quinta-feira, 17 de maio de 2012

Necessidade conselheira

* Por Pedro J. Bondaczuk

A inveja é um dos sentimentos (ou comportamentos) mais comuns no mundo e apresenta vários tipos e graduações. Há aquela extrema, doentia, praticamente uma obsessão, que leva as pessoas a cometerem desatinos e loucuras para se igualarem, ou superarem (pois essa é a sua meta), aquele que é invejado.

Não raro, esses grandes invejosos, quando não têm talento e capacidade para chegarem ao mesmo patamar de riqueza, beleza (ou seja o que for) da vítima, buscam derrubá-la, de todas as formas, para que não se sintam tão inferiores. Há uma forma de inveja, no entanto, que chega a ser sadia e que gostaria que os outros tivessem por mim. Recebe o nome de “admiração”.

Invejo, por exemplo, vários escritores, cujos passos procuro imitar e raramente consigo. Jamais tentaria destruí-los e não permitiria nunca que alguém tentasse ou fizesse isso. Claro que apenas os bem-sucedidos são invejados. Ninguém, óbvio, inveja um fracassado...

Por mais confiança que tenhamos em nosso preparo, talento e capacidade (tanto física quanto mental), há ocasiões em que nos mostramos indecisos diante de determinadas tarefas, desafios ou obstáculos, sem sabermos como proceder. Isso é normal. Não há quem não tenha encarado, alguma vez, situação em que não sabia como proceder e teve que se guiar, apenas, pela intuição.

Anormal, porém, é fazer da indecisão uma prática comum, uma atitude corriqueira, um hábito. É não saber (ou não querer) decidir as coisas mais comezinhas e elementares da vida, como, por exemplo, que roupa vestir, o que dizer quando indagado por alguém a qualquer propósito e outras coisas do mesmo tipo.

Embora pareça exagero, há pessoas (e não poucas) que agem assim com freqüência, quando não o tempo inteiro. Há, contudo, um remédio infalível (posto que amargo) para a indecisão. Chama-se “necessidade”. Quando realmente precisamos de algo, nosso cérebro improvisa ações e nos impele a agir.

Se o mais adequado para o momento for pedir ajuda, por mais orgulhosos que sejamos, “calçamos as sandálias da humildade” e pedimos. Se a situação exigir esforço físico, desdobramo-nos ao nosso limite e fazemos o que tem que ser feito. Nessas circunstâncias, a indecisão vai para o espaço, por mais indecisos que sejamos habitualmente. Não há, portanto, conselheira melhor do que a necessidade.

Algumas pessoas, em momentos de extrema aflição pelos quais todos passamos algum dia, julgam terem perdido tudo o que tinham, quer no plano material, quer no espiritual, inclusive a esperança. Estão enganadas, claro! Desconhecem o momento seguinte, o próximo segundo, em que, à sua revelia, tudo pode mudar para melhor. A vida é assim, constituída de imprevistos.

Ademais, é essa imprevisibilidade que lhe dá encanto, pelo sabor de aventura. A esperança, mesmo que não acreditemos, nunca nos deixa. Às vezes esconde-se, como uma garotinha travessa, à espera de ser encontrada. Mas está sempre ali, presente, nos cutucando as costas e nos forçando a agir. É fidelíssima e não nos abandona em nenhuma circunstância. E acabamos agindo, se estivermos em estado de necessidade.

É verdade que nem sempre aquilo que necessitamos é de caráter material. Não raro, são a paz e a felicidade o que mais ansiamos por obter. São duas condições intangíveis, abstratas e um tanto vagas. Mas são necessidades concretas que cada um tem que conquistar sozinho. Ninguém pode nos conceder nenhuma das duas.

Há pessoas, é verdade, que contribuem (e decisivamente) para a sua conquista e manutenção. Mas trata-se de tarefa individual, de cada um de nós, mediante nossas atitudes e, principalmente, nossa predisposição espiritual. A paz e a felicidade são tão solitárias quanto o nascimento e a morte.

O filósofo português, Agostinho da Silva, escreve o seguinte, a esse propósito, em seu livro “Textos e ensaios filosóficos”, cuja leitura recomendo: “Nem paz nem felicidade se recebem dos outros nem aos outros se dão. Está-se aqui tão sozinho como ao nascer e no morrer, como de um modo geral no viver, em que a única companhia possível é a daquele Deus a um tempo imanente e transcendente”.

E Ele está sempre presente na vida, inclusive dos descrentes, acalmando seus corações nos momentos mais agudos de dor e desespero e os predispondo à alegria e felicidade, mesmo à sua revelia. Mas estas somente serão obtidas, de fato, se sentirmos incontida necessidade delas.

* Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance Fatal” (contos) e “Cronos & Narciso” (crônicas). Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk

Um comentário:

  1. Uma amiga me disse: "você pode até não acreditar em Deus, mas Ele acredita em você". Um pouco como sua frase "E Ele está sempre presente na vida, inclusive dos descrentes". Também boas as considerações sobre a inveja. Acredito sofrer pouco desse sentimento, porém gostaria se senti-lo mais, especialmente quando for inspiração para alcançar a paz.

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