quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Shoppings: templos de consumo e de desejo (E muitas perguntas)

* Por Emanuel Medeiros Vieira

** Em memória do poeta Juan Gelman

Os shoppings são a antiga Ágora grega – o coração da cidade. Globalização? Da indiferença? Cabeças decapitadas, império do tráfico. Um menino me indaga; “O mal está vencendo?” Olho fixamente nos seus olhos: “Está”. Consolo-o: “Mas não será para sempre.”

Sociedade do espetáculo, e o  templo é de consumo – não para orar. O que significa isso tudo? “Rolezinhos” – transgressão? Desejo do tênis de marca? Ou de proclamar: “também existimos?”.

Grito contra a exclusão, voz dos que não têm voz – a periferia berrando? Não sei. Sei que a baixar o cacete não resolverá. A medida de valor ainda é o dinheiro, a cor da pele. Sem as posses dos meninos ricos – os vícios são iguais? Desigualdade? Sim. Viramos apenas consumidores. Não cidadãos. (Não almejo o panfleto).

E só tenho perguntas. Fim de tudo? De sonhos, ilusões, projetos? Ou não é nada disso? Um universo dessacralizado – sem fé. Crack, crime, medo – HORROR -, e lagostas para a governadora.

“O presente. O presente é tudo o que tens como tua possessão. Como Jacó fez com o anjo: retém-no até que ele te abençoe” (John Greenleaf Whittier). Que tempos!

Queria escrever no epitáfio: sem glória, mas com ternura).
(Brasília, janeiro de 2014*)

**Morreu no México, em 14 de janeiro de 2014, o poeta e jornalista argentino Juan Gelman. Durante a ditadura militar argentina (1976-1983), Gelman teve o seu filho ((Marcelo) assassinado. Sua nora, Maria Cláudia, foi sequestrada enquanto estava grávida e levada ao Uruguai pela “Operação Condor”. Nesse país, deu à luz e desapareceu. A filha do casal (Macarena) foi entregue a um policial uruguaio e só teve a identidade revelada em 2000. Grande parte da vida deste grande poeta e humanista foi dedicada (com comovente paixão e intensidade) a esclarecer o que havia ocorrido (com sua família e com o seu país), naqueles tempos tão sinistros e sombrios.

* Romancista, contista, novelista e poeta catarinense, residente em Brasília, autor de livros como “Olhos azuis – ao sul do efêmero”, “Cerrado desterro”, “Meus mortos caminham comigo nos domingos de verão”, “Metônia” e “O homem que não amava simpósios”, entre outros. 


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