domingo, 21 de outubro de 2012

Como ele era tímido!

* Por Celamar Maione

Lúcio já estava perdendo a paciência. Fazia mais de meia hora que esperava pelo amigo Frederico na mesa do bar e nada. Até que finalmente avistou o cara:
- Puxa Frederico, já ia embora. Senta aí. Como é que foi? Rolou ou não rolou?

Frederico fez aquela cara de trouxa, tão comum dos tímidos:
- Não tive coragem. Fomos ao cinema. Mas vimos o filme e só.
- Só? Não aproveitou a deixa para tascar um beijo na menina?
- Não tive chance. Ela ficou o tempo todo com os olhos colados na tela.

Lúcio se irritou:
- Sabe que ás vezes eu tenho vergonha de ter um amigo tão otário como você?
- E eu tenho culpa de ser tímido?

Lúcio pediu mais um chope e resolveu mudar de assunto. Para ele, decididamente, Frederico era um caso perdido. Frederico ficava com outras meninas, mas quando se tratava de Yolanda, era um caso sério. Parecia mesmo burro quando empaca.

O rapaz estava interessado em Yolanda, sua colega de turma, na faculdade, há mais de dois anos. Desde o primeiro período. Mas como era um tímido assumido, tímido de dar pena, não conseguia se declarar.

Por outro lado, Yolanda sabia das intenções de Frederico. Até incentivava a aproximação, mas achava que o bote final tinha que vir de Frederico. Como isso não acontecia, viviam nesse impasse. O romance encruado já tinha até torcida:
- E aí Yolanda? Será que dessa vez o Frederico se declara?

A jovem, já desanimada, estava perdendo as esperanças:
- Não sei não. Acho que desse mato não sai coelho. O cara não pega nem no tranco.
- Coitado do Frederico, Yolanda. Ataca logo o rapaz.
- Tá doida? Eu não! Eu ataco, depois ele sai falando por aí que eu sou fácil, perde logo o interesse. Deixa que um dia ele toma coragem.
- E se não tomar?
- Bom... aí não vai dar em nada.

E pelo jeito, não ia dar em nada mesmo. Os dois eram duros na queda. Ficavam naquela de olhares. Dançavam juntos nas festinhas promovidas pelos colegas de faculdade, ficavam nessa de recadinho, indiretas, mas na hora H, não rolava nenhum beijo.

O tempo foi passando e o impasse continuava. Se formaram. Frederico estava inconsolável. Se ao ver Yolanda todos os dias, já era difícil se declarar, imagina agora que cada um seguiria seu caminho. Na festa da formatura, Yolanda tentou ser mais arrojada e passou o número do telefone para ele:
- Toma, Frederico, fica com o meu celular, número novo. Vê se me liga.

Frederico não ligou. Olhava para o telefone. Tomava impulso. Quando ia completar a ligação, começava a suar frio e desistia. Tentava arranjar uma desculpa para ligar, mas decididamente não tinha coragem.

O amigo Lúcio já havia perdido a paciência:
- É cara, desiste que isso não vai dar em nada.

E desistiu. Ficou com aquele amor platônico guardado na lembrança. Os anos foram passando. Nunca mais soube de Yolanda. Acabou se casando com Franciene, uma colega de escritório que deu em cima dele. Lúcio continuou seu amigo e grande confidente:
- E aí cara, depois desse tempo todo você ainda pensa na Yolanda?
- Pois é, ela foi meu grande amor platônico.
- Se você a visse agora?
- Acho que agora eu teria coragem. Estou mais velho. Casado, pai de família. Mas infelizmente seria tarde demais.

Um dia, numa dessas coincidências do destino, encontrou-se com Yolanda no centro da cidade. Quando ele viu a jovem, agora, uma linda mulher, com os cabelos mais esvoaçantes do que nunca, maquiada e com um tailleur bege, quase caiu para trás. Num impulso, apertou o passo e deu um jeito de se aproximar:
- Yolanda... ei... psiu...Yolanda, lembra de mim?

Yolanda abriu aquele sorriso que ele já conhecia tão bem e deu-lhe dois beijos no rosto:
-Frederico, como você está bonito! E aí, como vai? Quanto tempo!

Os dois se pegaram num papo descontraído. Acabaram na mesa de uma lanchonete revivendo os velhos tempos de faculdade. Yolanda também havia se casado e tinha dois filhos. Trocaram telefones. Se falavam algumas vezes por dia e um mês depois do reencontro, foram parar num motel. Tornaram-se amantes. Viviam tardes de amor inesquecíveis. Não falavam em separação. Se amavam desde a época da faculdade, mas decidiram que viver como amantes seria muito melhor. Decididamente, jogar o casamento para o alto não estava nos planos do casal. Frederico era o homem mais feliz do mundo. Até a convivência com a esposa ficou melhor.

Lúcio ficou com inveja da felicidade do amigo e chegou à conclusão que Frederico, que um dia foi tímido, não tinha nada de burro. Agora, quando os dois sentavam-se á mesa de um bar para conversar, Lúcio dizia, numa felicidade invejosa:
- Cara, eu tenho o maior orgulho de ser seu amigo!!

* Radialista e jornalista, trabalhou como produtora, repórter e redatora nas Rádios Fm O DIA, Tropical e Rádio Globo. Foi Produtora-Executiva da Rádio Tupi. Lecionou Telemarketing, atendimento ao público e comportamento do Operador, mas sua paixão é escrever, notadamente poesias e contos.

Um comentário:

  1. Os homens, nessas coisas de amor e sexo, agem de forma oposta às mulheres, e esse fato vai além do folclore. Muitos conhecem casos assim.

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