Dinheiro
em espécie
* Por
Marcelo Sguassábia
Por incrível que possa parecer, a espécie em extinção é a mais facilmente encontrada na natureza. Em suas inúmeras variantes, tudo leva a crer que seja originária do Brasil - já que aqui encontra as condições ideais para se reproduzir. Sua ocorrência, entretanto, é comum nos cinco continentes, em ecossistemas capitalistas, socialistas, democráticos, anárquicos ou ditatoriais.
Tem seu habitat natural em sítios de Atibaia, onde alterna sua presença entre os lagos de pedalinhos, antenas de celular da Oi e adegas bem fornidas. Como todos os anfíbios de sua ordem, mostra-se perfeitamente à vontade quando está com as mãos molhadas mas também adapta-se com facilidade a solos arenosos da indústria da seca, desde que não lhe falte o necessário suprimento alcoólico.
Defende-se
dos inimigos naturais atacando vorazmente as reservas públicas,
embora afirme que jamais tenha feito fortuna na política. Suas
características camaleônicas, que permitem
que se camufle para confundir seus predadores, fazem dele um
autêntico exemplar do gênero tucanus peéssedebensis, praga que
assola o planalto central.
Tipo de jiboia que hiberna anos enquanto digere lentamente o erário. Animal de estranhos hábitos, tem a peculiar característica de assinar sem ler. Ainda que tenha desenvolvido uma forma rudimentar de fala ao longo de milênios, quando abre a boca de incisivos avantajados só balbucia frases sem nexo.
Dá o bote (ou o golpe, como insistem alguns) sempre à noite e entre os jaburus. É conhecido o seu caráter misógino, por não admitir em seu bando nenhuma fêmea. A criação de mesóclises de grande efeito retórico, para posterior revoada na mídia, é o passatempo predileto desse sorrateiro e anacrônico exemplar do gênero Vices nocomandus.
Leva e traz no lombo calejado malas e mais malas de dinheiro vivo. Sua reduzida massa encefálica talvez explique o fato de jamais conhecer o teor daquilo que transporta. Faz parte do baixo e médio escalão da cadeia alimentar e acabou por se adaptar à reprodução em cativeiro, uma vez que sempre acaba cumprindo pena no lugar daqueles que encomendaram seus serviços de delivery.
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Marcelo Sguassábia
é redator publicitário. Blogs:
WWW.consoantesreticentes.blogspot.com (Crônicas e Contos) e
WWW.letraeme.blogspot.com (portfólio).
Uma visão humorística da grave crise moral em que vivemos. Faltaram apenas os julgadores, que também não são flores.
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