Precocidade literária
A carreira literária de
João Ubaldo Ribeiro, pode-se afirmar, sem receio de equívoco, foi bastante
precoce. Começou muito cedo, quando ele tinha, apenas, 18 anos. Considero, no
caso, o início, o ponto de partida, o chamado “start”, a publicação do primeiro
livro. Nesse aspecto, lembra um pouco Victor Hugo, entre outros. Em texto
anterior, afirmei, equivocadamente, que os primeiros três contos desse escritor
incontestável, a serem publicados, foram os inseridos na “mini-antologia” “Reunião”,
junto com os de David Salles, Sônia Coutinho e Noênio Spinola, obra esta datada
de 1961. Não foram.
Errei e errei feio! Meu
erro deveu-se a certa desorganização (diria, profunda e contundente) em meus
arquivos pessoais, em que algumas anotações são feitas em pequenas tiras de
papel, em papeluchos às vezes minúsculos, fáceis, portanto, de se embaralhar,
de se misturar e até de se perder, não raro no verso de maços de cigarro ou em
qualquer outra superfície sobre a qual seja possível de se escrever. Estudos
como este, porém, posto que informais, não admitem informações equivocadas, não
importa o motivo do equívoco. Aliás, em qualquer tipo de texto, se for para
informar errado, é melhor que não se informe nada. E justo um jornalista,
comprometido com a exatidão, como é o meu caso, foi cair nessa esparrela! Mas
há tempo para a correção. E lá vai ela.
A primeira publicação
literária de João Ubaldo Ribeiro foi do conto “Lugar e circunstância”, de 1959.
Ele foi inserido na antologia “Panorama do conto baiano”, publicada pela
Imprensa Oficial do Estado da Bahia. Sabem o que o jovem futuro astro literário
fazia, na ocasião, para ganhar a vida? Era “office boy” do Gabinete do Prefeito
na Prefeitura de Salvador!! Quem poderia desconfiar que aquele quase garoto,
que mal começara a engrossar a voz, tinha todo o talento que mostrou na
sequência e que já “rabiscava” contos publicados em jornais e até mesmo um
romance? É verdade que não tardou para o moço talentoso ser promovido, tão logo
seus superiores hierárquicos leram alguns de seus textos. Foi guindado à função
de redator da Secretaria de Turismo. “Reunião”, publicado pela Universidade
Federal da Bahia, portanto, não foi o primeiro, mas foi segundo livro de João
Ubaldo Ribeiro, posto que na companhia de três escritores mais idosos e mais
experientes do que ele.
Aliás, foi dessa mesma
obra coletiva que os organizadores de “Histórias da Bahia” (Edições GDR, Rio de
Janeiro, 1963) – que, embora o leitor já esteja farto de saber (mas que
reiterarei ainda muitas vezes) tomei por base para esta série de estudos sobre
alguns dos principais ficcionistas baianos – extraíram o conto “Josefina”,
entre os três que então publicou. Os outros dois tinham os títulos de “Decalião”
e “O campeão”. Pronto, está reconstituída a verdade histórica. Afinal, o início
de qualquer coisa (principalmente de uma carreira literária) é importantíssimo
na trajetória de qualquer pessoa. Ninguém esquece sua primeira vez, seja no que
for. No caso de João Ubaldo, não teria porque ser diferente.
Foi no mesmo ano de
publicação de “Histórias da Bahia” , ou seja, em 1963, que o então já promissor
escritor escreveu o primeiro dos seus dez romances, muitos dos quais
transformados em filmes que esgotaram bilheterias e um, até (“Miséria e
grandeza do amor de Benedita”) se tornou o primeiro livro virtual lançado no
Brasil, datado de 2000. Há uma série de curiosidades em torno dessa sua
primeira obra de ficção de fôlego, que não posso deixar de destacar. A
primeira, refere-se ao seu título. O original, dado pelo autor, era “A Semana
da Pátria”. Todavia, a editora sugeriu (ou impôs?) que fosse “Setembro não faz
sentido”, que o autor acatou. Foi com esse nome que o romance em questão veio a
público.
Outra curiosidade é que
o livro foi publicado, apenas, cinco anos depois de escrito. Essa demora entre
a produção e a publicação torna-se mais intrigante e chama mais a atenção
quando se sabe que o prefácio foi escrito por ninguém menos do que Glauber
Rocha, àquela altura já uma celebridade nacional. E mais, o primeiro romance de
João Ubaldo contava com o “apadrinhamento” do mito literário Jorge Amado! O que
aconteceu, pois, no meio do caminho, para que o livro – que ainda assim foi a
primeira obra do autor no gênero – demorasse cinco longos anos para ser
lançado? Da minha parte, ignoro. Talvez apenas os envolvidos na questão saibam explicar.
Eu não sei.
O fato é que depois de “Setembro
não tem sentido”, os romances de João Ubaldo Ribeiro sucederam-se, até com
certa regularidade, embora relativamente espaçados entre uns e outros. E estes
foram, pela ordem: “Sargento Getúlio” (1971), “Vila Real” (1979), “Viva o povo
brasileiro” (1984), “O sorriso do lagarto” (1989, transformado em memorável
minissérie da Reder Globo), “O feitiço da Ilha do Pavão” (1997), “A casa dos
Budas ditosos” (1999), “Miséria e grandeza do amor de Benedita” (2000), “Diário
do farol” (2002) e “O albatroz azul” (2009). O que virá depois? Não há como
saber. Mas seja o que for, sendo de João Ubaldo Ribeiro, certamente será nova
obra-prima e provavelmente best-seller. Ouso apostar nisso.
Boa leitura.
O Editor
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Li apenas "A casa dos budas ditosos", sobre a luxúria, numa sequência de sete obras sobre os pecados capitais.
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