O sentimento nacional
* Por
Emir Sader
O Brasil só começou a
se pensar como pais, como nação, como povo, a partir da chegada do Getúlio ao
poder. Antes, vivíamos para fora e desde fora. Economia exportadora e
importadora, sem produção nacional, sem mercado interno importante.
Se pensar como país é
concomitante a ter sentimento nacional, ter auto estima. Não foi por acaso que
Fernando Collor e FHC atentaram fortemente contra a nossa autoestima, para
poder implementar o modelo econômico mais antinacional e antipopular: o modelo
neoliberal, que escancarava o país para a exploração externa.
Collor atacou os
servidores públicos como “marajás” e os carros produzidos aqui – como metáfora
de toda a indústria – como “carroças”. FHC atacou os servidores públicos e os
aposentados como “preguiçosos”. Para isso, FHC disse que ia “virar a página do
getulismo”, porque queria liquidar o sentimento nacional e as conquistas dos
trabalhadores.
A vitória do Lula e o
sucesso do seu governo foram o maior incentivo à autoestima dos brasileiros, a
que nos repensemos como país no mundo, como tipo de sociedade que queremos e
podemos construir. Ter orgulho de novo de ser brasileiro é a alavanca para
todos os outros avanços do país.
Todos os grandes
movimentos populares de transformação do mundo tiveram um componente
indispensável no sentimento nacional. A Revolução Russa se fez, também, como
reação ao avassalamento do país, derrotado na guerra contra o Japão e tornado
servil aos interesses das grandes potencias imperialistas, a Inglaterra e a
França.
Posteriormente, a
resistência soviética à invasão alemã, a derrota do exército nazista e o avanço para derrubar o regime do Hitler – o
que mudou o curso da segunda guerra e da própria historia -, se fez em nome da
Grande Guerra Patriótica, como resistência do povo contra a invasão alemã.
A Revolução Chinesa foi
possível como desdobramento da expulsão da invasão japonesa e da
norte-americana, com um profundo sentimento nacional e orgulho de serem
chineses, que hoje eles voltam a exibir. A Revolução Vietnamita foi uma
revolução profundamente nacional nas suas origens, para expulsar os
norte-americanos e derrotar o regime fantoche que eles tinham instalado no sul
do país.
A Revolução Cubana foi,
antes de tudo, uma revolução democrática e nacional, contra a ditadura pró
norte-americana do Batista. Da mesma forma que a nicaraguense, contra a
ditadura dos Somoza.
Esse componente
nacional é chave na disputa política e ideológica. O que provavelmente mais dói
na direita brasileira e nos seus aliados internacionais, foi a capacidade do
Lula de levantar bem alto o orgulho de sermos brasileiros, a possibilidade de
que o país dê certo, de que podemos e devemos seguir nosso próprio caminho,
aliado aos países da região e do Sul do mundo, sem nos subordinarmos aos EUA.
A operação
antibrasileira em curso atualmente, aqui dentro e desde fora do país – tem o
objetivo de destruir a imagem do Brasil do Lula. Do país que mais luta contra a
fome no mundo, que mais diminui a desigualdade, que cresce distribuindo renda,
que se afirma como país soberano. Para isso tem que difundir esse clima de
pessimismo, veiculado pelo monopólio antidemocratico da mídia.
Que o governo é
incompetente, corrupto, que tudo que é comandado desde o Estado não dá certo. Que
o país trilhou um caminho errado distanciando-se dos EUA e dos modelos
centrados no mercado. Que os salários são os responsáveis pela diminuição do
ritmo de crescimento e não a especulação financeira.
Em suma, precisam
voltar a derrubar a autoestima dos brasileiros, voltando ao fatalismo de que
não teríamos jeito. Quem contribui para isso, conscientemente ou não, pela
direita ou pela ultraesquerda – queimando bandeiras do Brasil, torcendo contra
a seleção, não valorizando todos os avanços na situação do povo – faz o jogo da
direita, dos retrocessos. Que somente são possíveis com um povo desmoralizado,
derrotado, sem auto estima, sem sentimento nacional.
* Sociólogo
e cientista político
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