* Por Pedro J. Bondaczuk
A mudança que se verifica no comportamento das pessoas nestes anos iniciais do terceiro milênio da era cristã se caracteriza, em especial, pela degradação de alguns conceitos tidos como básicos para civilizações. Palavras como dever, pátria, amor, lealdade, gratidão, honra, honestidade perdem cada vez mais seu sentido original pela inadequação do uso. De todas elas, porém, a que provavelmente mais se desgastou foi "compromisso". Ou seja, "promessa para com alguém", que é o seu verdadeiro significado.
O termo, e pior do que ele, o ato, vêm sofrendo erosão em todas as relações humanas. Na política, no convívio social, no casamento – instituição francamente em crise, conforme revelam as estatísticas.
Ao lado dessa palavra, sua "irmã gêmea", "contrato", vem caindo no ridículo. Havia um tempo em que, quando duas partes combinavam algo, era dispensável que se redigisse algum documento para testemunhar essa combinação. Bastava a palavra dos contratantes. E o compromisso era respeitado às últimas conseqüências.
Hoje, termos extensos, repletos de cláusulas, registrados em cartório, firmados por diversas testemunhas, são desrespeitados sem a menor cerimônia. Esse é um dos motivos da crise que a humanidade vive neste período tão rico de promessas e paupérrimo de resultados.
O jornalista, filósofo e político francês, Raymond Aron, observou, com muita propriedade: "O compromisso é uma necessidade, não um valor". Sem ele, qualquer sociedade se transforma num amontoado de pessoas, num grupamento caótico, em que ninguém respeita a esfera do direito alheio.
Parte da culpa pela erosão desse princípio básico de civilização cabe à educação, ou melhor se diria, à deseducação caracterizada por se rotular como "demodé" todos os valores tradicionais: a ética e o respeito mútuo entre as pessoas.
Políticos fazem promessas em profusão, já sabendo de antemão que não poderão cumprir. Casais juram reciprocamente "amor eterno", esquecendo-se da própria efemeridade. Pessoas as mais diversas, muitas inclusive ostentando uma respeitabilidade que sequer possuem, empenham suas palavras de forma solene, para em seguida quebrá-las, negando, inclusive, que tenham assumido qualquer compromisso.
O que ocorreu, por exemplo, com as promessas de palanque feitas pelos políticos das mais diversas esferas administrativas? Onde ficou, por exemplo, o propalado empenho pelo combate à corrupção? Suas atitudes desleais em relação aos que confiaram em suas promessas e até juras, desacreditaram ainda mais uma atividade que, convenhamos, nunca gozou de muito crédito. Com isso, comprometeram os raros, que honram seus compromissos e que são colocados no mesmo “balaio”.
Hoje em dia há dois tipos de miséria, ambos perniciosos e degradantes. Um é o caracterizado pela falta até do essencial para a sobrevivência, no qual estão mergulhados dois terços da humanidade. O outro é até mais grave e assola nações ricas e poderosas. É o que o escritor argentino Ernesto Sábato classificou de "miséria espiritual", que se abate, sobretudo, sobre os países do Primeiro Mundo.
Cabe aos que desejam conservar seu acesso à cidadania lutar pelo resgate do compromisso, do contrato, do dever e do patriotismo. Agir como Almeida Garret sentenciou um dia: "Como cidadão, nunca renunciarei a um direito". Cabe a cada um cobrar, em todas as instâncias cabíveis, os seus, sobretudo o de ter os compromissos assumidos por quem quer que seja, rigorosamente cumpridos. É o mínimo que se pode exigir.
* Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance Fatal” (contos) e “Cronos & Narciso” (crônicas). Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk
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