sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Literário: Um blog que pensa

LINHA DO TEMPO: 7 anos, onze meses e três dias de criação.. .

Leia nesta edição:

Editorial – Rude filho sem retoques da natureza.

Coluna Contrastes e confrontos – Urariano Mota, crônica, “12 anos de escravidão e o Brasil”.

Coluna Do real ao surreal – Eduardo Oliveira Freire, crônica, “Mico e credibilidade”.

Coluna No Sopro do Minuano – Rodrigo Ramazzini, conto “O cavalo do Betinho”.

Coluna Porta Aberta – Mateus Modesto, crônica, “Minha vida perfeita”.

Coluna Porta Aberta – João Alexandre Sartorelli, poema, “Adeus lembranças primevas”.


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Livros que recomendo:

“Balbúrdia Literária” José Paulo Lanyi – Contato: jplanyi@gmail.com
“A Passagem dos Cometas”Edir Araújo – Contato: edir-araujo@hotmail.com
“Aprendizagem pelo Avesso”Quinita Ribeiro Sampaio – Contato: ponteseditores@ponteseditores.com.br
 “Cronos e Narciso” Pedro J. Bondaczuk – Contato: WWW.editorabarauna.com.br
“Lance Fatal” Pedro J. Bondaczuk - Contato: WWW.editorabarauna.com.br


Obs.: Se você for amante de Literatura, gostar de escrever, estiver à procura de um espaço para mostrar seus textos e quiser participar deste espaço, encaminhe-nos suas produções (crônicas, poemas, contos, ensaios etc.). O endereço do editor do Literário é: pedrojbk@gmail.com. Twitter: @bondaczuk. As portas sempre estarão abertas para a sua participação.


Rude filho sem retoques da natureza

Os relatos das ações de João Ramalho, rude filho sem retoques da natureza, após seus primeiros contatos com os conterrâneos portugueses, oscilam da condenação duríssima e explícita aos seus atos e modos de vida – principalmente por parte dos jesuítas, um dos quais chegou a excomungá-lo – ao posterior reconhecimento, quase unânime, da sua importância para o sucesso de colonização do Brasil, principalmente da Capitânia de São Vicente, deixando claro que, sem a sua intervenção, isso sequer seria possível. E esse seu resgate contou com a participação dos que mais o criticaram e combateram, ou seja, dos próprios sacerdotes da Companhia de Jesus.

Sobre suas atividades antes do encontro com Martim Afonso de Souza, que se deu por volta de 1532, a enciclopédia eletrônica Wikipédia assim se refere a elas, embora sem citar fontes: “Com os filhos, estabeleceu postos no litoral para fazer comércio com europeus, vendendo índios prisioneiros para serem escravizados; construindo bergantins, reabastecendo os navios em trânsito e negociando o pau-brasil”. Como se vê, João Ramalho se virou muito bem para um sujeito inexperiente e analfabeto. Demonstrou notável espírito de iniciativa, sobretudo aguçado tino para negócios. Pode-se até dizer, sem forçar a barra, que ele já promovia, á sua maneira, por própria conta, a colonização daquela área antes mesmo da chegada de Martim Afonso, tendo em vista, claro, não a prestação de serviços para a Coroa, mas a obtenção de lucros, para enriquecer, talvez visando possível retorno a Portugal. Vá se saber!

Antes que me perguntem, informo que “bergantim”, que o aventureiro construía no litoral – presume-se que essa e outras das atividades desenvolvidas por ele, citadas pela Wikipédia, eram anteriores ao seu encontro com Tibiriçá e envolvimento sexual com Bartira – era uma espécie de pequeno navio de dois mastros e com uma única e pequena cobertura. Percebe-se, pois, que não se tratava de um vagabundo qualquer, querendo viver às custas alheias. Era, à sua maneira, um sujeito ativo, dinâmico e realizador, a despeito de brutal e tirânico. Pudera! Um sujeito bonzinho, de educação refinada, não sobreviveria talvez um único dia naquele ambiente hostil, primitivo e selvagem.

Wikipédia traz à baila algumas ações sumamente cruéis – enfaticamente condenadas pelos jesuítas, que igualmente estavam furiosos com os obstáculos que aquelas pessoas impunham à conversão dos silvícolas à fé católica. Informa: “Nas excursões pelo interior, para capturar índios para serem vendidos como escravos, os filhos de João Ranalho, mamelucos com metade de sangue indígena, comportavam-se com extrema crueldade”. Provavelmente essa prole, mencionada pela enciclopédia eletrônica, era a gerada com fêmeas guaianazes, anteriores, portanto, à ligação do aventureiro com a tribo chefiada pelo cacique Tibiriçá, que habitava o Planalto.

