sábado, 29 de agosto de 2015

Amante da linguagem dos anjos



A poesia não quer adeptos: quer amantes”. Quem declarou isso, com tamanha ênfase, foi o poeta espanhol Federico Garcia Llorca. Trata-se de uma arte que “não comporta gralhas como a prosa”, conforme declarou a poetisa portuguesa “Florbela Espanca”, em carta a um amigo, que consta do livro “Correspondência”. “É coisa tão delicada que só vive de ritmo e de harmonia”, justificou. E concluiu: “Quase dispensa as ideias. Quem lhe tocar, assassina-a sem piedade”. Concordo com essa colocação. Como também concordo com Fernando Pessoa, que escreveu, em determinado trecho do “Livro do Desassossego”: “Os críticos podem dizer que determinado poema, longamente ritmado, não quer, afinal, dizer senão que o dia está bom. Mas dizer que o dia está bom é difícil, e o dia bom, ele mesmo, passa. Temos, pois, que conservar o dia bom em memória florida e prolixa, e assim constelar de novas flores ou de novos astros os campos ou os céus da exterioridade vazia e passageira”.

Aliás, a poesia “nasceu” da necessidade humana de preservação. Foi o primeiro gênero literário exercitado por pessoas sensíveis e inteligentes até mesmo antes da invenção da escrita. Como?!!! Dado seu caráter mnemônico, foi o engenhoso artifício inventado por nossos remotíssimos ancestrais para servir como uma espécie de primitivo “arquivo” de fatos, descobertas, idéias e sentimentos, passados, oralmente, de uma geração a outra. As pessoas decoravam os poemas e passavam-nos adiante e assim o conhecimento era (e foi) preservado por anos a fio, por décadas, séculos, quiçá milênios (só não se sabe quantos), até a criação da escrita.

“Não é possível viver sem poesia, por mais que se afirme o contrário. A poesia hoje possui uma conotação e função absolutamente peculiar. A mais antiga forma de arte está presente nas mais variadas maneiras expressivas, basta que se preste atenção aos textos e mensagens que nos rodeiam nas atividades do dia a dia. A poesia, sem desejar polemizar, está no povo, na natureza e na longiquitude do espaço sideral”. O autor dessa afirmação é um poeta. Só poderia ser! Mas ele vai além dessa condição (que, convenhamos, não é pouca coisa, mas é nobilíssima). É, também, romancista, historiador, cronista e... professor. Refiro-me ao escritor catarinense Harry Wiese, do qual tenho em mãos os dois mais recentes livros que lançou pela Editora Nova Letra: “IbirAMARes e outros poemas” e “A história das árvores-homens e outras crônicas”.

Calma, paciente leitor! Antes que você ache que cometi erro de digitação no título do livro de poesias vou logo avisando que ele é, mesmo, “IbirAMARes” (com o AMAR em maiúsculas). Como se vê, não errei. É uma forma inteligente que o autor encontrou para destacar seu amor pela cidade catarinense de Ibirama, que ele adotou (na verdade, foi adotado por ela), posto que é natural do município de Presidente Getúlio, igualmente do Estado de Santa Catarina. Antes de mergulhar de cabeça nesse primoroso livro (uma jóia tanto no que se refere ao conteúdo, quanto à bem cuidada edição), o que farei oportunamente, é mister que apresente, mesmo que resumidamente, quem é este sensível poeta.

Harry Wiese tem 66 anos. Vai completar 67 em 13 de novembro (nasceu em 1948). É licenciado em Letras – especialista em Metodologia de Ensino – e Mestre em Educação do Ensino Superior. Tem vasta experiência em revisão de textos (TCCs, monografias, dissertações, teses, artigos científicos, livros técnicos e de literatura). Conta com 48 anos de experiência como professor de língua portuguesa - do ensino fundamental até cursos de pós-graduação em diversas universidades. É pesquisador da história da colonização do Vale do Itajaí, em Santa Catarina.

Harry Wiese conta, com todos os méritos, com o reconhecimento de seus co-estaduanos (ainda bem!).  Em 1999 foi agraciado com o Diploma e Medalha Anita Garibaldi pelos trabalhos em prol da cultura no Vale do Itajaí do Norte. Em 2007, recebeu o título de Cidadão Honorário de Ibirama, outorgado pela Câmara de Vereadores local, em reconhecimento aos serviços prestados à coletividade nos campos da educação, cultura e pesquisa histórica do município. Em 2009 foi condecorado com Diploma de Mérito, categoria romance, pela publicação de “A sétima caverna”, editora Hemisfério Sul, pela Academia Catarinense de Letras. Falta, agora, reconhecimento nacional. Méritos para tanto não lhe faltam.

Com o recente lançamento dos dois livros que citei, conta com considerável bibliografia, que ascende a já dez publicações, passando por vários gêneros. É autor das seguintes obras: “Meu canto-amar”; “Girata de espantos”; “Nebulosa de amor: Contos e poemas de Natal”; “A sétima caverna”,”De Neu-Zürich a Presidente Getúlio: uma história de sucesso”; “A inserção da língua portuguesa na Colônia Hammonia”: “Terra da fartura: história da colonização de Ibirama”: “Teoria da Literatura”: “IbirAMARes e outros poemas” e “A história das árvores-homens e outras crônicas”. A despeito de sua longa trajetória no magistério, de quase meio século, continua em plena atividade. Harry Wiese é professor no Colégio São Paulo, de Ascurra e funcionário da UNIASSELVI de Indaial.

Como se vê, é exemplo de dedicação, idealismo, competência, longevidade, inteligência e muita, intensíssima criatividade. Mas... Ele próprio confessa o que eu apenas desconfiava: “Minha vida literária tem sua gênese na poesia”. Porém, não como mero adepto. Harry Wiese é, antes de tudo, “amante” desse nobre gênero. Cumpre, pois, o que Garcia Llorca considerava imprescindível. É, utilizando linguagem poética, “bafejado pelas musas”. Exercita, com habilidade, emoção e assiduidade, “a linguagem dos anjos” que é como Rainer-Marie Rilke caracterizou, com rara felicidade, a poesia.

Boa leitura.

O Editor.

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Um comentário:

  1. Antes de conhecê-lo Pedro, e me interessar um pouco mais pela poesia, eu já ficava encantada com poemas musicados e uma vez escrevi que se os poetas não existissem, teriam de ser inventados. Não fui original, mas fui sincera, pois as agruras da vida, se amenizam quando se ouve poemas.

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