terça-feira, 26 de junho de 2012

A discussão entre os dois rios: Capibaribe e Beberibe


* Por José Calvino de Andrade Lima



(1) Ouço aquele rio,
estou cantando,
está na memória,
estou vendo,
está poluído...


Era a época em que a Espanha extraía grande quantidade de metais preciosos de suas próprias colônias americanas. O domínio espanhol, que durou até 1640, pouco modificou a vida no Brasil como colônia...

Em 1707, com 60 anos de idade, o espanhol Miguel Rodrigo Carrasqueiro organizou um grupo de pessoas para procurar esmeraldas pelo Brasil a fora. Para organizar essa expedição, que custou mais de 7.000 cruzados, investiu tudo o que tinha: vendeu todo seu gado, objetos valiosos e até mesmo os utensílios domésticos foram vendidos, ficando com sua casa vazia. Miguel Rodrigo alegara que traria preciosas pedras verdes-esmeraldas, pois tinha informações seguras e fácil de encontrá-las.

Meados do século XIX foi época em que o bacalhau era considerado comida de pobre. Azambujanra não gostava quando a sua mãe o mandava comprar duzentas gramas daquele peixe seco. Sr. Filófio propagava ser o melhor, pois o bacalhau era de procedência da Noruega.

- Diga à sua mãe que o da Noruega é mais caro.

Azambujanra não gostava de seu Filófio, até porque o fiado era humilhante e, no final do mês, aquele “pendura” sempre aumentava na conta da caderneta. Dona Corina, sua mãe, tinha vergonha de comprar bacalhau e este era o motivo que a levava a mandar o seu filho. Além do que ela não gostava nada de atravessar o rio Capibaribe numa catraia, da margem do cais da Jaqueira até o bairro da Torre, pois ficava muito tensa, principalmente quando o barqueiro encostava nos rolos de bananeira amarrados no batel. Enquanto catraieiros e bateieiros conversavam, ela pensava: “conversa sem pé nem cabeça!”

Corina sempre fazia suas compras a dinheiro na venda de seu Magalhães. As cestas vinham cheias de um tudo. Ao ver quando Corina voltava das compras, seu Filófio ficava resmungando que a ele era no “prego”, um negócio tão pequeno, ao contrário do que o povo dizia sobre seu concorrente: “Mercearia de seu Magalhães”. Mas é assim mesmo, ganha dinheiro quem tem dinheiro.

Azambujanra, em seu novo emprego, começou a trabalhar como bateieiro no batel na lavagem das areias amíferas... Quando sua mãe Corina descobriu aquele garimpo que até então era desconhecido, já andava desconfiada desde quando Azambujanra recitava em voz alta Catraia do Capibaribe. Mostrava a todo mundo um medalhão rodeado de esmeraldas com o nome inscrito: Miguel Rodrigo Carrasqueiro.

- Achou isso aonde? – perguntava Corina.

- Na Coroa do Passarinho, no Pina, quando trabalhava na draga de alcatruzes...

A abundância de metal nos leitos dos rios e córregos da região, provocou uma grande imigração de pessoas de todos os cantos do Arrayal do Bom Jesus (Casa Amarela). Logo denominaram os povos de Vasco da Gama (foi um navegador e explorador português) e de Nova Descoberta (motivo: muitos ferros velhos soterrados nas proximidades da Estação ferroviária, o chefe da Estação do Arrayal era portador de uma declaração de que os ferros velhos não pertenciam a Great Western, então muitos homens, mulheres e crianças desenterravam pinos, elos, pedaços de trilhos... e eram comprados pelo sogro do chefe, sendo pesados na própria balança da estação, que era colocada na plataforma).

Azambujanra resolveu trocar a medalha por pedras de diamantes com Euclides do Córrego, este no entanto trocou o adereço por diversas cabeças de gado que vinham nos trens da Gretueste. Com milhares de cabeças de gado findou sendo dono da ‘ladeira do boi’ e de todo o Córrego que até hoje chama-se Córrego do Euclides.

Azambujanra nas horas vagas pescava peixes de água doce nos rios Capibaribe e Beberibe. Antigamente, com suas águas limpas e muitos peixes, pescava-se bagre (o esqueleto da cabeça dele é a imagem de um Cristo crucificado), curimã, tainha, carapeba e, as vezes até camarão. Corina preparava que ficava uma delícia! Os rios Beberibe e Capibaribe, se encontram próximos ao final da Rua da Aurora. Dois grandes rios, poluídos e praticamente sem pesca. Recife e Olinda, despejam esgotos no rio e em seus afluentes. Entre eles, os canais da Malária, Vasco da Gama e o Córrego do Euclides. Os rios passam, hoje, sob as pontes Buarque de Macedo e Sete de Setembro, atual Maurício de Nassau, e vão desaguar no oceano Atlântico.

Com novas expedições na limpeza dos rios, com certeza vamos voltar à calma dos Rios limpos e navegáveis.

* Nota do autor: Com o desmembramento feito pela Prefeitura, mudou radicalmente a geografia de Casa Amarela, que hoje corresponde aos bairros: Nova Descoberta, Vasco da Gama, Morro da Conceição, Alto José do Pinho, Poço da Panela (faz fronteira com os bairros de Casa Forte, Casa Amarela, Santana, Iputinga, Cordeiro e Monteiro, além de ser banhado pelo Rio Capibaribe).

(1) Catraia do Capibaribe, do livro “Fiteiro Cultural”, pp. 160-1 – Edição do autor, 2011.

* Escritor, poeta e teatrólogo. Blog Fiteiro Cultural, http://josecalvino.blogspot.com/

2 comentários:

  1. E entre um rio e outro levamos a vantagem
    de navegar em suas palavras.
    Beijos poeta.

    ResponderExcluir
  2. Alguns regionalismos são difíceis de decifrar, mas o drama da poluição é universal.

    ResponderExcluir