quarta-feira, 18 de junho de 2014

Dos sonhos aos pesadelos

* Por Mara Narciso

Há quem faça de sonhos seus objetivos de vida, e consegue torná-los realidade. Agora, sob outra perspectiva, na forma real e não metafórica, os sonhos e os pesadelos, acontecem, e até que ponto se pode falar objetivamente de algo que não existiu de fato, e sim, apenas na mente durante o sono? Que os medrosos não se enfiem nesse mundo não terreno, no qual tem muito de sobrenatural. Quando se deita, o pensamento, antes racional e lógico, vai se tornando lento, superficial, aos poucos a sequência temporal foge, a cabeça fica leve, o corpo parece flutuar, e o sono chega. Quando conciliado, logo se aprofunda, havendo uma invasão de imagens não escolhidas, em que se passa a andar por caminhos estranhos, com cenários pouco nítidos, fugazes, envolvendo emoções, sustos e perigos. Não há como saber quanto tempo transcorreu. Durante os sonhos, os olhos se movimentam rapidamente, de um lado ao outro nas órbitas, enquanto as cenas, quando lembradas, vêm aos pedaços, cheias de dúvidas, como um livro lido há muito tempo, repleto de vazios.

O sono é algo incontrolável, haja vista os casos de acidentes ao volante. Há quem conte que teve sonhos, enquanto dirigia. Bom será se conseguir acordar. Os sonhos são imprevisíveis e inexplicáveis. Pode-se escolher um tema para sonhar, que fatalmente virá outro, a nossa revelia. Há quem se lembre de tudo e outros que afirmam nunca sonhar, pois são incapazes de se lembrar, mesmo que de pequenos fragmentos do que aconteceu no seu cérebro, enquanto dormia. Nas fases superficiais do sono, não há sonhos e os olhos sossegam, para em seguida começar novo percurso.

Cientistas e charlatães, entre outros, tentam explicar o significado dos sonhos, querendo relacioná-lo com o que já passou, com o que acontece e até mesmo com o futuro. O que se sonha, pode estar envolvido com temática do que se viveu naquele dia ou em dias recentes. Principalmente quando é algo que atormenta. No cinema, os sonhos mostram pessoas felizes, saindo de si mesmas, adquirindo uma imagem etérea e flutuando em prados cobertos de flores, céu azul, ar de prazer. Crianças reais sonhando, costumam sorrir, outras vezes podem acordar gritando, como se estivessem sendo perseguidas ou maltratadas.

Mais gostoso do que sonhar com determinadas pessoas, certas situações ou determinados lugares, é saber que se esteve no sonho de alguém, e de preferência em posição de protagonista. Há quem sonhe tanto e tão bem, que acabe ganhando dinheiro com isso. Acorda anotando o que sonhou, para não perder essa memória efêmera e facilmente dispersível. Há maneiras diversas na intensidade de fixação de fatos. Quando lemos, vemos, ouvimos ou sonhamos, as lembranças são guardadas de formas diferentes, podendo ser transitórias e fugidias. Alguém seria capaz de contar um sonho de anos atrás, sem inventar? Há casos de sonhos ou pesadelos recorrentes. No caso, a psiquiatria poderá explicar. Isso, sem até agora mencionar o sonho erótico, bem frequente.

Houve o caso de um pintor que pintava seus pesadelos, e com isso conseguia assombrar não a si apenas, mas a todos que viam suas obras. A forma mirabolante com que o cérebro adormecido consegue criar coisas faria a alegria de Hollywood, caso pudessem ser fielmente transformados em filmes de terror. Muitos deles devem ter sido provenientes desses casos.

A situação na qual se pode estar em certos sonhos maus pode ser considerada tortura pesada. Os lugares costumam estarem escuros, úmidos, ameaçadores. Há perseguidores desconhecidos, fortes e ágeis e que estão próximos do perseguido, justo quando a força foge e a esperança escapa. A vítima de pesadelo está perdida. Ou há íngremes subidas de pedra molhada, em que, num grande esforço se sobe, para se escorregar em seguida. Pode haver, e geralmente há um abismo em que se está em queda livre. É preciso andar em estreitos espaços, com os pés de lado, sem coragem de olhar para o despenhadeiro com monstros e cobras. Ou estar no alto de um prédio, do lado de fora, equilibrando-se no beiral sem ter onde segurar, e começa uma tempestade com vento, raios e trovões. Ao acordar, o alívio pode ser substituído pela dura realidade, dando vontade de se voltar ao pesadelo.

Existe um censor dos sonhos, um severo juiz. Quando o que foi sonhado fere os princípios íntimos de quem sonha, este é incapaz de se lembrar do que sonhou. Os sonhos são necessários para manter o equilíbrio mental. Quando frequentes, os pesadelos indicam anormalidade no sono. E então, o que há para hoje à noite? Que o dia seja bom, as ideias serenas, e que os sonhos possam ser suaves, com a presença de uma determinada pessoa, num lugar escolhido, e se tal não ocorrer, que se possa estar dentro do sonho desta mesma pessoa. Aí já será um sonho metafórico.

*Médica endocrinologista, jornalista profissional, membro da Academia Feminina de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico, ambos de Montes Claros e autora do livro “Segurando a Hiperatividade”   


Um comentário:

  1. Deseje-me bons sonhos, Mara. Isso se conseguir conciliar sono - há anos não sei o que significa dormir oito horas por noite. Seu texto mais uma vez equilibra o lado clínico com o jornalístico. Muito bom.

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