sexta-feira, 31 de agosto de 2012

A ponte

* Por Rodrigo Ramazzini

Imagine uma cidade pequena. Ano de eleições municipais. Somente dois candidatos e suas coligações disputam o cargo de prefeito. No lugarejo, apenas um grande problema: o péssimo estado da ponte que liga os dois únicos bairros da localidade, o Sul e o Norte, que são cortados por um riacho.

Durante a campanha ambos os elegíveis prometem basicamente a mesma coisa: reconstruir a tal ponte. Com uma única diferença. O candidato “A” prometeu fazê-la no sentido Sul – Norte. O candidato “B” comprometeu-se a erguê-la no sentido Norte – Sul. Era o início de uma discussão que se perpetuou a campanha inteira e acirrou os ânimos entre os bairros.

A origem dos recursos para fazer a obra, segundo o candidato “A”, seria o governo do Estado, no qual seu partido fazia parte da coligação. Já o candidato “B” dizia que a verba para a construção sairia do governo Federal, onde seu partido tinha ótimo trânsito.

Dia da eleição. Por pouco mais de 100 votos, o candidato “B” ganhou a disputa, já que conseguiu convencer os eleitores do bairro Norte, que possuía maior eleitorado, sobre as vantagens da construção da ponte se iniciar pelo seu lado do riacho. Assim que assumiu ao cargo, o prefeito “B” mandou dar partida nas obras da ponte. Até uma pedra fundamental foi inaugurada para marcar o início de um novo tempo na cidade.

Nos primeiros dias, alguns homens chegaram a trabalhar no local. Depois sumiram e a ponte ficou do mesmo jeito.

Dois anos se passaram e o prefeito afirmava que a obra não saia do papel porque o governo estadual, que era de partido de oposição, estava trancando os recursos que ele conseguira junto ao governo Federal (seu aliado), porque era ano de eleições presidencial e estadual. O executivo do Estado rebatia as acusações dizendo que as verbas federais nem passavam por sua contabilidade e que nem projeto para a captação do dinheiro a prefeitura tinha elaborado. Estava gerada a crise e uma grande discussão, que durou até a realização do pleito eleitoral. Como resultado, inverteram a ordem. Quem era oposição no Estado passou a situação e, no âmbito presidencial, ocorreu à mesma situação. Agora vai, dizia o prefeito “B” pelas ruas dos bairros.

Transcorrido mais um ano e a obra continuava parada. O motivo era que agora, o governo Federal havia trancado os recursos, pois com o executivo Estadual estava tudo certo. Nova discussão e a promessa que a construção da ponte entraria no orçamento federal do ano seguinte por meio de uma emenda parlamentar de um deputado. Até uma carreata na cidade foi realizada para comemorar o feito. É uma questão de tempo, afirmava o prefeito “B”.

Novo ano de eleições municipais. E nos primeiros meses, o assunto ponte voltou às rodas de discussão entre a população. Em retaliação por ter perdido uma votação no congresso nacional, o governo Federal cortou todas as emendas parlamentares dos deputados. Inclusive a da ponte. Vendo que não faria a obra e que isso o prejudicaria politicamente, o prefeito “B” propõe uma coligação com o seu anterior adversário “A” para que juntos encarem o pleito contra o candidato “C”, que acabara de surgir. Ainda, encheu a prefeitura de pessoas em cargos de confiança do bairro Norte, com intuito de amenizar qualquer tipo de descontentamento.

Em troca de algumas secretarias e uma possível candidatura do prefeito “B” a deputado Estadual no próximo pleito, o agora antigo “adversário A” aceita o convite para ser candidato a vice-prefeito e juntos formam a coligação intitulada “Unindo diferenças apara fazer a diferença”.

A ponte continuaria sendo a grande plataforma de compromissos dos candidatos “B” e “A”. A discussão sobre o sentido da ponte literalmente perdeu o sentido. A estratégia seria outra dessa vez. Sabedores que o candidato “C” tinha a ideia de lançar a promessa de fazer a ponte de madeira, o que possibilitaria que a obra saísse mais rápido do papel e com menor custo, a dupla “B” e “A” não poupou esforços para espalhar a intenção do adversário e mostrar seu compromisso com a população: fariam a ponte de concreto, sim!

Pronto! Uma grande discussão foi gerada na cidade. Madeira ou concreto? Concreto ou Madeira? Foram meses tratando sobre o assunto até que o resultado das eleições revelou a preferência dos eleitores pela proposta da dupla pelo concreto. Enfim, eleitos!

A dupla “B” e “A” assumiu os cargos de prefeito e vice-prefeito e logo marcaram uma nova inauguração da pedra fundamental da ponte. No dia marcado, durante a cerimônia, o prefeito “B” declarou em meio ao discurso:
- Esse ato é o marco de início de uma nova era na nossa cidade. Uma obra que mudará a nossa cidade. É o futuro chegando!!!

Foi aplaudido com entusiasmo pela população e assessores que participavam da solenidade. Enquanto, a salva de palmas ecoava, o vice-prefeito “A” aproximou-se e cochichou ao ouvido do prefeito:
- Quero ver como nós vamos fazer essa ponte!

O prefeito “B” olhou fixamente para o vice-prefeito “A” e respondeu com um sorriso irônico:
- Ou não, meu caro! Até as eleições a gente vê!

E os dois caíram na gargalhada...

• Jornalista e contista gaúcho

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