sexta-feira, 4 de agosto de 2017

Temer, novo palavrão da língua



* Por Urariano Mota


Bem sei que a pesquisa no Google não é bom método de ciência. Por experiência sei que esse buscador reflete o que é notícia na imprensa e na rede. Mas sei que ainda assim, mesmo sem espelhar um método científico, todos nos aproximamos dele como um dos indicadores de pesquisa, para filtrar suas informações com melhor crítica e peso. Por isso ao Google recorremos. E no caso do Temer palavrão, o que encontramos tem sabor de uma descoberta.


Convido o leitor para um breve teste. Se buscar agora a frase Temer criminoso, terá 899.000 resultados. Se for atrás do Temer ladrão, pegará 725.000. Se procurar Temer corrupto, achará 685.000. Se procurar Temer puta, tê-lo-á em 599.000 soluções. Temer cu, 585.000. Temer 171, 525.000. Temer merda, 484.000. Temer pornográfico, 479.000. Temer canalha, 435.000. Temer safado, 369.000.

Entendam. O que vemos acima é apenas sintoma do clima geral no Brasil contra o golpista e traidor cujo nome foi transformado em insulto ou sinônimo de falta de ética. Se pensam que a ausência de manifestação de rua ou de protestos em massa é sinal de que o povo desconhece o grau da sua desgraça, muito se enganam. Basta um diálogo verdadeiro, de base, de cara a cara e inserção real para a máscara cair. Acredito que nem mesmo aquele deputado que lhe fez uma declaração de amor, com uma tatuagem no braço, será capaz de entrar num bar e se anunciar:
- Aqui, ninguém é mais Temer que eu.

Não, a sua coragem e cinismo não chegam a tanto. Porque seria o mesmo que se confessar: “eu, cabra safado confesso, eu, miserável filho da, eu que roubei a última bolacha de um miserável....”. Enfim - no ponto máximo da abjeção – “eu sou Temer”. Pois no meio do povo hoje quem ousa ser Temer? Eu já vi no Recife uma briga federal num ponto de táxi. Vi quando os taxistas começaram a discutir sobre quem era melhor no campeonato, se Sport ou Santa Canta Cruz. E como esse jogo nunca termina 1 x 1, um deles, um motorista gordo, mais exaltado, à beira de uma convulsão de ira, gritou para o outro:
- Tu é Temer!
- Temer é tu!
- Eu? Todo o mundo sabe: tu é Temer.
- Temer é a tua mãe!

O pau cantou. E pude ver: os motoristas que chegavam para apartar a briga aproveitavam e largavam a mão no motorista Temer. E se não fosse um Temer disfarçado, traiçoeiro e discreto, o Temer apontado seria morto à custa das pancadas da turma do deixa disso. 

No momento, podemos notar que o substantivo Temer assume os mais amplos sentidos de agressão e obscenidade. Virou palavra-ônibus. Só falta agora o povo carioca, com sua natural revolta e irreverência, usar a fórmula consagradora do insulto: vá tomar no Temer. 

Por fim, peço desculpa ao leitor se cometi alguma grosseria. Espero que me desculpem. Mas como escritor não podia calar uma mudança da língua hoje no Brasil. Era impossível o silêncio. Eu não queria que o leitor me mandasse para o Temer que me pariu.


* Escritor, jornalista, colaborador do Observatório da Imprensa, membro da redação de La Insignia, na Espanha. Publicou o romance “Os Corações Futuristas”, cuja paisagem é a ditadura Médici, “Soledad no Recife”, “O filho renegado de Deus”, “Dicionário amoroso de Recife” e “A mais longa juventude”. Tem inédito “O Caso Dom Vital”, uma sátira ao ensino em colégios brasileiros


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