Vitórias
* Por
Gustavo do Carmo
Na fila do banco, cinco mulheres de
idades e classes sociais diferentes contam como foram batizadas com um mesmo
nome: Vitória.
Maria Vitória, uma rica empresária, aparentando
uns sessenta anos, conta que nasceu de um parto difícil em que ela e a mãe
quase morreram. Por isso ganhou o nome que muitas mulheres recebem quando
superam um momento dramático no nascimento.
A segunda Vitória, jovem estudante de
classe média, dezoito anos, pele clara e olhos verdes, conta que nasceu
prematura, após um trágico acidente que ganhou até as manchetes do jornal. Ficou
três meses na incubadora, quase morreu de meningite e foi registrada como uma
promessa de seu pai.
A terceira Vitória é uma jornalista de
vinte e cinco anos, que também virou notícia de jornal quando nasceu. Fora
achada no lixo por um gari. Quase foi levada ao triturador do caminhão da
Comlurb. Adotada por um casal de comerciantes, donos de uma padaria na Tijuca,
cresceu, estudou e se formou.
A quarta, uma vendedora de sapatos de
quarenta anos, tem uma vida simples e tranqüila. Nunca correu risco de morrer
em seu nascimento. Mas de sequer ser gerada. A mãe fez diversos tratamentos
para poder voltar a engravidar depois de três abortos. Já não acreditava mais
em ter uma gestação quando, nove meses depois, ela nasceu. Quase adotou uma
criança. Ao procurar o juizado de menores sentiu um enjôo forte. Em vez de ir
conversar com a assistente social, foi para o médico, que lhe deu o feliz
diagnóstico. Estava grávida. A felicidade aumentou quando o bebê vingou e pôde
estar, aos trinta e dois anos, com muita saúde, no banco pagando a última
prestação da casa própria. Recebeu o nome de Vitória dos Milagres.
Somente a quinta teve uma história
diferente. Empregada doméstica, pouco mais de cinqüenta anos, seu parto foi
tranqüilo em uma fazenda de cacau em Itabuna, na Bahia. Filha do peão com a
lavadeira, sofreu apenas com o nível social em que sempre viveu. Atualmente,
mora em uma favela com o marido e os dois filhos.
Com o seu sotaque nordestino, contava,
se divertindo, que no dia do seu nascimento, a mãe a estava parindo, com a
ajuda da mulher do fazendeiro e outras lavadeiras. O pai nem ligava para o
nascimento da filha. Ouvia a decisão do campeonato baiano pelo rádio. Só
desviou a atenção do jogo por causa do choro do neném. Quando foi perguntado
pela esposa que nome a filha deveria se chamar, ouviu o apito final e saiu
comemorando aos berros: VITÓRIA!!!!
— O Vitória foi campeão e eu fui
batizada com o nome do time de coração do meu pai.
Uma sexta mulher, senhora de setenta e cinco
anos, ouvia atenta a conversa entre as cinco Vitórias, principalmente a última.
Sarcástica, entrou na conversa e completou:
— Pelo menos o seu pai não te registrou
como América Campeã dos Campos Sales.
*
Jornalista e publicitário de formação e escritor de coração. Publicou o romance
“Notícias que Marcam” pela Giz Editorial (de São Paulo-SP) e a coletânea
“Indecisos - Entre outros contos”.
Bookess -
http://www.bookess.com/read/4103-indecisos-entre-outros-contos/ e
PerSe
-http://www.perse.com.br/novoprojetoperse/WF2_BookDetails.aspx?filesFolder=N1383616386310
Seu blog, “Tudo cultural” -
www.tudocultural.blogspot.com é bastante freqüentado por leitores
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