quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

A toalhinha do amor

* Por Edir Araujo.

Era uma toalhinha cor de rosa, confeccionou e bordou com muito carinho. Pendurava no varalzinho do banheiro. Estava sempre lá, limpinha, cheirosinha, quietinha, aguardando o momento de visitar nossa intimidade. Mas um certo dia ela desapareceu. 

"Você viu a toalhinha do amor?" Perguntou ela. 

Respondi: "Sua toalhinha? Não, não vi. Por que? Sumiu?" 
- Minha não, nossa. Nossa toalhinha do amor! (zangou-se) E sumiu... por acaso você pegou?
- Claro que não. Só pegamos quando fazemos amor, lembra? 
- Pegamos não, eu que pego (corrigiu ela)  e levo pra cama, uso muito mais que você, sabe disso! E você nunca lembra dela.
- Mozinho, já disse que não sei.
- Mas não é possível. Lavei hoje de manhã e pendurei no varalzinho. 
- O quê? Tá maluca? Ontem não fizemos amor, nem hoje pela manhã...
- É... é que...

Fui até o banheiro, pensativo, com a pulga atrás da orelha. De fato, não estava lá.
- Martha, você tá me traindo?
- Tá duvidando de mim? Você tá me ofendendo..
- Desculpa, vai... mas isso tá muito estranho. Há anos que a toalhinha fica lá e... eu nem tinha percebido. 
- Pois é, mas sumiu...
- Você deve saber, se lavou de manhã... não colocou noutro lugar?
- Claro que não!
- Isso tá me deixando confuso, por que lavou se não foi usada?
- É... não sei...
- Martha, você tá me escondendo alguma coisa.
- Você pirou? Não tô escondendo nada. É que recebi aquela visita indesejável de manhã...
- ??????? 
- Que visita?
- Ora, Afonso, não se faça de desentendido. O chico, porra...
- Ué... Mas o chico foi embora há uma semana...
- Tinha um restinho, vi na calcinha, pensei até que fosse corrimento, mas era ele que ainda não tinha ido embora de vez. 
- Tá, vá lá que seja, mas você tem que lembrar onde colocou.
- Peraí, a campanhia tocou de repente, fui até a porta, era Lourdinha, agora lembrei...
- E daí ?
- Ei... ela usou o banheiro... será que...
- E porque sua irmã roubaria a toalhinha? Uma coisa tão íntima, com nossos nomes que você bordou nela, dentro de um coração...
- Aí é que tá... só pode ter sido ela. 

Telefonou pra Lourdinha soltando cobras e lagartos: - Sei que foi você, Lou... trata de me devolver.
- Tá maluca? Pra que eu ia querer isso? Ah, fala sério, tenho mais o que fazer. - Replicou Lourdinha batendo o telefone.

De repente Zeus entra na sala e Martha dá um berro de susto:
- Seu filha da puta, ai... não acredito nisso... - Esbraveja Martha, caindo em choro convulso.
- Eu mato esse cachorro, olha isso, estraçalhou a nossa toalhinha...
- Mas como? Ele não alcança no varal. 
- Sei lá, deve ter caído do varal quando fui atender a Lourdinha...
- Alô! Lou? Desculpa eu t... ter duvidado de você... 
- Calma, por que tá chorando?
- Foi o Z... Zeus que pegou, quase me ma... (hic) matou de susto quando o vi com a toalhinha na boca, toda retalhada... 
- Estou indo aí, mas para de chorar...

Eu rachava o bico tentando tirar a toalhinha da boca de Zeus. Martha me fuzilava com ódio no olhar:
- Você acha engraçado, é? Agora deixa que ele engula essa porra. Já rasgou tudo mesmo...
Nisso chega Lourdinha tentando acalmar a irmã: - Não é o fim do mundo, Marthinha, você borda outra toalhinha...
- Leva esse filha da puta desse cachorro daqui senão eu vou matar ele... 

Foi aí que interferi com bravura: Nada disso, o Zeus não sai daqui nem morto.
- Ah é? - Vociferou Martha histericamente: - Ou ele ou eu... Se ele ficar eu vou pra casa da mamãe, e não duvide de mim, seu calhorda,  e ainda se divertindo com tudo isso, não é?

E assim ficou tudo resolvido. Lourdinha levou o Zeus e a paz voltou a reinar... Será?

Altas horas, minha mão atrevida começa a bolinar o corpo de Martha: - Tira essa mão pra lá... (ralhou). Não acredito que ainda consegue pensar em sexo. Além do mais sem a toalhinha do amor, neca de pitibiriba...

Edir Araujo resgatando suas crônicas do fundo do baú.

15 de março de 2007.

* Edir Araujo é poeta e escritor, autor dos livros A PASSAGEM DOS COMETAS E GRITOS E GEMIDOS.


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