Interessante é o relato da Wikipédia do encontro de João Ramalho com Martim Afonso de Souza. Embora não mencione as fontes em que se baseou, se presume que elas existam e sejam relatos da equipe do representante da Coroa. Acredito que sim. A enciclopédia assim descreve esse contato: “O reencontro com os portugueses foi surpreendente. Estes esperavam uma batalha contra um grande número de índios, que caminhavam em direção a São Vicente. Em vez de uma batalha, receberam João Ramalho, que passou a usar de sua grande influência sobre a tribo para ajudar seus conterrâneos”. O que levou o tirânico e lendário aventureiro a agir assim? Por que não atacou Martim Afonso e os colonos que o acompanhavam? Se o fizesse, exterminaria, com absoluta certeza, a todos com facilidade, já que contava com superioridade de forças, respaldado por milhares de guerreiros indígenas.

Provavelmente, João Ramalho não atacou o representante da Coroa e o punhado de portugueses enviados para a região com a missão de colonizá-la, por não vislumbrar nenhum risco às atividades daquele relativamente escasso contingente. É até possível que pressentisse imensas possibilidades de lucro. Tem que se levar em conta, também, a habilidade diplomática de Martim Afonso. Afinal, este veio a se tornar amigo de João Ramalho. Tanto que, quando o cacique Tibiriçá se converteu ao cristianismo, e foi batizado, adotou o nome de Martim Afonso, certamente sob influência do controvertido genro.

Não sei vocês, mas da minha parte estou curtindo muito escrever sobre esse enigmático personagem, tendo o cuidado de ser o mais didático possível, mesmo que, para isso, tenha que estender o texto muito além do inicialmente pretendido. À medida que avanço nas pesquisas, mais surpreso fico com essa figura enigmática e misteriosa – benigna, para uns, demoníaca para outros - da qual é quase impossível separar fatos do que não passa de mera lenda. Acredito que, à minha maneira, estou contribuindo, de alguma forma, para melhor entendimento de importantíssimo capítulo da nossa História que não é sequer tratado nas escolas.

Boa leitura.


O Editor

Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk.       
12 anos de escravidão e o Brasil

* Por Urariano Mota

 Mais de um crítico já observou que o filme “12 Anos de Escravidão”,  para historiadores norte-americanos, delimita um marco no conhecimento da escravidão. Falemos agora do que esse filme representa para os brasileiros. 

Na última sexta-feira, na fila do cinema aonde fui, não havia um só negro. Minto: havia só este mulato que agora escreve. Ao procurar outro na fila, recebi dos cidadãos de pele mais clara uns olhos envergonhados, que se baixavam até o chão. Tão Brasil. Tão brasileiro é o pudor educado para o que não se enfrenta. Mas o filme na tela nos pagaria. Lá, podemos ver o retrato da casa-grande: a indiferença de todos ante a tortura. Linda, a sinhá olha da varanda o negro ser torturado e nada vê, melhor, assiste ao espetáculo obsceno como uma liberalidade do senhor, o seu marido. Que aula. É um filme quase didático da infâmia, do que no Brasil está encoberto até hoje.

Para a nossa própria história, a do Nordeste do açúcar em especial, para o que não se destaca em Gilberto Freyre, para o que em Gilberto é prosa encantatória, a realidade no filme mostra um escravo na forca, pendurado por horas em uma árvore, enquanto a rotina da fazenda segue sem distúrbio, sem assaltos de horror ou de repulsa. Mas isso é tão Brasil, amigos. Hoje mesmo, aqui na minha cidade, na sua,  jovens são amarrados em postes, os velhos pelourinhos. Os novos escravos são espancados, enquanto comunicadores na televisão aprovam e ganham dinheiro e fama por açular a massa para o linchamento.  

Se houvesse uma só imagem a destacar, eu destacaria a tortura de uma escrava sob o chicote. Por um lado, lembrei o comportamento da sobrevivência sob os torturadores na ditadura brasileira.  Por outro, se fosse desenvolvida ao nível do real, do histórico, a cena daria vômitos pela agonia da dor, apesar de apenas representada. Porque a realidade é ainda mais cruel que o mostrado na tela. E os corações mais delicados, e hipócritas por extensão, se recusam a ver que os negros escravos no Brasil eram passados em moendas de cana, que expulsavam suas vísceras como bagaço. Outros, após o chicote, condenados à morte tinham as feridas abertas lambidos por bois. E aqui não preciso falar o quanto é áspera, cruel e ferina a língua de um boi. Poupemos o domingo. Mas de passagem menciono que  negros eram ferrados no corpo como os quadrúpedes da fazenda. Eles não tinham a marca do dono por uma medalhinha, como aparece no escravo Salomon no filme.

É estranho, é sintomático da crueldade brasileira, que os melhores relatos sobre a nossa escravidão (nossa aí em mais de um sentido, de falta de espírito liberto e de herança cultural) venham de estrangeiros, como os descritos em Charles Darwin e Vauthier, o engenheiro francês que viveu no Recife.

