domingo, 17 de junho de 2012

Uma tal Chica doida

* Por Lêda Selma

Uma turma divertidíssima! Todos muito companheiros, amigos de longas farras. E cada um com sua peculiaridade, com seus tiques, com suas manias e até excentricidades. Motivos para reuniões animadas ah! nunca faltam! A alegria é o bilhete de entrada e o riso tem sempre que estar aceso para mostrar bom serviço. Carranca fica de fora. Sem exceção. Em boca fechada, não entra sorriso? Então, melhor arribar, pois o grupo é fechado ao mal-humor. Assim é essa turma do barulho e dos comes e bebes... Tempo ruim para ela é escassez de alegria. O resto é tropeço de pingo que nem virou chuva.

E, de reunião em reunião, todos se rejuvenescem e provam que têm fôlego e preparo físico para enfrentar as noites regadas a boa música, agradável conversa, muita dança e cerveja.

As mulheres, aprumadas no salto alto e nos passos ansiosos por um saracoteio pelo salão, ficam à espreita, de olho no cavalheiro mais pé de dança. E, não demora muito, começam a passar de braço em braço, num rodízio consentido. De vez em quando (afinal, todos são de carne e sentidos), olha um romance na agulha da língua. Um beijo, palavras despencando ouvidos afora, um passo mais ousado e namoro à vista... Sim, namoro! “Ficar”, para eles, é muita modernidade e não cabe em seus padrões comportamentais.

Em certa tarde de sábado, um encontro diferente. Nova amiga, aspirante a membro do grupo, far-se-ia presente para a apresentação “oficial” e o “batismo” de praxe. Mas não viria sozinha e sim, acompanhada de uma tal Chica Doida, conforme comunicado da anfitriã. Uma reunião festiva para as duas apresentações já cheirando a surpresa.

– Chica Doida... por que tal apelido, alguém sabe?
– Não faço a mínima idéia...
– Mas que é estranho e comprometedor é...
– Estranho, esquisito, esdrúxulo... tudo bem, mas de quem se trata, afinal?
– E eu sei, criatura!? Que doideira!
– Só sei que é uma mulher e, pelo imaginado, atrapalhada...
– Atrapalhada no sentido de abestalhada?
– Sabe-se lá... Talvez alegre demais, muito saída...
– Ah! então, tá pra mim! Aprecio muito mulher despachada e sem tremeliques.
– É, mas também saída demais... sei não...!? Um certo recato tem lá o seu charme...
– Desde que não seja de muita seca...
– Bem lembrado! Luxo em abundância destoa.
– Abundância... Hum! Terá ela abundâncias?
– Lá vem você com sua troça! Respeite a desconhecida, uai!
– Com esse nome? Chica Doida... Tô é doido pra conhecer a maldita!
– Imagino-a despojada, cabelo desgrenhado, roupa exótica, cheiro forte...
– Pode ser, mas que o nome carrega certo mistério e um tom debochado, carrega!
– Gente, que aflição! Melhor esperar e conferir, pronto!
– Fantasiar é preciso, decepcionar não é preciso... Então, devagar com a Chica que a doida pode ser de birra, hem?!

Enquanto esparramavam conversa pela varanda, as aguardadas chegaram. Uma delas, alta, balzaquiana jeitosa e a bordo de um jeans esmaecido.

– Só pode ser ela! – falaram em coro e em cochicho. – E que beldade!

A outra, menina já adolescida, riso de través, saia e tope vermelho. E ambas com as mãos ocupadas. De quê? Hum...! Da Chica Doida, ora! Uma gostosura: muita lingüiça picada, queijo aos pedaços, cheiro verde e pimenta. E tudo misturado ao milho verde, para engrossar bem o caldo. E então a esperada foi servida: fumegante e de par com o arroz!

• Poetisa e cronista, licenciada em Letras Vernáculas, imortal da Academia Goiana de Letras, baiana de Urandi, autora de “Das sendas travessia”, “Erro Médico”, “A dor da gente”, “Pois é filho”, “Fuligens do sonho”, “Migrações das Horas”, “Nem te conto”, “À deriva” e “Hum sei não!”, entre outros.

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