quarta-feira, 1 de setembro de 2010




Slogans políticos 2010: “Por um mundo novo”

* Por Mara Narciso

Todos sabem o que são slogans, ou pelo menos os conhecem e os repetem sem perceber. É palavra ou frase usada com frequência, em geral associada à propaganda comercial ou política, diz o Dicionário Aurélio. O slogan bom entranha no cérebro do receptor e se cola sem possibilidade de resistência. Para ser lembrada, a frase não precisa ser criativa ou inteligente. A lavagem cerebral travestida de impregnação dos sentidos é confirmada à medida que se repete o refrão do jingle político.

Numa caminhada pelo centro, em pouco tempo pode-se acumular muitas dessas frases que se pretendem audaciosas, e que têm por objetivo tirar o candidato do limbo do anonimato, jogando-o na ribalta, no grupo dos políticos discutidos, disputadores das cabeças das pesquisas de opinião.

Algumas frases do contexto eleitoral soam pretensiosas, arrogantes, prepotentes, vindas de pessoa que finge poder resolver os mais complexos problemas da nossa sociedade. O que acham de “Coragem e atitude para Minas avançar”? Aliás, para ser político, é imprescindível que haja montes de coragem. Numa democracia parece-me exagero. Outra frase diz assim: “Coragem para mudar”. Se for para pior é preciso ter muita coragem.

A “mudança” é outra figurinha dos dizeres políticos. Mesmo os candidatos continuístas não se esquecem de prometer mudanças. Indica que o ser humano não fica parado, nem num lugar, nem numa situação. É preciso mudar.

Confiar em quem vai ser votado é indispensável: “Dê seu voto de confiança”; “Meu trabalho você conhece”; “Neste eu confio”; “Credibilidade e confiança”; “Esse tem o meu voto”. E ainda, vigor e convicção no cultor de si mesmo: “Amizade e trabalho”; “É com este que eu vou”; “Eu também voto”; “ O meu voto vale”, enquanto o desfile de egos continua.

A ilusão é um sentimento difícil de explicar. É possível que muitos tenham esse sentimento em diferentes intensidades. O candidato que entra numa campanha política precisa ter por princípios: estar certo de que vai vencer; ser convicto de que é o melhor de todos; não perder tempo com humildade, a falsa e a verdadeira, como a frase desse slogan: “Humildade e competência”, ou seja, duas mentiras num só slogan.

Para alguns soam como discursos arcaicos, mas em todas as eleições essas falas estão de volta em níveis mais ou menos raivosos, pois mencionam lutas e guerras em tempo de paz: “Rumo ao socialismo”; “Salário trabalho e terra”.

Poucos políticos confessariam, mesmo aos correligionários, que não acreditam na vitória. Até quando os oponentes invadem seu território, anulando o poder do seu trabalho, ou ainda, quando sentem que a verba escasseou, não se atrevem a pensar, e nem ao menos dizer que a batalha está perdida.
E o bairrismo exacerbado: “Minas no caminho certo”; “Somos Minas Gerais”; Minas a favor do Brasil”. O candidato que fosse contra o Brasil seria tão mal visto quanto alguém que confessasse ser contra a Seleção Brasileira de Futebol.

A repetição tem por fim executar a lavagem cerebral. Entre os cinco itens mais badalados estão segurança, moradia, educação, emprego e saúde, que é a campeã. Não é para menos que dezenas de slogans a tenham em sua frase: “Saúde em primeiro lugar”; “Bom para a saúde”; “Compromisso com a saúde”; “Pra saúde seguir em frente”. Mas o que quer dizer isso? Nunca vi saúde seguindo para trás. Deve ser um novo conceito. Outros largam a saúde e vão pela vida: “Compromisso pela vida”. O bem e o mal também flutuam entre as frases: “Fazendo o bem”; “Saber fazer bem”. Não creio que algum publicitário experiente ou aprendiz ousaria contradizer esses dizeres do senso-comum.

“Tudo pela educação”, concretizando-se a intenção, toda a estrutura eleitoral se modificaria. Voto não obrigatório leva mais gente letrada às urnas ou o contrário? Há as pesquisas e confio nelas, mas, sabendo de décadas, que a tendência inicial das urnas não costuma mudar, ainda assim é bom contar os votos antes de estourar os rojões.

Dentre as pretensões deslavadas, para não dizer puro esnobismo está a frase: “Esse faz a diferença”. Caso ganhe, fará a diferença sim, mas para si próprio. Entre os 135 milhões de eleitores, considerar-se único é ser megalomaníaco. Mas, imaginemos um candidato a Presidente da República sincero, que queira de fato ser presidente, mas não se considera grande coisa, acreditando que muitos outros estão ao seu nível ou acima dele. Como seriam os discursos dessa campanha?

Após militar na política por 25 anos, convicta das questões ideológicas, fazendo currículo de candidatos, discursos, cartilhas, textos, slogans, símbolos, letras de jingle, pescando votos em todos os bairros, desfraldando bandeiras, vestindo camisetas, fazendo arrastões, e usando argumentações conforme a platéia, o trabalho foi suspenso há cinco anos. Por fim e gratuitamente ofereço duas conclusões: para cada dez votos prometidos sob juramento, contabilize um. E embora os políticos gozem de péssima fama entre os brasileiros afirmo: mais falsos do que os políticos, só mesmo os eleitores. Afirmo e dou fé.

*Médica, jornalista e autora do livro “Segurando a Hiperatividade”.

6 comentários:

  1. Excelente texto, Dra. Mara. E olha que sou publicitário, heim (mas não faço campanha política). Abraços e parabéns.

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  2. Mara depois de assistir a campanha do Tiririca
    dou por encerrada o meu quinhão de paciência.
    E, concordo contigo eleitores de má fé tem
    aos montes.
    Abraços

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  3. Não concordo na falsidade dos eleitores. Cadê o respeito a divulgação de muitas mensagens dirigidas aos eleitores? Os candidatos políticos estão eufóricos na caça de votos. Está faltando contratarem o judoca garoto-propaganda para gritar nervosamente no vídeo: "Me dá! Me dá o voto!", ou Tirica falando: "Vivo disso graças a Deus!" "Caipira ô Caipira,/ a gente não é bandido,/ e o meu voto ninguém tira..." É vergonhoso! Muda Brasil!...

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  4. Tema sério tratado com inteligência e humor! Abraços, Mara!

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  5. mesmo com todos essas frases de efeito patenteadas e palhacinhos querendo avacalhar o processo democrático, essas eleições prosseguem sendo as mais desanimadas e cheias de marmelada da história recente
    acho até que os candidatos que já sabem que vão perder, mas sentem a necessidade de manter a pose, deviam era parar de gravar programas

    apesar de tudo, são as eleições em que decidimos quem serão nossos mandantes. então, se nos próximos 4 anos o sertão virar mar, a culpa é toda nossa.

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  6. Marcelo, quando eu fazia essas campanhas gostava muito, e ia só na intuição. Crescemos e ganhamos experiência.

    Núbia, os candidatos nos veem na obrigação de ouvirmos suas mais diversas asneiras.

    Calvino, não deveríamos ser loucos a ponto de embarcar em generalizações, mas, como conheci eleitores que prometiam seus votos com as caras mais limpas, aos mais diversos candidatos, não resisti em considerar que boa parte deles são tão ou mais falsos que os políticos. Como em tudo, temos exceções.

    Sayonara, obrigada pela inteligência e humor. Gosto de acreditar no seu comentário.

    Fernando, somos os responsáveis pelos resultados eleitorais. Resmungar é a praxe, mas não adianta.

    Obrigada gente, pelos comentários.

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