quinta-feira, 8 de junho de 2017

Dinheiro em espécie


* Por Marcelo Sguassábia


Espécie em extinção (Montantis sumidus)

Por incrível que possa parecer, a espécie em extinção é a mais facilmente encontrada na natureza. Em suas inúmeras variantes, tudo leva a crer que seja originária do Brasil - já que aqui encontra as condições ideais para se reproduzir. Sua ocorrência, entretanto, é comum nos cinco continentes, em ecossistemas capitalistas, socialistas, democráticos, anárquicos ou ditatoriais.

Espécie ululante (octópode da família Moluscus corruptum)

Tem seu habitat natural em sítios de Atibaia, onde alterna sua presença entre os lagos de pedalinhos, antenas de celular da Oi e adegas bem fornidas. Como todos os anfíbios de sua ordem, mostra-se perfeitamente à vontade quando está com as mãos molhadas mas também adapta-se com facilidade a solos arenosos da indústria da seca, desde que não lhe falte o necessário suprimento alcoólico. 

Espécie aécica (Nevis imundícius)

Defende-se dos inimigos naturais atacando vorazmente as reservas públicas, embora afirme que jamais tenha feito fortuna na política. Suas características camaleônicas, que permitem que se camufle para confundir seus predadores, fazem dele um autêntico exemplar do gênero tucanus peéssedebensis, praga que assola o planalto central.

Espécie anta (Dilmatis butijaniensis)

Tipo de jiboia que hiberna anos enquanto digere lentamente o erário. Animal de estranhos hábitos, tem a peculiar característica de assinar sem ler. Ainda que tenha desenvolvido uma forma rudimentar de fala ao longo de milênios, quando abre a boca de incisivos avantajados só balbucia frases sem nexo.

Espécie morcego (Foratêmeris dráculum)

Dá o bote (ou o golpe, como insistem alguns) sempre à noite e entre os jaburus. É conhecido o seu caráter misógino, por não admitir em seu bando nenhuma fêmea. A criação de mesóclises de grande efeito retórico, para posterior revoada na mídia, é o passatempo predileto desse sorrateiro e anacrônico exemplar do gênero Vices nocomandus.

Espécie mula (Asnus laranjínicus)

Leva e traz no lombo calejado malas e mais malas de dinheiro vivo. Sua reduzida massa encefálica talvez explique o fato de jamais conhecer o teor daquilo que transporta. Faz parte do baixo e médio escalão da cadeia alimentar e acabou por se adaptar à reprodução em cativeiro, uma vez que sempre acaba cumprindo pena no lugar daqueles que encomendaram seus serviços de delivery. 


* Marcelo Sguassábia é redator publicitário. Blogs: WWW.consoantesreticentes.blogspot.com (Crônicas e Contos) e WWW.letraeme.blogspot.com (portfólio).




Um comentário:

  1. Uma visão humorística da grave crise moral em que vivemos. Faltaram apenas os julgadores, que também não são flores.

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