sábado, 17 de dezembro de 2016

“O show vai começar”


* Por Mara Narciso



“Por favor, desliguem seus celulares ou os deixem no silencioso. Peço para que não filmem nem tirem fotos. Obrigada!”

Sabe-se que foram dez meses de trabalho do Pátio Flamenco em Montes Claros. Elisa Pires, montes-clarense formada em psicologia, dedica-se à dança flamenca desde a adolescência. Para horror do seu pai, o neurologista Francisco Almir Pires, já falecido, largou uma carreira tradicional para se dedicar à dança e dela entender tudo como dançar, ensinar, coreografar, dirigir, produzir, planejar cenário, figurinos, maquiagem, adereços, entender os meandros de como administrar, buscar patrocínio, contratar, divulgar, comprar, motivar e levar grupos em viagem para o mundo flamenco com resultados inacreditáveis. A professora, depois de possuir uma escola de dança em Belo Horizonte durante anos, volta à sua terra para plantar sementes e, agora, colhe a boa safra no I Festival de Dança Flamenca de Montes Claros, no Centro Cultural Hermes de Paula, com duração de três dias.

Com bom público, tem início a apresentação de quase duas horas, que começou no horário e, sem intervalo terminou numa grande festa. Simples, porém eficaz, o cenário, com forte componente vermelho, traz um pouco da Espanha para a nossa cidade. Tudo acontece com música ao vivo, onde se ouve o brilho do som da guitarra flamenca de Micael Pancrácio, de Belo Horizonte, um virtuose inegável e parceiro musical de Elisa Pires. De Londrina veio o cantor Ozir Padilha, com voz potente, emitindo sons de alegria ou lamento, o que dá um tom dramático em certos momentos do festival. O cajon, instrumento de percussão, foi dominado por João Paulo Drumond, também de Belo Horizonte.

A apresentação dos grupos constou de onze músicas, sendo três solos da grande bailaora Elisa Pires, uma artista cuja dança moldou seu corpo, mente e todo o seu comportamento. A paixão pela profissão e a sua segurança no palco a fazem se agigantar, e ao se aproximar dela observa-se que tem uma estatura menor da que aparenta em cena. Sua força e energia intermináveis são para ser copiados, além da feminilidade, graciosidade e garra, naturalmente transferidas aos seus pupilos.

Ainda que iniciantes, o resultado obtido pelos alunos da coreógrafa surpreende até a eles próprios. Com visão e experiência, Elisa Pires consegue extrair o melhor de cada um, exacerbando as qualidades e minimizando as falhas. Estas foram poucas, como, por exemplo, a não cronometragem entre os gestos, mas que não atrapalha o conjunto, devido à meiguice e delicadeza de algumas componentes, especialmente crianças, meninas graciosas e encantadoras, que parecem ter nascido para dançar. O flamenco também está indicado para homens e meninos, e a maneira deles dançarem mostra as características do gênero, tais como força e vigor. João Pires saiu-se bem representando o lado menino. Foi bom vê-lo dançar, no centro do palco, solto, fazendo gestos de cavalheiro com seu chapéu. Também Alê Teixeira fez dueto com a bailaora Elisa em dois momentos.

Houve apresentação com leques e castanholas, adereços que enriquecem a dança, assim como a presença dos palmeros postados ao lado dos músicos, incrementando a percussão. Em cena, algumas alunas com habilidades incomuns saltaram do conjunto, e irão longe.

A dança flamenca, com seu sapateado firme e gestos delicados das mãos, no caso das mulheres, traz inúmeros benefícios, pois desinibe, entrosa, exercita, melhora a memória e a coordenação, traz convívio, segurança, equilíbrio, força, alegria e prazer. Veja o show e depois vá se juntar aos alunos. Caso entenda que não tem jeito para a coisa, saiba que Elisa Pires tira leite de pedra, e quando encontra um terreno fértil, aí sim, sua obstinação cria uma nova pessoa, num novo mundo.

*Médica endocrinologista, jornalista profissional, membro da Academia Feminina de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico, ambos de Montes Claros e autora do livro “Segurando a Hiperatividade”   




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