quinta-feira, 24 de maio de 2012

Quê? Como assim?


* Por Fernando Yanmar Narciso


O início de minha adolescência coincidiu com a chegada da TV a cabo à minha cidade em 1998. Minha família foi uma das primeiras a adotar essa novidade, assim como ocorreu com o videocassete. Na época existia uma série no Warner Channel – será que alguém ainda assiste esse canal? – chamada Mortal Kombat: Conquest, livremente inspirada na famosa série de videogames, surgida ainda no calor do sucesso do filme de 1995. Fui um consumidor ávido dessa série, que passava nas tardes de sábado.

Num tempo em que o MMA nem existia e filmes de kung-fu ainda tinham alguma relevância, assistir àqueles caras mascarados de armadura se engalfinhando – com direito à “impressionante” computação gráfica dos anos 90 para pontuar os golpes fatais – era um passeio no parque para um viciado em games como eu era na época. A série nem chegou a ter 30 episódios e teria passado batida pela minha memória privilegiada, não fosse por um detalhe: O último capítulo.

A série já não tinha feito sucesso e o desespero dos autores por idéias devia ser cataclísmico, mas talvez tenham usado a desculpa de que como a série ocorria uns 1.000 anos antes do primeiro jogo, o triunfo do mal sobre o bem pode ter sido usado como escada para a narrativa do mesmo. Hoje admiro a coragem dos realizadores de encerrar a série assim, mas imagine você, nos primórdios da adolescência e grande fã dos jogos, presenciando todos os heróis ancestrais e seus aliados, incluindo Lord Rayden, o grande deus das forças do bem, sendo mortos ou se ajoelhando diante de Shao Khan, o representante máximo de todo o mal do universo? Tremenda puxada de tapete! A partir daquela tarde de sábado, jurei para mim que nunca mais me deixaria envolver emocionalmente com nenhum programa de TV.

Uma grande verdade sobre todo tipo de obra de ficção é que o final sempre divide a audiência, afinal é impossível agradar gregos e troianos, a menos que estejamos falando de Thriller, do Michael Jackson. Quantas vezes você não se envolveu de tal forma com, por exemplo, um livro, que ao chegar á última página sua reação foi “Hum, nhééééé...”? Dan Brown e Sydney Sheldon ecoam em minha mente...

Digo por experiência própria que não é fácil segurar as rédeas de um enredo. Levei um ano escrevendo meu romance – ainda não concluído – e não foram poucas vezes em que me peguei com o calhamaço na mão, pensando “PQP, quê que eu faço agora?”

Mas coisa alguma é capaz de testar sua força de vontade como uma série de TV, ou no caso do brasileiro, uma novela. Todos sabemos que o casal de mocinhos dirá “aceito” no final e a mocinha dará a luz a um rebento com aparência de 2 anos e que os caras maus serão punidos, mas o que nos prende à tela é a forma como todo o perrengue de 8 meses de história será conduzido ao final feliz. Todo autor entrega a novela já escrita até o capítulo 60 com meses de antecedência para receber aprovação do Grande Rei do canal. Então, a partir do capítulo 61 é só agonia até a última cena. Todos eles, por volta do centésimo capítulo, já se esqueceram completamente da proposta original, então tratam de dar tiros no escuro pra ver se acertam alguma coisa e o acerto passa a ser o fio condutor da trama, logo os tiros de bazuca no pé são inevitáveis. Pelo menos foi o que o sósia do Clodovil, Aguinaldo Silva, disse no Roda Viva.

As fichas apostadas na nova geração de autores são altíssimas, sem falar na pressão. Até o momento o autor “King of cool” da Vênus Platinada tem sido o João Emanuel Carneiro. Apostando numa forma meio punk de fazer melodrama, tudo o que ele tem colocado a mão até agora virou ouro. Depois do samba do afrodescendente doido que foi Fina Estampa, todo mundo voltou a confiar no poder de uma boa trama com Avenida Brasil, mas torçamos para que ele não jogue m.... no ventilador de novo e resolva trair toda a mitologia da história, como na famigerada metade de A Favorita. Mas talvez essa abilolada no texto tenha sido proposital, como uma homenagem ao Aguinaldo, autor mais adepto dentre eles ao enredo aleatório. Continuamos de olho na Nina, João! Nada de cortar o clima, hem?

*Designer e escritor. Site: HTTP://terradeexcluidos.blogspot.com.br

Um comentário:

  1. Mesmo sem ver TV e muito menos novela, coisa que você acompanha de lado, vendo vídeos na internet, não posso deixar de pensar sobre sua análise. Fala sério parecendo escrever humor. É muito interessante a sua maneira de escrever. Eu gosto, e espero que muitos outros apreciem.

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