quarta-feira, 16 de junho de 2010




O belo é muito natural

* Por Mara Narciso

Quando estava fazendo um roteiro de um especial para o Canal 20, ouvi a repórter Gissele Niza gravando um off para uma reportagem feita um pouco antes. Perguntei do que se tratava e soube da exposição dos artistas plásticos João Rodrigues, engenheiro, e Luiz Cláudio Guimarães, economista, cuja vernissage tinha sido na véspera. Não sou louca de perder uma oportunidade dessas e, após o trabalho fui à Casa de Cultura Márcia Prates à Rua Lírio Brant, 810, para ver as obras.

O local é gostoso e acolhedor, e mesmo eu, que sou tímida, chego naturalmente, sem perder a graça. Os artistas estão lá. Faz um pouco de frio nesse mês de junho. Conto que vim ver os quadros. Cumprimento os presentes, peço ajuda, e a filha de Márcia Prates, que infelizmente não perguntei o nome, me acompanha na visita.

Começo pelo sentido horário. Antes de me deter em cada peça, faço um giro de olhos pelo conjunto e noto que as cores são quentes, em tons laranja, e outros pigmentos avermelhadas. Do lado esquerdo da sala, os quadros de João Rodrigues apresentam figuras humanas fortes, torneadas, atléticas, do sexo feminino e masculino. Têm a pele predominantemente amarela, quase todas sem cabelos, e com um ar andróide. Essa fase de João Rodrigues privilegiou o rosto sem boca, e todos os personagens apresentam essa característica. Além dos humanos há outros elementos como letras, objetos, sapatos de salto alto, manchas que me lembram figuras rupestres, além de outros ornamentos. O último quadro mostra alguém angustiado. Os demais não sugerem esse sentimento. Apenas uma criança aparece em cena.

Luiz Cláudio Guimarães, por sua vez, se utiliza de formas orgânicas da natureza, arredondadas, flexíveis, que dão impressão de textura crespa, mas que ao toque são lisas. Há ainda imagens geométricas mais duras, e uns vasos de flores estranhas, talvez carnívoras. Numa das telas há figuras complementares, mas a imagem central é de três tubos maleáveis que comunicam o inequívoco calor de um abraço. Impressiona captar que esboços inanimados sugiram sentimentos humanos de afetividade. Há quadros com elementos figurativos inexplicáveis, e por isso mesmo devem fugir de raciocínios esdrúxulos. São formas curvilíneas de cores diversas, predominantemente em tons terrosos, comunicando atração e outras sensações quentes.

Cada um deles usa seus temas específicos, utilizam a mesma técnica, no entanto, obtém resultados totalmente diferentes. Mesmo que passeiem por diversas fases, e uma pode não ter nada a ver com a outra, trazem em todas elas, embutida no conjunto, a sua marca registrada, a sua assinatura, mesmo quando invisível.

Olho detidamente, mas não busco lógica, muito menos explicação. Obra de arte é o que é pelo efeito que causa no espectador, e não mais. O artista pode explicar, caso queira, mas acredito que nenhum deles deseje sofrer com essas prosas inúteis. Educadamente tenta dar racionalidade ao ato criativo, que mesmo sob a rigidez ocasional de um projeto, escapa do planejamento, pois a arte acontece no momento da criação. Depois de pronta, a sensação que suscita já não cabe mais na tela.
Alguns quadros estavam vendidos e, inclusive um dos compradores sentiu necessidade de levar a obra para casa na hora, não atendendo ao pedido do pintor, que gostaria de deixá-la exposta por um tempo maior.

Quando perguntado, o artista plástico não sabe dizer como a imagem surge, e muito menos, de onde ela vem. Por outro lado, poucos conseguirão entender o que seja criar.

Estou certa de uma coisa: o trabalho figurativo criado por Luiz Cláudio Guimarães traz sensações amorosas e humanas, e os personagens de João Rodrigues não têm boca e nem irão a Roma. Não falam, mas a imagem fala por eles. Ambos produziram arte para nosso deleite e contemplação.


* Médica endocrinologista em Montes Claros, acadêmica do oitavo período de Jornalismo e autora do livro “Segurando a Hiperatividade”

5 comentários:

  1. Como sempre, muito bom e muito lúcido o seu texto, Mara. Arte não tem de ser compreendida, dissecada, criticada ou explicada. Tem é de ser sentida. Um abraço e parabéns.

    ResponderExcluir
  2. A arte traduz muitas vezes
    o que não conseguimos falar.
    Abraços

    ResponderExcluir
  3. Arte é o que causa um certo "estranhamento", em minha opinião. Muito bacana o texto! Abraços!

    ResponderExcluir
  4. Não gosto de toda arte que vejo, e mesmo nessa exposição, não gostei de tudo. Valorizo no entanto o que sinto ao ver um quadro/escultura. Caso seja arte, não se fica indiferente.

    Obrigada pelos comentários.

    ResponderExcluir
  5. É como se eu tivesse ido com você a essa exposição, Mara, tão precisas são suas descrições.Parabéns!
    Beijos

    ResponderExcluir