
A Carta!
* Por Patrick Raymundo de Moraes
Quinze dias. Metade de um longo mês de espera. Tortura, ansiedade e lamento. Não aguento mais esperar. A resposta pode chegar amanhã ou em quinze dias. A resposta que tudo pode mudar, que tudo pode encaminhar e resolver. Sinto-me prisioneiro à espera do alvará de soltura, um paciente esperando o médico chegar sorridente e lhe revelar boas novas: “Estás curado”! Sinto-me revoltado pela espera, por uma resposta lenta, dada pela forma mais lenta de entrega que o correio possui, a tal de “entrega normal”. Pode levar dez a quinze dias úteis. Não consigo mais esperar, e o que devia me trazer o prazer e a satisfação virou-se contra mim, como um dragão que cospe fogo contra minha face e incendeia-me as idéias. Uma simples carta, com simples palavras de grande importância, atravessa-me letra por letra o peito doente de espera pelas respostas. Não desejo saber os segredos do universo, não desejo saber o que o arquivo confidencial esconde em suas linhas, mas desejo, mais do que tudo, saber o que está escrito nessa carta. Quem matou JFK? JFK está morto e minha carta ainda não chegou! Guardo a caixa do correio como se fosse caixa de banco. Vejo, enfim, o carteiro chegar. Camiseta dourada anuncia um novo amanhecer. Não permito que ele chegue até a caixa de correspondência e lhe assalto o caminho com um pulo.
- Chegou? Está aí contigo? – pergunto ansioso, após dias de uma espera insensata na era da informática. Se pudesse, eu poderia enviar essa resposta ao Japão em menos de um minuto e resolveria a curiosidade de qualquer um quanto ao conteúdo da carta. Mas o que me enviou a carta sonegou-me a informação nela contida. Nada de informática, nada de satélites ou telefones, apenas a “entrega normal” de dez a quinze dias úteis. Informação por telefone ou email ou satélite estavam negadas a mim pelo sádico remetente. O carteiro sorriu! Puxou de sua sacola um ramo de cartas e me entregou várias. Agradeci. O Sedex que pedi ontem chegou hoje de manhã, mas o remetente nem Sedex quis usar. Preferiu “entrega normal” de dez a quinze dias úteis. Sádico. Procurei aflito a carta libertadora. Achei! Eu a abri selvagemente, estraçalhando o papel do envelope. O conteúdo me importava mais. Senti-me um carniceiro a procurar o pedaço mais profundo de carne num animal abatido por presas sedentas. Enfim, seu conteúdo estava à mostra. Eu o li e a alegria voltou ao meu ser. Respirei o ar satisfeito. Senti o calor da manhã em minha pele e pude descansar os olhos, deitando a vista em cada letra do papel e repetindo a leitura cuidadosamente várias vezes. Bebia cada palavra como se fosse água no deserto. Entrei em minha casa e contei as novidades para todos. Querem saber o que estava escrito nesta carta? Que palavras animadoras e libertadoras nela estavam contidas? Ora, basta me passares teu endereço, que eu enviarei, por entrega normal de dez a quinze dias úteis.
(Texto publicado na antologia literária “Palavras do Coração”, da Editora Litteris).
* Por Patrick Raymundo de Moraes
Quinze dias. Metade de um longo mês de espera. Tortura, ansiedade e lamento. Não aguento mais esperar. A resposta pode chegar amanhã ou em quinze dias. A resposta que tudo pode mudar, que tudo pode encaminhar e resolver. Sinto-me prisioneiro à espera do alvará de soltura, um paciente esperando o médico chegar sorridente e lhe revelar boas novas: “Estás curado”! Sinto-me revoltado pela espera, por uma resposta lenta, dada pela forma mais lenta de entrega que o correio possui, a tal de “entrega normal”. Pode levar dez a quinze dias úteis. Não consigo mais esperar, e o que devia me trazer o prazer e a satisfação virou-se contra mim, como um dragão que cospe fogo contra minha face e incendeia-me as idéias. Uma simples carta, com simples palavras de grande importância, atravessa-me letra por letra o peito doente de espera pelas respostas. Não desejo saber os segredos do universo, não desejo saber o que o arquivo confidencial esconde em suas linhas, mas desejo, mais do que tudo, saber o que está escrito nessa carta. Quem matou JFK? JFK está morto e minha carta ainda não chegou! Guardo a caixa do correio como se fosse caixa de banco. Vejo, enfim, o carteiro chegar. Camiseta dourada anuncia um novo amanhecer. Não permito que ele chegue até a caixa de correspondência e lhe assalto o caminho com um pulo.
- Chegou? Está aí contigo? – pergunto ansioso, após dias de uma espera insensata na era da informática. Se pudesse, eu poderia enviar essa resposta ao Japão em menos de um minuto e resolveria a curiosidade de qualquer um quanto ao conteúdo da carta. Mas o que me enviou a carta sonegou-me a informação nela contida. Nada de informática, nada de satélites ou telefones, apenas a “entrega normal” de dez a quinze dias úteis. Informação por telefone ou email ou satélite estavam negadas a mim pelo sádico remetente. O carteiro sorriu! Puxou de sua sacola um ramo de cartas e me entregou várias. Agradeci. O Sedex que pedi ontem chegou hoje de manhã, mas o remetente nem Sedex quis usar. Preferiu “entrega normal” de dez a quinze dias úteis. Sádico. Procurei aflito a carta libertadora. Achei! Eu a abri selvagemente, estraçalhando o papel do envelope. O conteúdo me importava mais. Senti-me um carniceiro a procurar o pedaço mais profundo de carne num animal abatido por presas sedentas. Enfim, seu conteúdo estava à mostra. Eu o li e a alegria voltou ao meu ser. Respirei o ar satisfeito. Senti o calor da manhã em minha pele e pude descansar os olhos, deitando a vista em cada letra do papel e repetindo a leitura cuidadosamente várias vezes. Bebia cada palavra como se fosse água no deserto. Entrei em minha casa e contei as novidades para todos. Querem saber o que estava escrito nesta carta? Que palavras animadoras e libertadoras nela estavam contidas? Ora, basta me passares teu endereço, que eu enviarei, por entrega normal de dez a quinze dias úteis.
(Texto publicado na antologia literária “Palavras do Coração”, da Editora Litteris).
* Escritor e jornalista. Foi bancário e hoje dedica-se aos estudos para concurso público. Membro da ANE, CBL, UBE e OCP (Ordem da Confraria dos Poetas).
As benditas cartas...
ResponderExcluirEu as enviava quase sempre e por cansar-me
de esperar por uma resposta não o faço
mais com tanta frequência.
Se tenho preguiça de escrever? Nunca...sei o efeito
que uma carta pode trazer.
Hoje quando escrevo faço como uma prova
de carinho, não espero mais respostas.
Abraços