quarta-feira, 23 de dezembro de 2009


Literatura em jornal

Caríssimos leitores, boa tarde.
Há não muito, os versos de Carlos Drummond de Andrade, aqueles que dizem que “a poesia fugiu dos livros e agora se encontra em jornais”, era mais do que mera (posto que genial) metáfora. Era a mais lídima expressão da verdade. As redações, Brasil afora, estavam lotadinhas de excelentes escritores. Ali respirava-se, além de notícias, arte e cultura. Havia literatura à beça em estado bruto. Hoje, infelizmente, já não há mais.
Não digo que atualmente não haja competentes e talentosos homens de letras nas redações. Há, e dos bons. O que mudou foi a política dos jornais face à cultura em geral, às artes e, particularmente, à Literatura.
Houve tempo (notadamente nas décadas de 50 e 60 do século XX, que foram, de fato de direito, os tais dos “anos dourados) em que havia até dez colunas de crônicas em prestigiosos órgãos de imprensa de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre etc.etc.etc. Nesse aspecto, porém, o tradicional “O Estado de São Paulo” se destacava.
Por cerca de dez anos, por exemplo, a partir de 1956, colecionei a coluna “Eco ao Longo dos meus passos”, do genial poeta campineiro Guilherme de Almeida (entre tantas outras). Recortava-a zelosamente e a colava em cadernos, colecionando dezenas e dezenas deles, repletos de textos desse consagrado escritor.
Era como ganhar uma coleção de livros inéditos do poeta, periodicamente, pois a maioria dessas suas crônicas só foi publicada, mesmo, no Estadão. Fiz o mesmo em relação a Carlos Drummond de Andrade, quando o poeta de Itabira passou a assinar coluna no Jornal da Tarde.
E não foram textos apenas desses dois que colhi, zelosamente, em jornais, para meu proveito, enriquecimento cultural e, sobretudo, deleite. Calculo que tenha, em minha hemeroteca (que vem a ser uma coleção de recortes de jornais), obras de pelo menos cinco dezenas de escritores. É, como se vê, preciosidade literária que não tem preço.
Hoje, por imposição (para mim estúpida) de determinados “Professores Pardais” (refiro-me ao personagem de histórias em quadrinhos dado a inventar maluquices), a Literatura foi, virtualmente, banida dos jornais.
Os raros escritores que ainda têm colunas tratam agora de temas políticos (sempre os mesmos), em detrimento das letras e por isso se tornaram chatos. Os suplementos literários de antigamente ficaram na saudade. Com o perdão da crítica, já que também sou jornalista (e ainda em plena atividade), mas, cá para nós, os jornais, atualmente, são de uma chatice constrangedora.
Agora é a era dos tais “gurus políticos”, dos “pseudoformadores de opinião”, dos caras que se julgam os tais e adoram remar contra a maré (desconfio que apenas para fazer gênero). Se a população confere, por exemplo, índices de popularidade gigantescos, de até 84%, ao presidente Lula (e isso em fins de segundo mandato, o que é rigorosamente inédito), esses sacripantas, metidos a sabidos, baixam o pau nele. Mas em vez de conquistarem a adesão popular, perdem pontos e mais pontos com os leitores, como se quisessem praticar harakiri profissional. Talvez se tratem de masoquistas e de fato queiram.
O que me irrita é que as colunas desses caras substituíram justamente as de escritores, que sempre tinham coisas inteligentes, belas, e proveitosas a nos dizer. Podiam até desagradar alguns leitores, mas jamais poderiam ser acusados de “mesmice”, ao contrário dos atuais “gurus políticos” (gurus para as negas deles).
E essa crítica tem muito de autocrítica. Afinal, por mais de dez anos, fiz esse papel ridículo (que nunca mais pretendo fazer), na condição de comentarista político. Até que um dia... joguei tudo para o alto e decidi escrever, apenas, sobre literatura em minha coluna.
Não tardou, claro, para que ela fosse “cassada”. Para meu orgulho e satisfação, no entanto, foram tantas as cartas de leitores para a direção do jornal, exigindo a volta da publicação das minhas crônicas, que aqueles que me “cassaram” se viram forçados a recuar. Restauraram minha coluna num piscar de olhos.
O argumento deles, de que o povo não gosta de literatura, foi para o espaço. O que as pessoas não têm são meios de expressar seus gostos e preferências e de fazê-los chegar aos arrogantes “cardeais das redações”. Ah, se tivessem!!!!

Boa leitura

O Editor.

2 comentários:

  1. Apregoam que o povo não gosta de arte, de música
    clássica ou de literatura.
    A Quinta da Boa Vista ficava apinhada de pessoas
    sequiosas para ver e ouvir as orquestras sinfônicas, o Museu Nacional de belas Artes com filas quilômétricas para ver Dali, Rodin e tantos outros.
    Boçais são eles que nadam em arrogância e preconceito.

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  2. É ruim quando alguém toma a decisão em nome de muitos, e os priva de melhorar em conhecimentos, em aprimoramento e gosto. É possível que um texto difícil afugente leitores, mas é muito provável que este mesmo texto atinja outros em cheio, e os faça subir de nível. Esse é outro papel dos que escrevem.

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