O arfante peito meu
* Por
Clóvis Campêlo
Nascido depois, amigos,
não fui testemunha da decisão entre Brasil e Uruguai, em 1950. Toda a
informação que tenho hoje sobre aquela tragédia, obtive através da imprensa
falada, escrita e fotografada. Tudo em preto e branco, como permitia a
tecnologia da época. A bola de Ghiggia entrando, a cara desolada de Barbosa, o
choro desconsolado das arquibancadas. Tudo variando do branco da camisa que
vestia a seleção brasileira no dia fatal ao preto das sombras que assolaram o
Maracanã. Mesmo assim, até ontem, esse fantasma me assombrava.
É claro que a partir de
1958, quando em tons amarelos ganhamos nossa primeira copa do mundo, a coisa se
transformou e a eterna dor da derrota no Maracanã transformou-se em ímpetos de
alegria e orgulho. A seleção brasileira passou a ser a pátria de chuteiras,
redimindo-nos dentro de campo e elevando bem alto a nossa auto-estima. Aquele
era um país que ia para a frente dentro e fora de campo, dizia o Gauss da
época.
É bem verdade que entre
os jogadores brasileiros que participaram da Copa em 1950, alguns sobreviveram
à catástrofe, como Nílton Santos, que se tornaria bicampeão mundial, em 1958 e
1962, e seria considerado o maior lateral esquerdo de todos os tempos no
futebol mundial. O próprio Barbosa, embora não tenha mais voltado à seleção
brasileira, também teve uma longa carreira, após o Maracanaço, chegando,
inclusive, a defender o glorioso Santa Cruz, no final dos anos 50, quando foi
supercampeão pernambucano pela equipe coral. A maioria, porém, ficou
definitivamente marcada pelo fracasso daquela decisão. No final, tudo aquilo
conseguido durante o torneio, toda a bela campanha, foi reduzido à nada com a
derrota.
Ontem, amigos, ao vivo
e à cores, a situação repetiu-se para nós, com o agravante de uma goleada
inesperada. Por mais que estivéssemos mal na competição, com uma equipe
desentrosada e sem um esquema tático definido e eficiente, ninguém esperaria
uma derrota por 7x1 para a Alemanha. Em dez minutos, ainda na primeira etapa, a
máquina germânica nos impôs cinco tentos, sem que a nossa seleção conseguisse
esboçar qualquer reação possível. Descuido, desatenção e desânimo, assim
poderíamos definir a questão. Assim, na derrota achapante, diluiu-se o sonho do
hexa. Assim, na capital mineira, mostrou-se para nós um horizonte nada belo. A
síndrome do fracasso em terras brasileiras voltou a nos assolar. Fomos
atropelados por uma seleção que prima pela atenção e repetição sistemática de
jogadas bem ensaiadas. A criatividade brasileira, tão mal executada nesta Copa,
caiu definitivamente por terra diante do mecanicismo alemão.
Resta-nos agora por em
prática o senso de responsabilidade que ainda nos resta e nos prepararmos para
enfrentar o perdedor do jogo de hoje, entre Holanda e Argentina, no próximo
sábado, em São Paulo.
A vitória talvez sirva
para aquietar o arfante peito meu.
* Poeta,
jornalista e radialista, blogs:
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