sexta-feira, 23 de maio de 2014

Discriminação social


Uma das formas mais cruéis, e no entanto mais comuns, de violação dos direitos humanos das mulheres, é a discriminação social a que elas ainda são submetidas pelo mundo afora. Esse tipo de "agressão", fruto exclusivo do "machismo" e de arraigado preconceito, é extremamente perverso, pois além de comprometer o presente, arruina o futuro de quem é sua vítima, mantendo-a sob perpétua sujeição por toda a vida.

São raríssimas as pessoas que conseguem escapar dessa poderosa armadilha, principalmente se tiveram a infelicidade de nascer em países atrasados e carentes, mergulhados na miséria e na ignorância. Relatório recente, divulgado pelo Banco Mundial, revela que dos mais pobres do mundo, 70% ainda são mulheres! E a situação não dá mostras de reversão, pelo contrário.

Nos últimos 20 anos, o número de pessoas do sexo feminino, vivendo em extrema pobreza, cresceu 50%, em todo o Planeta, enquanto a taxa para os homens foi de 30%. Como se vê, o abismo alarga-se cada vez mais, a despeito de todos os esforços para a redução das desigualdades econômicas, sociais e culturais entre os sexos.

É certo que da segunda metade do século XX em diante, as mulheres obtiveram miraculosas conquistas, sequer sonhadas apenas cem anos atrás por suas passivas e obedientes avós. Passaram a freqüentar maciçamente as escolas, ascenderam às universidades, tomaram de assalto os laboratórios de pesquisa, as redações de jornais, os meios de comunicação em geral, onde, em muitos países (inclusive no Brasil), já chegam a se constituir em maioria.

Hoje são médicas, astronautas e engenheiras. Comandam navios, pilotam aviões e fazem coisas inacreditáveis. São atletas bem sucedidas, que nada ficam a dever aos homens. Tratam-se de  vitórias nada desprezíveis, convenhamos. Mas ainda se constituem em gotas d'água, em um oceano de desigualdades.

As mulheres conquistaram, desde o início do século passado, o direito de votar e de serem votadas. E foram à luta, ganhando espaço crescente no mercado de trabalho. Hoje, principalmente nos países de maior desenvolvimento econômico e social, ocupam, cada vez mais, posições de destaque e de poder, como empresárias, profissionais liberais, políticas, etc. Mas ainda estão anos-luz de distância da sonhada igualdade de direitos e de oportunidades. 

Na I Conferência Mundial sobre a Mulher, realizada na Cidade do México, em 1975, a maioria dos delegados oficiais, presentes ao encontro, era constituída (estranhamente) de homens. Vinte anos depois, em Pequim, isso mudou radicalmente. E nada mais lógico e coerente do que essa mudança. Foi, sem dúvida, outro imenso avanço, num prazo relativamente curto de tempo. Afinal, ninguém conhece melhor os problemas que afetam as mulheres do que elas próprias. 

Mas ainda há muito, muitíssimo a ser feito, na busca da igualdade de direitos e de deveres. Serão necessárias, pelo menos, de duas a três gerações (isso caso não ocorram retrocessos, o que não é de se duvidar), para essa realidade, finalmente, se impor e se consolidar.

As mulheres conquistaram o direito de voto, nos Estados Unidos, em 26 de agosto de 1920. Em outros países, da Europa e da América Latina, isso demorou um pouco mais. Já está muito distante o tempo em que as chamadas "sufraguetes" desafiavam pais, irmãos, maridos e principalmente a polícia, para reivindicar, nas ruas, a possibilidade de eleger seus governantes, ridicularizadas pela imprensa, reprimidas pelas autoridades e censuradas pelas chamadas "pessoas de bem".

Todavia raras, raríssimas ainda são aquelas que hoje conseguem chegar ao poder, através das urnas, embora em quase todo o mundo o número de eleitoras seja, invariavelmente, maior do que o de eleitores.

Os norte-americanos jamais elegeram uma mulher para a presidência. O mesmo ocorre no Brasil, na Argentina, no Uruguai, no Chile, etc., etc., etc. Mesmo o número de governadoras, prefeitas, deputadas, senadoras ou vereadoras é muitíssimo aquém do imenso potencial de voto feminino. Nas Cortes Supremas, então, nem se fala. São absolutas exceções à regra.

Um informe do Unicef concluiu, recentemente, que as mulheres vão precisar de mais 160 anos (no mínimo) para conseguir igualdade política com os homens, nos Parlamentos dos vários países democráticos. Talvez precisem até de muito mais tempo.

Alguns dados esparsos tendem a ilustrar melhor as dimensões dessa imensa discriminação social a que elas ainda estão expostas. Não se ignora, é óbvio, que aqui, ali e acolá haja progressos, que devem ser, justamente, comemorados. Mas tudo o que já se fez até hoje é ínfimo diante do que resta a ser feito.

Por exemplo, na Índia, que teve em Indira Gandhi uma de suas figuras históricas de proa (morreu assassinada por seus guarda-costas da seita "sikh", em 31 de outubro de 1984), quarenta por cento das mulheres (algo em torno de 400 milhões de pessoas!) ainda são analfabetas. Em conseqüência, sessenta milhões delas vivem abaixo da linha da pobreza.

A menos que se empreenda um espetacular e inédito programa de alfabetização em massa, esse enorme contingente (que equivale a mais de três vezes a população total do Brasil), está condenado a jamais sair dessa condição humilhante, de miséria e de ignorância. E não se trata de caso único no mundo.   

A proporção de escolarização, em âmbito mundial, evoluiu muito, nos últimos quarenta anos, o que dá uma certa esperança, num futuro não muito distante. Hoje, é de 85 meninas para 100 meninos. Em 1960, era de 65 para 100. Contudo, de um bilhão de pessoas no Planeta, vivendo na pobreza absoluta, 700 milhões são mulheres! E dois em cada três indivíduos analfabetos no mundo são do sexo feminino!



Do livro “Guerra dos Sexos”, Pedro J. Bondaczuk, 1999, Inédito.

Boa leitura.


O Editor

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Um comentário:

  1. Para a gente que começou a frequentar escola aos quatro anos de idade, coisa rara na cidade de Montes Claros (pobre norte de Minas) do meu tempo (nasci em 1955), parece distante essa realidade tão dolorida e que impede qualquer melhoria de vida.

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