De Vauthier cito: “Madame Sarmento nos contou que como sua negrinha lhe tinha roubado seis vinténs, ela amarrou-lhe as mãos e deu-lhe umas boas chicotadas!!! Levantando- lhe a roupa!!! Sem nenhum constrangimento!!! Diante dos filhos!!! O mais velho deles observou que o posterior da negrinha não era mais bonito do que o de um cavalo, quando levanta a cauda. Qualquer pessoa poderia chegar a praticar coisas semelhantes num momento de excitação e envergonhar-se delas depois, mas contá-las... Que mulher! Que alma!... Hoje o cadáver de um negro ficou boiando na praia, debaixo das nossas janelas, levado e trazido pelas oscilações das marés. Mil pessoas passaram, viam-no, pararam um instante antes de seguirem caminho muito filosoficamente. Aprecio pouco as ideias geralmente admitidas sobre cadáveres que tendem em alguns casos a conceder mais cuidados aos despojos sem alma do que ao ser quando está vivo – mas este descaso, essa indiferença geral perante a morte – é verdade que era um negro! Um negro vivo já é pouca coisa: o que será então um negro morto? Essa incúria generalizada com as exalações que emanam de um cadáver, tudo isso caracteriza de modo bem saliente esta barbárie, engastada na selvageria e mal maquilada em civilização”. 

Saímos do cinema com uma frase do personagem na memória:  “Eu sou a prova de que não existe justiça na terra”. Brancos, negros e mestiços de todas as cores bem compreendemos. Enquanto os miseráveis continuarem a ser presuntos, presidiários, enquanto não for vista a pele mais negra no topo da sociedade, em um papel que não seja o de capitão-do-mato, como Joaquim Barbosa, não existe justiça no Brasil. Mas podíamos começar pela conhecimento real da nossa história.

É necessário que esse filme se prolongue em artigos e discussões entre os brasileiros. Ele é o vislumbre do que temos sepultado. Vejam o filme e releiam a história escura, oculta da escravidão. O filme é melhor do que os livros de sociologia escritos no Brasil até hoje.    

* Escritor, jornalista, colaborador do Observatório da Imprensa, membro da redação de La Insignia, na Espanha. Publicou o romance “Os Corações Futuristas”, cuja paisagem é a ditadura Médici e “Soledad no Recife”.  Tem inédito “O Caso Dom Vital”, uma sátira ao ensino em colégios brasileiros.

Mico e credibilidade

* Por Eduardo Oliveira Freire

Nos tempos de escola, fui a uma exposição da artista CAMILLE CLAUDEL 1864-1943. Interessei-me muito pela história dela, foi muito atribulada e angustiante. Foi uma mulher a frente de seu tempo e que sofreu muito com isso. Aliás, os diferentes sempre são mal vistas pelas pessoas medianas.

Então quis fazer um vídeo com algumas obras suas. Pesquisei na internet. Depois de pronto, postei no youtube. Ainda bem, que tenho uma amiga entendedora da vida e obra da artista que me corrigiu, dizendo que algumas imagens não eram de Camille. Paguei o maior mico.

" Rodin fazia obras grandes, imensas às vezes. As de Camille são, em sua maioria, pequenas, delicadas, mesmo que trágicas ou "feias" como Rodin fazia obras grandes, imensas às vezes. As de Camille são, em sua maioria, pequenas, delicadas, mesmo que trágicas ou "feias" como Clotho. Há um feminino presente em suas obras enquanto as de Rodin são masculinas - encomendadas, públicas, externas etc..." ( minha amiga)

Realmente, pesquisar na internet é complicado. Há muitas informações equivocadas, as quais se transformam em toneladas de lixo virtual. É importante filtrar os dados.

Acredito que nem seja com intuito de prejudicar, mas, a falta de senso fazem as pessoas publicarem o que quiser nos sites, blogs e vlogs. Tudo bem que possa não existir a responsabilidade jornalística, entretanto, como cidadãos, necessitamos refletir mais o que escrevemos e dissemos.

Refiz várias vezes o vídeo. Talvez não fique legal; pelo menos, tentei.

* Formado em Ciências Sociais, especialização em Jornalismo cultural e aspirante a escritor - http://cronicas-ideias.blogspot.com.br/


O cavalo do Betinho

* Por Rodrigo Ramazzini

Betinho encasquetou que iria comprar um cavalo. Reuniu a família para anunciar a decisão de adquirir o equino. “Meu sonho do momento!”, assim se referiu à aquisição. Segundo contou, já estava inclusive com o negócio engatilhado, com um vivente lá das bandas da casa do seu primo. “Ótimo preço e preto, como eu quero!”, narrou. Os filhos ficaram entusiasmados e saíram projetando possíveis nomes para batizar o animal. A esposa, ao contrário, ficou uma fera.
- Pra que, Betinho?
- Por que eu quero! Simples...
- O que tu vais fazer com um cavalo, homem de Deus?
- Cavalgar!
- Mais um gasto? Mais uma boca para comer?
- Cavalo come grama...

