domingo, 1 de agosto de 2010




Módulo de verão



* Por Adélia Prado

As cigarras começaram de novo, brutas e brutas.
Nem um pouco delicadas as cigarras são.
Esguicham atarraxadas nos troncos
o vidro moído de seus peitos, todo ele
(chamado canto) cinzento-seco, garra
de pêlo, arame, um áspero metal.
As cigarras têm cabeça de noiva,
as asas como véu, translúcidas.
As cigarras têm o que fazer,
têm olhos perdoáveis.
- Quem não quis junto deles uma agulha?
- Filhinho meu, vem comer,
ó meu amor, vem dormir.
Que noite tão clara e quente,
ó vida breve e boa!
A cigarra atrela as patas
é no meu coração.
O que ela fica gritando eu não entendo,
sei que é pura esperança.

* Adélia Prado é uma das principais poetisas brasileiras da atualidade, autora de vários livros de sucesso. .

Um comentário:

  1. A briga da poeta com as cigarras que a devem atazanar por dias, nos rendeu esse poema rascante, tal qual o canto das cigarras.

    ResponderExcluir