domingo, 22 de junho de 2014

Eu não sei andar de bicicleta


* Por Vitor Orlando Gagliardo


Não posso me queixar da vida. Acima de tudo, me considero uma pessoa de sorte. Tenho minha família e sou bem sucedido em meu trabalho.

Em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, Amém.

Acho que meu maior remorso foi não ter aprendido a andar de bicicleta. Pois é, sempre fui vítima de brincadeiras desse tipo. Uma vez pensei ser o único indivíduo da face da Terra com essa péssima proeza.
De certa forma, sempre tive uma grande dificuldade em direcionar minha vida. Por mais que me elogiassem, me sentia inseguro. Não sei explicar em detalhes.

Lembro da juventude, das brincadeiras na rua, dos bailes ... da universidade. Parece que foi ontem o dia da minha formatura. Ah! Já ia me esquecendo (deve ser a idade): foi nessa época que conheci minha futura esposa, Fernanda.

Aliás, ainda nem me apresentei. Meu nome é Osvaldo. Sou formado em odontologia. Fernanda é professora de matemática para o primário. Hoje estamos aposentados.

Lembro que logo após a universidade, foi uma grande dificuldade para conseguir meu primeiro emprego. Fui em diversas entrevistas, pedi até para o feirante uma oportunidade. Fiz promessas, fiquei desacreditado e por fim, rezei no começo sem muita convicção, mas depois por pura devoção.   

Senhor, escutai nossa prece.

E Ele escutou. Consegui um emprego como professor universitário. Foi meu primeiro e único. Com o dinheiro que ganhava, pedi Fernanda em casamento. Nosso casório foi com uma cerimônia simples, mas a Igreja estava muito cheia. Nossa lua-de-mel foi em Búzios. Até hoje, comemoramos uma data especial no mesmo hotel.

Nasceu nosso primeiro filho. Tiago, esperto como a mãe. Ao todo temos sete. Leandro, Laura, Eugênio, Marisa, Joana e Rogério. Todos nasceram com muita saúde.

Nossa vida sempre foi marcada pela simplicidade e alegria. Nossos filhos cresceram e foram para a universidade. Só tenho a agradecer.   

Na noite em que ia ser entregue, Ele tomou o pão, deu graças, e o partiu e deu aos seus discípulos, dizendo: TOMAI, TODOS, E COMEI: ISTO É O MEU CORPO, QUE SERÁ ENTREGUE POR VÓS.

Do mesmo modo, ao fim da ceia, Ele tomou o cálice em suas mãos, deu graças novamente, e o deu a seus discípulos, dizendo: TOMAI, TODOS, E BEBEI: ESTE É O CÁLICE DO MEU SANGUE, O SANGUE DA NOVA E ETERNA ALIANÇA, QUE SERÁ DERRAMADO POR VÓS E POR TODOS PARA REMISSÃO DOS PECADOS. FAZEI ISSO EM MEMÓRIA DE MIM.

Às vezes parece egoísmo, mas é difícil aceitar que seus filhos cresceram. Parece que nasceram ontem. O tempo passa sem percebermos.

Hoje tudo é mais fácil. Nossos filhos têm acesso a coisas que não tive. Comecei a trabalhar aos sete anos e meus pais não tinham como comprar brinquedos e boas roupas.

Graças a Deus, meus filhos jamais precisaram trabalhar para o próprio sustento.

Por Cristo, com Cristo, em Cristo, a vós, Deus Pai todo-poderoso, na unidade do Espírito Santo, toda honra e toda glória, agora e para sempre.  Amém.

Missão cumprida. Nossos sete filhos estão formados e trabalhando. Parece um sonho. Meu pai sempre me dizia “Você precisa trabalhar para que seus filhos não passem pelo que passou”. Pois bem, pai, acho que cumpri minha missão. E isso não seria possível sem a ajuda de minha amada, Fernanda. Graças a ela, nossa família está toda reunida e nossos filhos são grandes amigos.

Pai nosso que estais no céu ...

Lembro-me bem dos nossos filhos correndo pela casa, fazendo bagunça e brigando, na maioria das vezes, por nada. Hoje estão todos casados. Já tenho cinco netos. Rafael, João Pedro, Letícia, Eduardo e Milena. Joana está grávida de gêmeos, Maurício e Nicole. Será que vou vê-los? Senti-los em meus braços?

Tenho quase oitenta anos. Tem sido difícil acordar nos últimos dias. O corpo já não atende aos meus comandos. Sinto-me cansado. A casa está vazia. Embora aposentada, Fernanda faz questão de ir trabalhar. Nossos filhos moram em suas próprias casas. A minha missão já foi cumprida. Pelo menos aqui.

Senhor, eu não sou digno de que entreis em minha morada, mas direi uma só palavra e serei salvo.

Não consigo abrir meus olhos. Estou imóvel. Com muita dificuldade consigo mexer minhas pálpebras. O que está acontecendo? Vejo todos meus filhos, netos e Fernanda ao meu redor. Eles estão chorando. Não, não e não. Vejo uma luz em minha frente. Meu Deus! Nem tive como me despedir.

Não chorem! Estarei sempre aqui. Será que vou aprender a andar de bicicleta no céu?

Não direi adeus. Apenas, até breve!

O Senhor esteja convosco. Ele está no meio de nós. Abençoe-vos Deus todo-poderoso, Pai e Filho e
Espírito Santo. Amém. Ide em paz e o Senhor vos acompanhe.
Graças a Deus.

OBS.: In memoriam; Vô Orlando, Vó Ângela, Tia Beth (Até breve!).

* Jornalista




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