E saiu sem dar maiores explicações. Voltou quando já estavam todos dormindo. No dia seguinte, acordou cedo.
- O que está fazendo aí, Betinho?
- Projetando...
- Projetando o quê?
- Uma cocheira para o cavalo, mulher!
- Eu não acredito! Nos fundos do pátio?
- Sim! Dá bem certinho no tamanho esse espaço aqui! Acho que o Mário faz pra mim... Vou lá falar com ele...
- Betinho! Espera aí... Volta aqui que eu quero falar contigo sobre isso...

Deixou a esposa falando sozinha. Retornou vinte minutos depois.
- Tudo certo! Ele vai fazer a cocheira pra mim... Começa semana que vem...
- Tu vais mesmo levar adiante essa ideia de comprar o cavalo?
- Claro! Por quê?
- Eu acho um absurdo isso! Um cavalo vai ser só para incomodar, Betinho! Já pensaste nisso?
- Eu que vou cuidar!
- Fora o fedor que vai levantar!
- A gente lava...
- Eu acho que nem pode criar cavalo dentro de pátio...
- Pode! Já me informei...
- Pra que um cavalo? Sabes que eu não gosto de bicho grande!
- Por que tu na gostas eu não posso gostar?     

A esposa já estava ficando impaciente por não conseguir reverter Betinho da decisão de comprar o cavalo. Dois dias se passaram e a compra do equino era o assunto na família. Betinho ligava, gesticulava e negociava ao telefone. Foi então que deu a notícia fatídica.
- Negócio fechado! Busco o animal amanhã!
- Eu não acredito! Quanto tu vais pagar neste bicho?

Era a pergunta que Betinho ansiosamente esperava que a esposa fizesse, pois imaginava a sua reação ao saber o valor.
- Vou pagar parcelado. Vinte e quatro parcelas de R$ 120... Uma barbada!
- Que absurdo, meu Deus! Tu vais gastar esse dinheiro todo em um cavalo podendo comprar outras coisas para casa, Betinho?
- Vou... Eu quero!
- Vou te avisar uma coisa: se tu apareceres aqui em casa com esse cavalo, quem vai sair sou eu... Ouviste bem?

Betinho não respondeu. Não se falaram o resto do dia. Deitaram-se um ao lado do outro à noite sem trocar uma palavra se quer. A bem da verdade, Betinho não queria comprar o tal cavalo e estava apenas intermediando uma negociação entre dois amigos. Por isso, sabia detalhes da negociata. Ele queria mesmo era adquirir uma televisão nova, com uma tela maior, mas cogitou que a esposa negaria a solicitação, sendo que possivelmente indicaria outras necessidades da casa, como sempre fazia. Assim, “armou o circo” e aproveitou a oportunidade, criando a estratégia de “chantageá-la”, já que não poderia comprar o cavalo iria então comprar uma TV. Faria isso na manhã seguinte. Foi dormir tranquilo, afinal, o plano estava caminhando perfeitamente.

Acordou no outro dia entusiasmado pela perspectiva da possível compra da televisão. Entusiasmo que logo foi dissipado ao notar que a esposa não estava na cama. O alerta de desconfiança foi acionado. “O que será que essa mulher está fazendo?”, pensou. Ouviu barulho na sala. Os filhos ainda dormiam. Saiu do quarto pé por pé e se surpreendeu ao encontrá-la:
- O que é isso, mulher?
- Ué! O que isso, Betinho? O que tu estás vendo...  
- Comprou?
- Comprei, ora... O tempo que tu ias gastar dinheiro com um cavalo é melhor investir na casa... Aliás, pode desmanchando o negócio... O carnê para pagar está no teu nome... Fiz em vinte e quatro prestações...

Betinho contemplou televisão nova. Deslumbrou-se. “Sorriu por dentro”. Era exatamente como queria: marca, modelo, polegadas, tudo. Porém, não podia ceder.
- Com que cara eu fico agora com dono do cavalo, hein? Dei minha palavra...
- Problema teu...

Betinho fez cara de brabo e saiu para a rua. Fingiu que ligou para o proprietário do animal com o suposto objetivo de reaver o negócio e retornou rapidamente. Afinal, estava ansioso para ler o manual da nova televisão e mexer no controle remoto..


* Jornalista e contista gaúcho. 
Minha vida perfeita

* Por Mateus Modesto


Quando dei por mim, uma lágrima corria pela minha face. Enxuguei-a. Eu choro sem perceber às vezes. As lágrimas saltam dos meus olhos. Não é de tristeza. Nem de alegria. Acredito que elas saiam por sair.

Outra lágrima escorreu pelo meu rosto. Pensava em minha filha. Morena, sorridente, indefesa. Um doce. Eu a chamo de “minha pequena”. Ela corre rindo, gritando de susto quando eu imito um cachorro feroz. Ela tem um sorriso tão gostoso. Eu agradeço a Deus por ela. Mas... confesso, ela ainda não nasceu. São pensamentos meus de quando ela estiver com cinco anos. Nós brincando na varanda da casa, assando milho, construindo castelos de areia na praia.

