comparecem também textos de nomes consagrados como Modesto Carone e José Paulo Paes, este último amigo de Osman e prefaciador de Avalovara.

Uma das exceções ao texto acadêmico é o depoimento de Lauro de Oliveira, outro participante do Sol, que foi amigo e colega de trabalho do romancista em instituição bancária, militando permanentemente na divulgação do seu nome e sua obra. Oliveira elabora uma espécie de minibiografia, contemplando aspectos vivenciais como a convivência no trabalho, em família e com intelectuais, a necessidade paralela de desenvolver o ofício literário e, em certos momentos, as profundas inquietações pessoais e éticas osmanianas.

(Continente, ano IV, nº 45, set. 2004; aqui, com pequenas alterações.)


* Poeta, crítico literário e ensaísta, blog www.omundocircundande.blogspot.com

2 comentários:

  1. Sempre vale a pena, talvez quem nunca tenha tido
    acesso a obra de Osman Lins o faça agora, o leitor
    vai se surpreender com a dinâmica do autor.
    Abraços

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  2. Estou transcrevendo em http://varioscantos.blogspot.com/

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