segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Maneira de rezar


O trabalho é uma bênção, uma oportunidade que a vida nos dá de mostrarmos a nossa utilidade, a nossa competência, o nosso talento e a nossa capacidade. Não se trata, pois, como muitos afirmam, de “um mal necessário”, ou de eventual “maldição” por nossos erros, ignorância e contradições. E, muito menos, de “castigo” pela desobediência e fraqueza do mítico e alegórico casal original – suposto gerador de toda espécie – Adão e Eva, quando da expulsão do paradisíaco Jardim do Éden.

Claro que para adquirir transcendência e grandeza, é preciso que escolhamos fazer (sempre que a escolha seja possível), o que nos dê prazer e orgulho. E, principalmente, claro, que nos possibilite realizar aquilo para o que estejamos devidamente habilitados.

Mesmo as obrigações penosas, todavia, desde que necessárias, têm lá a sua importância e grandeza, por mais humildes e banais que pareçam. O pintor Henry Matisse expressou, com entusiasmo, o que sempre acreditei a esse propósito: “Eu creio em Deus quando trabalho”. Existe forma mais prática (e bela) de manifestar crença no, e adoração ao Criador de tudo o que há? Ou seja, ao primeiro e principal trabalhador do universo, feito, aliás, todinho por ele?! Claro que não!

Essa postura, até lógica – mas que muitos não se dão conta – completa-se, a caráter, com a manifestada do mito Marc Chagall, ao declarar, certa feita: “O trabalho é minha maneira de rezar”. A minha também! E justifiquei, não faz muito, essa afirmação, em uma crônica, em que comprovei (com fatos) que não se trata de mera retórica, como pode parecer, mas, sobretudo, de filosofia de vida. E de gratidão a Deus, e aos que me proporcionam as oportunidades de mostrar meu talento e meus conhecimentos.

Para mim, o trabalho é muito mais do que mera fonte de sustento, meu e da família. A remuneração, sem dúvida, é importante, porém não essencial. Encaro o fruto pecuniário do que faço como uma forma de reconhecimento ao meu empenho, assiduidade, responsabilidade e dedicação. Vejo-a como um elogio prático à qualidade e pertinência do que produzo. Mas é um fator secundário.

O trabalho é minha terapia mental e espiritual, a forma que conheço (e que utilizo) para manter a sanidade, num mundo cada vez mais insano, perverso e violento. Sua importância me fica nítida principalmente naqueles momentos difíceis, que todos enfrentamos (uns mais e outros menos), em que parece que tudo está contra nós. Em que crises e dificuldades de toda a sorte se acumulam e parece que o universo inteiro está determinado a nos ferir, quando não nos destruir.

Nessas ocasiões, busco resolver, claro, como manda a prudência, os problemas mais prementes, cuja solução acredite ter, e me abstraio dos demais. Afinal, não sou masoquista e detesto qualquer tipo de sofrimento. Prefiro apostar todas as minhas fichas na alegria, no bom-humor e na felicidade.

Mergulho, de cabeça, no trabalho, mantenho a mente sempre ocupada na produção de algo útil e positivo (não importa qual seja a sua natureza ou valor) e, como que num passe de mágica, o horizonte clareia. As nuvens ameaçadoras se dissipam e o sol volta a brilhar com toda a intensidade. Subitamente, o que antes parecia uma tragédia ou um prenúncio dela, se mostra em toda a sua verdadeira e mesquinha dimensão. Revela-se pequena, ínfima, banal e não raro acabo por sorrir da minha primitiva aflição.

É certo que tenho a felicidade de fazer o que gosto (e, como sempre digo, em tom até de galhofa, “e ainda por cima sou remunerado pelo que faço!”) e me entrego de corpo e alma à atividade que me dá prazer e que sei fazer razoavelmente bem: sou jornalista por vocação e, principalmente por opção. O jornalismo – que considero mais que profissão, missão de vida –, é mister lembrar, é um exercício que tende a ser estressante e aflitivo, caso não adotemos determinadas cautelas.

A exposição cotidiana, por anos a fio, ao que há de pior e de mais baixo no homem –  ou seja, a ganância, a violência, o cinismo, a corrupção etc. –, raramente passa impune. Se o jornalista não tiver valores éticos sólidos, crenças firmes, estabelecidas e comprovadas pelo tempo e uma dose considerável de idealismo, corre o risco de ser ferido, no corpo e na alma, e, não raro, de ver abreviada não só a carreira, como a própria vida. Ainda assim, é, sempre foi e sempre será a minha forma mais respeitosa e pia de adoração a Deus.

Peço licença, pois, ao paciente leitor. Tenho uma tarefa – como ocorre todos os dias, há já longos e felizes 53 anos – inadiável: a de render graças a Deus pelo privilégio da vida, da família, dos amigos e das oportunidades que me foram, generosamente, concedidas. Ou seja, vou “orar”, mas não me limitar à recitação de alguma eventual reza decorada e formal, murmurada com os lábios, mas não sentida, porém produzindo uma reportagem (ou um artigo, uma crônica, um conto, um ensaio ou mesmo um poema) nos quais empenharei, esteja certo, todas as minhas forças e conhecimentos, o máximo da minha capacidade, para que sejam perfeitos, honestos, isentos e construtivos. Amém!!!

Boa leitura!


O Editor.

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Um comentário:

  1. Seus escritos são construtivos e agregadores, informativos e úteis, concordemos ou não com a ideia defendida.

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