Eu sou um marido coruja. Admito. Faço todos os desejos de minha esposa. Se ela quer comer caju com graviola batido com ovos, eu faço. Se for tangerina com açaí eu preparo. Se for acarajé com camarão e pimenta do reino, eu providencio. Outro dia ela pediu banana amassada com feijão e suco de melancia. Eu quase ri na frente dela. Mas dei as costas. Ver minha esposa grávida me completa. Somos uma família. Uma linda família. Lágrimas rolam pelo meu rosto. Eu sinto tanto, mas ela não está grávida.

Hoje o dia está tranqüilo. Sem sol, apenas nuvens. Um frio agradável. Vejo-me abraçando minha esposa, beijando seu ombro direito, apertando-a e dizendo que o melhor momento do dia é quando a vejo. Engraçado... nós trabalhamos juntos. Meus olhos estão lacrimejantes. Lágrimas descem pelo meu rosto. Eu penso em fazer uma viagem no final de ano com minha esposa. Para um lugar lindo, um verdadeiro paraíso. Gastar sem medo, comer em bons restaurantes. Eu planejo isso, mas eu não tenho esposa.

Todos os dias, o dia todo eu penso no meu futuro. Converso com minha namorada sobre o que eu quero ser. Uma bela casa, bom emprego, bons filhos. Muitos filhos. Minha namorada diz que eu caminho no futuro e nem vivo o presente. Não é bem assim. O amanhã depende do hoje. Porém, sem objetivar o amanhã, vivemos qualquer hoje. Ela ri, mas não concorda.

Quando me dei conta, eu estava aos prantos. Honestamente, não tenho namorada. Sou solteiro. Mas minha vida é perfeita. Ou vai ser.

* Jornalista



Adeus lembranças primevas

* Por João Alexandre Sartorelli

Adeus trem de Itapira,
Estação da Luz,
Meu avô me levando
De pijama,
A cancela do sítio
E as vacas pressentidas.

* Analista de Sistemas por profissão e poeta por vocação


quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Literário: Um blog que pensa

LINHA DO TEMPO: 7 anos, onze meses e dois dias de existência.

Leia nesta edição:

Editorial – Haja imaginação!.

Coluna Ladeira da Memória – Pedro J. Bondaczuk, crônica,“Responsabilidade desnecessária”.

Coluna Contradições e paradoxos – Marcelo Sguassábia, crônica, “Enfim, fora da caixa”.

Coluna Do fantástico ao trivial – Gustavo do Carmo, conto, “O puxador sem voz?”.

Coluna Porta Aberta – Carmo Vasconcelos, poema, “Dualidade”.

Coluna Porta Aberta – Marta Barcellos, crônica “Para viver de Leiteratura”.

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Livros que recomendo:

“Balbúrdia Literária”José Paulo Lanyi – Contato: jplanyi@gmail.com
“A Passagem dos Cometas”Edir Araújo – Contato: edir-araujo@hotmail.com
“Aprendizagem pelo Avesso”Quinita Ribeiro Sampaio – Contato: ponteseditores@ponteseditores.com.br
 “Cronos e Narciso”Pedro J. Bondaczuk – Contato: WWW.editorabarauna.com.br
“Lance Fatal”Pedro J. Bondaczuk - Contato: WWW.editorabarauna.com.br


Obs.: Se você for amante de Literatura, gostar de escrever, estiver à procura de um espaço para mostrar seus textos e quiser participar deste espaço, encaminhe-nos suas produções (crônicas, poemas, contos, ensaios etc.). O endereço do editor do Literário é: pedrojbk@gmail.com. Twitter: @bondaczuk. As portas sempre estarão abertas para a sua participação.


Haja imaginação!

A aparência física de João Ramalho é – entre tantas coisas que cercam a vida e as ações dessa figura lendária da História do Brasil – um dos aspectos que mais espicaçam minha curiosidade, embora não haja a mais remota chance dela vir a ser saciada. Como era esse mítico aventureiro? Era louro ou moreno, alto ou baixo, gordo ou magro, de olhos azuis ou de outra cor? Ninguém sabe. Só souberam desses detalhes os que conviveram com ele, porém...  Afinal, a fotografia só foi inventada quase quatrocentos anos depois que ele morreu e não consta que algum eventual pintor tenha registrado seus traços numa tela.

Vi várias gravuras mostrando como seria seu aspecto, mas tenho absoluta certeza que são, todas elas, meros frutos da imaginação de quem as produziu. Disso não tenho a mais remota dúvida. Como tantos que as imaginaram, posso, também, imaginar como ele era nas várias fases da sua vida: moço, maduro e velho. Raimundo de Menezes, no livro “Aconteceu no velho São Paulo” (Coleção Saraiva, 1964), relata como o “imaginou” (afinal, não foi contemporâneo do aventureiro e, portanto, não tem como saber como ele era): “João Ramalho foi uma autêntica figura de novela. Deixara crescer a barba descuidada. Vivendo no mato, no meio da indiada, pouco ligava à indumentária. Era truculento, despótico, dominado pelos modos desabridos. Em conseqüência, não havia quem não o temesse”.

