Dos sonhos aos pesadelos
* Por
Mara Narciso
Há quem faça de sonhos
seus objetivos de vida, e consegue torná-los realidade. Agora, sob outra
perspectiva, na forma real e não metafórica, os sonhos e os pesadelos,
acontecem, e até que ponto se pode falar objetivamente de algo que não existiu
de fato, e sim, apenas na mente durante o sono? Que os medrosos não se enfiem
nesse mundo não terreno, no qual tem muito de sobrenatural. Quando se deita, o
pensamento, antes racional e lógico, vai se tornando lento, superficial, aos
poucos a sequência temporal foge, a cabeça fica leve, o corpo parece flutuar, e
o sono chega. Quando conciliado, logo se aprofunda, havendo uma invasão de
imagens não escolhidas, em que se passa a andar por caminhos estranhos, com
cenários pouco nítidos, fugazes, envolvendo emoções, sustos e perigos. Não há
como saber quanto tempo transcorreu. Durante os sonhos, os olhos se movimentam
rapidamente, de um lado ao outro nas órbitas, enquanto as cenas, quando
lembradas, vêm aos pedaços, cheias de dúvidas, como um livro lido há muito
tempo, repleto de vazios.
O sono é algo
incontrolável, haja vista os casos de acidentes ao volante. Há quem conte que
teve sonhos, enquanto dirigia. Bom será se conseguir acordar. Os sonhos são
imprevisíveis e inexplicáveis. Pode-se escolher um tema para sonhar, que
fatalmente virá outro, a nossa revelia. Há quem se lembre de tudo e outros que
afirmam nunca sonhar, pois são incapazes de se lembrar, mesmo que de pequenos
fragmentos do que aconteceu no seu cérebro, enquanto dormia. Nas fases superficiais
do sono, não há sonhos e os olhos sossegam, para em seguida começar novo
percurso.
Cientistas e
charlatães, entre outros, tentam explicar o significado dos sonhos, querendo
relacioná-lo com o que já passou, com o que acontece e até mesmo com o futuro.
O que se sonha, pode estar envolvido com temática do que se viveu naquele dia
ou em dias recentes. Principalmente quando é algo que atormenta. No cinema, os
sonhos mostram pessoas felizes, saindo de si mesmas, adquirindo uma imagem etérea
e flutuando em prados cobertos de flores, céu azul, ar de prazer. Crianças
reais sonhando, costumam sorrir, outras vezes podem acordar gritando, como se
estivessem sendo perseguidas ou maltratadas.
Mais gostoso do que
sonhar com determinadas pessoas, certas situações ou determinados lugares, é
saber que se esteve no sonho de alguém, e de preferência em posição de
protagonista. Há quem sonhe tanto e tão bem, que acabe ganhando dinheiro com
isso. Acorda anotando o que sonhou, para não perder essa memória efêmera e
facilmente dispersível. Há maneiras diversas na intensidade de fixação de
fatos. Quando lemos, vemos, ouvimos ou sonhamos, as lembranças são guardadas de
formas diferentes, podendo ser transitórias e fugidias. Alguém seria capaz de
contar um sonho de anos atrás, sem inventar? Há casos de sonhos ou pesadelos
recorrentes. No caso, a psiquiatria poderá explicar. Isso, sem até agora
mencionar o sonho erótico, bem frequente.
Houve o caso de um
pintor que pintava seus pesadelos, e com isso conseguia assombrar não a si
apenas, mas a todos que viam suas obras. A forma mirabolante com que o cérebro
adormecido consegue criar coisas faria a alegria de Hollywood, caso pudessem
ser fielmente transformados em filmes de terror. Muitos deles devem ter sido
provenientes desses casos.
A situação na qual se
pode estar em certos sonhos maus pode ser considerada tortura pesada. Os
lugares costumam estarem escuros, úmidos, ameaçadores. Há perseguidores
desconhecidos, fortes e ágeis e que estão próximos do perseguido, justo quando
a força foge e a esperança escapa. A vítima de pesadelo está perdida. Ou há
íngremes subidas de pedra molhada, em que, num grande esforço se sobe, para se
escorregar em seguida. Pode haver, e geralmente há um abismo em que se está em
queda livre. É preciso andar em estreitos espaços, com os pés de lado, sem
coragem de olhar para o despenhadeiro com monstros e cobras. Ou estar no alto
de um prédio, do lado de fora, equilibrando-se no beiral sem ter onde segurar,
e começa uma tempestade com vento, raios e trovões. Ao acordar, o alívio pode
ser substituído pela dura realidade, dando vontade de se voltar ao pesadelo.
Existe um censor dos
sonhos, um severo juiz. Quando o que foi sonhado fere os princípios íntimos de
quem sonha, este é incapaz de se lembrar do que sonhou. Os sonhos são
necessários para manter o equilíbrio mental. Quando frequentes, os pesadelos
indicam anormalidade no sono. E então, o que há para hoje à noite? Que o dia
seja bom, as ideias serenas, e que os sonhos possam ser suaves, com a presença
de uma determinada pessoa, num lugar escolhido, e se tal não ocorrer, que se
possa estar dentro do sonho desta mesma pessoa. Aí já será um sonho metafórico.
*Médica endocrinologista, jornalista
profissional, membro da Academia Feminina de Letras e do Instituto Histórico e
Geográfico, ambos de Montes Claros e autora do livro “Segurando a
Hiperatividade”
Deseje-me bons sonhos, Mara. Isso se conseguir conciliar sono - há anos não sei o que significa dormir oito horas por noite. Seu texto mais uma vez equilibra o lado clínico com o jornalístico. Muito bom.
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