Boa viagem
* Por
Evelyne Furtado
Quem compraria
bilhetes para uma jornada árdua e insípida com incessantes escalas de contas a
pagar, de compromissos a cumprir e de estratégias complexas para a
sobrevivência?
Eu não compraria e meu
não seria enfático. Isso me soa mais sacrificante de que uma peregrinação
religiosa sem promessa de salvação ao fim.
E se o marketing
prometesse prazeres, sonhos de consumo, realizações de desejos, contemplações
estéticas, glórias e outras satisfações do ego?
Então eu pensaria mais
um pouco, afinal sou sensível às tentações como qualquer ser humano.
-Tem amor nessa
viagem? Perguntaria depois de contemplar os últimos itens com os olhos
brilhando de contentamento antecipado, mas desconfiada de uma ausência
essencial.
Diante da resposta
negativa, recuaria. Eu não suportaria o tédio salpicado de prazer. A vida sem
amor não faz sentido. Não me interessa uma viagem longa sem afeto ao começo, ao
meio, ao fim.
-A vontade amorosa
permeia toda a viagem! Eis a resposta que me convence. Assim, embarco e
recomendo a viagem. Pois a vida nasce do encontro de tais vontades e nelas se
sustenta, ainda que sejam expressões de outras pulsões, como quis aquele senhor
genial por quem nutro enorme admiração, simpatia e uma dose conveniente de
reserva.
*
Poetisa e cronista de Natal/RN.
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