A primeira parte dessa descrição não me diz nada. Posso imaginar um perfil igual a esse ou outro totalmente diferente, mas nenhum deles, provavelmente, será o real ou aproximado dele. Menezes não revelou, por exemplo, em seu relato, sequer o óbvio quando se quer descrever alguém: a cor de seus cabelos e de seus olhos, a altura, o peso (estimado) e coisas triviais do tipo, sem as quais não é possível sequer imaginar como era quem quer que seja. Quanto à segunda parte do seu relato, a que se refere ao seu temperamento, esta é mais verossímil. Pelo menos, os dados que mencionou conferem com os mencionados por jesuítas – principalmente José de Anchieta e Manuel da Nóbrega – em sua correspondência. De acordo com esses sacerdotes, João Ramalho era, mesmo, um sujeito truculento, despótico e de modos desabridos. Pudera! O que esperar de um analfabeto, inculto,  mal educado,vivendo por tantos e tantos anos nas selvas, afastado da civilização, no meio de índios, tendo de assumir suas maneiras de ser e de agir?

Sabe-se – já que ele próprio teria relatado isso aos jesuítas – que após o naufrágio, o aventureiro português foi resgatado pela tribo dos Guaianazes. Seu encontro com o cacique Tibiriçá e posterior relacionamento com Bartira não se deu, portanto, nessa ocasião. Raimundo de Menezes narra como isso aconteceu (provavelmente, supôs que foi assim, já que não menciona fontes da época): “Um dia, andejando sempre, galgou a (serra de) Paranapiacaba e vei bater nas margens de Guapituba, onde conheceu o cacique Tibiriçá, com quem fez boa amizade. O aventureiro apreciou o lugar. Resolveu ficar. Aquilo por ali estava cheio de ‘índias passivas e ofertantes que, andavam nuas e não sabiam se negar a ninguém’. Uma, porém, no meio de tantas, mexeu-lhe com o coração. Chamava-se Bartira. Além de bonita, sendo filha do cacique Tibiriçá, era um bom partido. João Ramalho não vacilou. Abandonou as demais e ficou com ela. Tornou-a predileta. O chefe da tribo gostou.Ter um branco como genro era uma incomensurável honraria para a família”.

As coisas ocorreram, mesmo, dessa forma? Como saber? Resta-me acreditar, pois Raimundo de Menezes deve ter se baseado em algum dado concreto, documento ou sabe-se lá o quê, para chegar a essa conclusão. Mas há uma série de indagações, que jamais serão respondidas, a espicaçar o pesquisador histórico. Por exemplo, João Ramalho, quando o navio em que viajava naufragou na costa de São Vicente, desconhecia, óbvio, o idioma dos indígenas que o socorreram. Como ele fez para se comunicar? E o que foi feito dos seus companheiros de viagem? Foram também resgatados? Morreram afogados? Foram mortos pelos índios, que eram antropófagos, como José de Anchieta relatou em suas cartas e devorados por eles? Em caso afirmativo, por que os indígenas pouparam João Ramalho? E mais, por que lhe ofertaram as filhas, para que este mantivesse relações sexuais com elas?

E após subir a serra e conhecer a tribo chefiada por Tibiriçá, há dezenas e dezenas de outras questões no ar. Os comandados desse cacique, por exemplo, falavam a mesma língua dos Guianazes do litoral? Eram aliados destes? Se eram, João Ramalho se valeu de alguma recomendação do chefe da tribo que o resgatou do naufrágio a Tibiriçá?  Como se vê, são perguntas, perguntas e mais perguntas sobre esse misterioso personagem, mais para lendário do que para real, que o tornam ainda mais fascinante e misterioso. O que se sabe a seu respeito data a partir de 1532, quando do seu contato com Martim Afonso de Souza e quando se relacionou com jesuítas – relacionamento inicialmente conflituoso e, posteriormente, benéfico para as duas partes – eventos dos quais há fartos registros escritos. Antes... Haja imaginação!

Boa leitura.


O Editor.

Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk     
Responsabilidade desnecessária

* Por Pedro J. Bondaczuk

Os conselhos, quando dão certo e as pessoas que os pediram fazem tudo direitinho, conforme lhes foi aconselhado, beneficiam, apenas, os que os recebem. O aconselhador, por sua vez, corre todos riscos imagináveis, sem que leve qualquer vantagem nisso. Há quem tenha a mania de aconselhar a torto e a direito, a todo o mundo, conhecidos ou desconhecidos, sem serem sequer solicitados. Tornam-se chatos, pedantes, dogmáticos e quem pode os evita.

Claro que podem estar bem intencionados (geralmente estão), não há porque se duvidar. Mas de indivíduos com boas intenções “o inferno está lotadinho”, como bem diz o povão, em sua espontânea, posto que rude, sabedoria.

