quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Quem aponta o dedo tem quatro dedos apontando para si

* Por Mara Narciso

A ausência de reconhecimento e a falta de gratidão já são por si só revoltantes. Sentir-se injustiçado, incriminado e punido por um ato que não executou, deixa qualquer um sem palavras. Nota-se, de uns tempos para cá, um excesso de denúncias, muitas delas com fundamento, mas que, mesmo sem apuração e sem provas, não caem no vazio, pois a má vontade da opinião pública quer crucificar o acusado. Não são inócuas essas acusações, pois acabam com a reputação de quem foi denunciado, julgado e condenado via “eu acho”, “eu penso”, “eu quero”.

Com esta sede de justiçamento ouvimos palavras soltas, incriminações graves, grosseiras e com expressões duras, ditas como se fatos comprovados fossem. Não há espaço para defesa e muito menos retratação do denunciador. Nas redes sociais vemos pessoas de bem serem imoladas, sacrificadas, esquartejadas, e quem as desmoralizou fica impune. Isso não é ser civilizado, assim como também não o é quem atropela e não dá socorro a vítima, ou age com imperícia, imprudência e negligência, por exemplo, ao tratar de uma pessoa doente, e também aquele que desvia dinheiro público para si e para os seus.

Falando genericamente, sem defesa deste ou daquele, muitos já viram criminosos de colarinhos coloridos gozarem do produto do seu roubo sem serem incomodados. Também já se viu um condenado ficar por 28 anos no corredor da morte, esperando ser executado, para, num último instante, um teste de DNA o salvar, recebendo vultosas somas do Estado, embora estas somas não comprem tempo, o maior tesouro dos vivos. Muitos erraram e não pagaram por isso, enquanto inocentes foram massacrados, perderam suas saúdes físicas e mentais, sem jamais conseguir resgatar a paz interior e anterior ao injusto julgamento.

O que faz sofrer mais, ser malignamente julgado como malfeitor sem nada de ilícito ter cometido, ou ver um filho com problemas de comportamento ser expulso da escola aos quatro anos de idade? Há chusmas de ditados referentes a esses fatos: “quem com ferro fere, com ferro será ferido”; “olho por olho, dente por dente”; “não faça com o outro o que não quer que seja feito com você”; “caso falhe a justiça humana, a divina não tardará”. Ainda assim, esses dizeres não consolam quem sofreu injustiça. Sinta na pele o julgamento público de um erro que você não cometeu. Um linchamento não terá conserto.

A tendência da opinião pública é tomar o lado do mais fraco, do mais pobre, daquele que morreu, ou quem aos olhos populares estaria em desvantagem. Porém, há acontecimentos cruéis e inexplicáveis, em que não há culpados, sendo fruto da fatalidade. Existem atividades de grande risco, como um médico cirurgião cardíaco ou neurocirurgião, ou mesmo um obstetra, que lida com duas vidas ao mesmo tempo. Porém, quando o doente morre após abrir a cabeça ou o coração, as pessoas acham razoável, chegando a aceitar. Mas, quando uma mãe morre ao dar a luz, rebelam-se, pois um momento de alegria não pode ser convertido em tragédia, nas mortes de mãe e filho. A Medicina pode não prever, e então acontecem desfechos indesejáveis. É preciso sensatez, para analisar de forma correta, e não jogar no fogo alguém que possa ter feito tudo certo, conforme diz a nova Obstetrícia, e ainda assim a parturiente morrer.

O trânsito violento, barbaramente mata jovens, porém, os mesmos podem ter sido os causadores do desastre. Apenas o fato de serem jovens e terem morrido não os faz inocentes. Assim, quando o motorista pegar o seu automotor precisa não estar sob efeito etílico, andar devagar e atento, respeitar os demais, pois todos precisam passar. Também o médico deve fazer apenas aquilo para o qual está capacitado, além de se reciclar periodicamente. As falhas serão menores, e as mortes se reduzirão.

Quanto aos políticos, é horrível ver quem pega a parte e generaliza para o todo. Não há o partido do bem ou o partido do mal. Ainda existem cidadãos honestos com ânsia de governar, mesmo que mudem após chegar ao poder, ou que façam alianças ou dêem apoios a nomes incompreensíveis para os eleitores. In dubio, pro reo - na dúvida, a favor do réu. Por isso, nas calorosas discussões, não nos esqueçamos que há dois veredictos: culpado e inocente.

*Médica endocrinologista, jornalista profissional, membro da Academia Feminina de Letras de Montes Claros e autora do livro “Segurando a Hiperatividade” – blog http://www.teclai.com.br/

3 comentários:

  1. Sem dúvida, Mara, concordo com você. E como é difícil haver sabedoria e ponderação em determinados casos. Um outro caso de injustiça, ao meu ver, são os crimes que prescrevem - tantos são os recursos que os geralmente ricos réus vão lançando mão para adiar ad infinitum o famoso "transitado em julgado". Um grande abraço pra você!

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    1. Temos aqui em Montes Claros um caso desse de um réu confesso, que matou, com a ajuda do filho e um irmão, um dançarino, Igor Xavier. Arrastou o morto escada abaixo, batendo a cabeça em cada degrau, e o jogou no mato. O fato já tem 10,5 anos, e sendo rico, o assassino ainda não foi a juri popular. Mudou-se para Belo Horizonte, e lá passeia livremente. É revoltante.

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  2. Tem 3 dedos apontando para si e nao 4.
    :p

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