sábado, 29 de maio de 2010


Crônica esportiva

Caros leitores, boa tarde.
Volta e meia sou questionado, principalmente por estudantes, se a crônica esportiva, notadamente a que versa sobre essa paixão mundial, que é o futebol, é literatura. Minha resposta, invariavelmente, é a mesma: depende de quem a escreve e da abordagem que lhe confere. Há pessoas que, embora lidem com texto e façam dele seu ganha pão, não vibram com o que escrevem. Sua escrita é chata, monótona, formal e sem graça.
Um redator talentoso, criativo e original é competente o suficiente para fazer de uma bula de remédio literatura de primeira linha. E há outros tantos que, por melhor que seja o assunto que se propõem a abordar, se perdem em bla-bla-blás sem pé e nem cabeça e despidos de conteúdo.
A crônica, esportiva ou não, para merecer de fato essa designação, não pode ser factual. Ou seja, não pode se esgotar tão logo o acontecimento que a gerou se esgote. Textos assim têm designação própria: são artigos. Estes sim têm que se ater rigorosamente a fatos e não fazem concessões a reflexões e muito menos a divagações. A maioria das pessoas confunde, a todo o momento, os dois gêneros, um jornalístico e o outro literário.
Tenho lido com assiduidade grandes cronistas esportivos, dos quais o mestre dos mestres foi, sem dúvida, o já saudoso Armando Nogueira. Ele comentava, sempre com elegância e inteligência, mas sem jamais fugir do rigor dos fatos, não apenas futebol, mas todo o tipo de esporte, mesmo os menos praticados e mais exóticos. E mesmo quando o assunto era aparentemente factual, todo ele calcado num determinado e transitório evento esportivo, ele conseguia, por artes “mágicas”, tornar o texto perene e, mais do que isso, imortal.
Tenho crônicas de Armando Nogueira dignas de figurar nas melhores antologias do gênero e, claro, com merecido destaque. Oportunamente, comentarei algumas delas, irrepreensíveis do começo ao fim, sem que o mais severo e ácido dos críticos possa encontrar o mais ligeiro senão e fazer a mínima restrição.
Outro cronista esportivo da minha predileção é Eduardo Gonçalves de Andrade, ou melhor, Doutor Eduardo Gonçalves de Andrade. Dito assim, o leitor pensará com seus botões: “O Editor, hoje, pirou, ou bebeu. Não conheço esse cronista, de quem nunca ouvi falar”. Pois bem, e se eu disser que se trata de um dos melhores jogadores que este país pentacampeão do mundo já produziu, melhora? Vocês estão, mesmo, lentos de raciocínio. Pois bem, já que não mataram a charada, lhes revelo o apelido pelo qual ficou conhecido, quer nos gramados, quer na crônica esportiva: Tostão.
Ah, agora caiu a ficha! Pois é, o grande centroavante da Copa de 1970, originalmente um meia, a exemplo de Pelé, Rivelino e Jairzinho, revela-se tão bom na escrita quanto foi jogando bola. Seus textos são como os do mestre Armando, embora ambos tenham estilos totalmente diferentes. Mesmo os que parecem ser factuais, não o são. Leiam qualquer de suas crônicas. Tomem, por exemplo, uma escrita há dez anos. Não lhes parece que Tostão a escreveu ontem? Isso não é jornalismo (e mesmo que fosse, seria da melhor qualidade), mas literatura pura.
Quando abordo determinados assuntos, principalmente os mais populares, como este, evito, sempre que posso, de citar nomes. Por que? Para não cometer injustiças das quais venha a me arrepender, omitindo gente boa, que mereceria ser citada, mas que, ou por lapsos de memória (é impossível lembrar-me de tudo o que preciso, nos momentos de maior necessidade), ou por falta de espaço, acabo não dizendo nada a seu respeito. E, invariavelmente, tenho que me penitenciar na seqüência.
Mas temos (felizmente), gente muito boa, jornalistas ou não, escrevendo excelentes crônicas esportivas. Citaria, sem ter que pensar bastante, Fernando Calazans, por exemplo, ou Márcio Guedes, ou Paulo Vinícius Coelho, ou Juca Kfoury, ou André Plihal, ou Xico Sá (que desmistifica o gênero e escreve textos deliciosos, com irreverência e humor). Fosse citar todo mundo que gosto, gastaria os cinqüenta textos que programei para escrever, sobre literatura e futebol, apenas digitando nomes. Claro que não é o que vocês esperam de mim.
Creio que a área em que o jornalismo brasileiro está melhor servido é, justamente, esta, a dos esportes. Aliás, corrijo: do futebol. Porquanto outras modalidades esportivas importantes, como o vôlei, o basquete, o atletismo etc., vivem à míngua, com seus dirigentes e praticantes vibrando de emoção quando conseguem, pelo menos, ser citados, mesmo que de passagem e em apenas umas poucas linhas.
O tema é amplo e é claro que voltarei a ele. Seria impossível fazer sequer sua introdução em um espaço tão restrito, por maior que fosse meu poder de síntese (que ademais é pequeniníssimo, já que sou daqueles redatores prolixos, apreciados por poucos e um tormento para os que não gostam de ler).

Boa leitura.

O Editor.

2 comentários:

  1. Na minha humilde opinião o"Dream Team"
    da seleção brasileira foram os jogadores
    da copa de 1970. Inigualáveis, eu contava
    então com sete anos e o meu preferido era
    o mais catimbeiro, o bigodudo Rivelino.
    Não se faz mais futebol como antigamente.
    Abração.

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  2. Tostão foi meu contemporâneo de residência médica. Eu o vi inúmeras vezes na Biblioteca da UFMG. Sempre soube que o nome dele era Eduardo, assim, pelo menos para mim, foi imediato saber de quem se tratava. Porém, meu conhecimento vai só até aí. Não conheço o trabalho literário dele, mas vou procurar, pois você, como é de costume, aguça o interesse. Quanto a prolixidade, sou obrigada a concordar com você, mas não tenho preguiça de ler.

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