Há quem diga que se conselho fosse bom, as pessoas os venderiam, não dariam de graça. Não é bem assim. Há momentos na vida em que carecemos de uma pessoa sensata, experiente, ponderada e que nos queira bem, que nos oriente em relação a determinados problemas. Como em qualquer jogo, via de regra, quem está de fora enxerga melhor. Detecta onde estão as dificuldades e se dispõe a apontar os caminhos mais adequados para sairmos de algumas enrascadas. Isto, claro, se elas tiverem saída. Às vezes não têm.

Mesmo nessas circunstâncias, porém – e supondo que quem aconselha esteja plenamente habilitado a aconselhar – o aconselhador (ou conselheiro, como queiram) sempre corre riscos. Por exemplo, quem lhe pediu orientação pode não seguir rigorosamente o que foi aconselhado a fazer e se dar mal. Ou seja, pode complicar ainda mais determinada situação já complicada. O que você acha que ele fará? Assumirá o erro e arcará com as conseqüências? Raramente.

A probabilidade maior é que lance toda a culpa do fracasso naquele que, prestamente, se dispôs a acudi-lo em suas dificuldades. Pode, inclusive, não apenas hostilizar o nobre conselheiro, como fazer algo muito pior, dependendo da sua índole.

E se o conselho der certo? Manifestará gratidão e se tornará mais íntimo de quem o aconselhou? Dificilmente. A experiência indica que assumirá todos os méritos por haver saído da enrascada que o afligia e, provavelmente, esfriará suas relações com quem o aconselhou, se não rompê-la de vez, o que é mais comum.

Que vantagem, pois, nós temos em aconselhar alguém, mesmo que se trate da esposa, do filho, do neto, do amigo ou de outra pessoa qualquer que prive da nossa irrestrita confiança e, sobretudo, intimidade? Nenhuma! Rigorosamente nenhuma!

Talvez (e nem sempre) lhe reste a satisfação íntima de haver feito uma boa ação para alguém. Na maioria dos casos, nem isso lhe sobra. Vale a pena, pois, correr tantos riscos por recompensa tão pífia (e quando ela existe)? Sinceramente, entendo que não!

Claro que não sou a pessoa mais habilitada a tratar dessa questão. Já recebi muitos conselhos (alguns excelentes, outros nem tanto), solicitados ou dados de graça e, em contrapartida, aconselhei muita gente.

Não hostilizei, porém, e nem rompi relações com nenhum dos meus conselheiros, embora muitos o merecessem. Algumas dessas pseudo-orientações (nunca pedidas, por sinal) foram tão ostensivamente ruins, que as levei na pura brincadeira. Mas também não me lancei aos pés dos que me aconselharam bem e nem lhes jurei devotar eterna gratidão.

Quanto aos conselhos que dei? Bem, arrependo-me profundamente de haver agido assim, principalmente quando as coisas deram certo. Perdi amigos, que considerava como irmãos, apenas por lhes haver apontado caminhos óbvios, que os levaram ao sucesso em muitas das suas empreitadas. Bem feito! O que eu tinha que me meter na vida alheia.

Hoje, busco sozinho as saídas para as minhas dificuldades, valendo-me da experiência que os meus já muitos anos de vida me deram. Às vezes, complico, é verdade, situações muito simples, mas arco com as conseqüências. Na maioria das vezes, porém, tenho acertado (ou quase, sei lá).

Concordo plenamente com o que Albert Einstein escreveu em um de seus textos a esse propósito: “Não me agrada aconselhar porque, em todos os casos, se trata de uma responsabilidade desnecessária”. E não é?! Pra quê procurar chifre em cabeça de cavalo ou arrumar sarna pra me coçar?! Sim, pra quê?!!!



* Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance Fatal” (contos) e “Cronos & Narciso” (crônicas). Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk 



Enfim, fora da caixa

* Por Marcelo Sguassábia

Pessoal da Criação,

Primeiramente, em nome da Diretoria, nossos parabéns a todos os envolvidos pela conquista da nova conta.

Estamos livres para propostas inusitadas, totalmente "fora da caixa", desde que estejamos atentos a uns poucos porém determinantes "polices", que nos chegaram hoje via email.
- Não podemos criar frases iniciadas com "NÃO", ainda que esta mesma já desobedeça à regra.
- Um dos chefes de engenharia de produto tem avô mulato, e consta que a agência anterior apresentou um anúncio com fundo escuro, considerada por ele uma peça subliminarmente criada com o intuito de depreciar a raça negra, de maneira geral, e a sua própria família em particular.
- Nada na cor azul deve aparecer, nem em mídia impressa, nem nas peças de mídia eletrônica, pois azul é a cor predominante do principal concorrente. Essa regra vale para todo e qualquer elemento - do céu nas externas dos filmes aos mínimos objetos de cenografia.
- Nada na cor verde deve aparecer, nem em mídia impressa, nem nas peças de mídia eletrônica, pois verde é a cor predominante do segundo maior concorrente.
- Nada na cor vermelha deve aparecer, nem em mídia impressa, nem nas peças de mídia eletrônica, pois vermelha é a cor predominante do terceiro maior concorrente.
- Layouts no estilo clean, contudo, também precisam ser evitados. O gerente comercial da linha de termocondutores bifásicos considera espaço em branco um desperdício de dinheiro, e que cada centímetro de anúncio deve ser aproveitado com conteúdo sobre o produto, os pontos de assistência técnica ou os valores e a missão da empresa - necessariamente nessa ordem de prioridade.
- Fontes com serifa, nem pensar. Sem serifa, pior ainda. Não existe uma tipologia a ser seguida, portanto podemos ficar à vontade para sugerir a que acharmos melhor para cada circunstância. Desde que respeitando o supra citado - nem serifas, nem falta delas nas letras.
- A cada 20 palavras de texto, no mínimo 5 serão citações do nome do cliente e/ou de suas marcas.
- Os produtos cuja comunicação estarão agora sob nossa responsabilidade em nada se assemelham a chocolates, cervejas, brinquedos, sandálias e outros comprados por impulso. Seus consumidores são racionais e avaliam unicamente custo-benefício. Assim, toda e qualquer comunicação deve obedecer o seguinte modelo de apresentação: nome do produto/função/tabela de aplicações/benefícios/endereço/telefone/site.
- As observações acima integram o primeiro dos cinco anexos recebidos. As obrigatoriedades dos outros quatro serão enviados em seguida.

* Marcelo Sguassábia é redator publicitário. Blogs: WWW.consoantesreticentes.blogspot.com (Crônicas e Contos) e WWW.letraeme.blogspot.com (portfólio).


O puxador sem voz

* Por Gustavo do Carmo

Sambódromo lotado. Arquibancada e todos os componentes da escola cantando o samba-enredo. Os destaques começam a rebolar nos queijos a 10 metros de altura. A madrinha de bateria, de topless, também já samba e faz reverência aos ritmistas, disciplinados pelo Mestre Turcão. E o intérprete Ari do Pandeiro, cujo verdadeiro nome é Aristênio Soares,  faz o seu gargarejo antes de dar o seu grito de guerra.

Ele cospe o preparado de própolis e gengibre num balde. Estava meio gripado nos últimos dias. Mas achava que poderia puxar o samba sem problemas. Conseguiu dar o grito de guerra: SAI DA FRENTE QUE A UNIDOS DA DEMOCRÁTICOS TÁ CHEGANDO!!!! SORRIIIIIIIIIIIA PANDEIRO!!!!!!

Foram as últimas palavras que Ari conseguiu soltar. Depois delas ficou sem voz. O cavaquinho continuou tocando, mas o samba não entrava. O presidente da escola se desesperou. Ari, tenso, falava com o fiapo de voz que lhe restava:
— Eu não estou conseguindo nem falar.  

Enfim, o grupo de puxadores auxiliares assumiu o samba, que foi levado até o fim em coral. A Unidos da Democráticos foi aplaudida ao fim do desfile. Na quarta-feira de cinzas, descobriu que perdeu pontos em harmonia, evolução, samba-enredo e conjunto. Ficou em sexto lugar. Voltou ao desfile das campeãs. A voz de Ari ainda não tinha voltado. A escola foi mais uma vez aplaudida.

Aristênio Soares ficou mudo de vez. Mesmo não precisando mais dele e efetivando o coral de intérpretes, Ari do Pandeiro foi mantido para ser um talismã. Foi demitido porque nem pra isso ele serviu. A Unidos da Democráticos foi rebaixada no carnaval seguinte.

* Jornalista e publicitário de formação e escritor de coração. Publicou o romance “Notícias que Marcam” pela Giz Editorial (de São Paulo-SP) e a coletânea “Indecisos - Entre outros contos” pela Editora Multifoco/Selo Redondezas - RJ. Seu  blog, “Tudo cultural” - www.tudocultural.blogspot.com é bastante freqüentado por leitores



Dualidade

* Por Carmo Vasconcelos

Fui deusa da caça
feiticeira de Oz
caçadora e presa
vítima e algoz

Fui verbo-incerteza
em almas pagãs
sacerdotisa de mentes irmãs

Fui louca e devassa
em noites de amor
filha de Afrodite…

E em dias de Graça
asa de condor
no céu sem limite

Fui fogo e surpresa
na cama e na mesa
crédula e perjura

Fui perto e lonjura
amada e esquecida
traidora e traída

Fui calor e beijo
volúpia e desejo
carne de festim

Fui verso e fui luz
a voz de Jesus
falando por mim

Fui nada e fui tudo
choro, riso, Entrudo
princípio e fim

E hoje, em meus anos,
sou ré e juíza
de meus próprios atos

E de meus senãos
sábios ou insanos
lavo as minhas mãos
tal como Pilatos!


 * Poetisa portuguesa