Paranoiando
* Por
Cecília Prada
A Internet e seus
blogueiros me atordoam. Quero fechá-la, quero "nunca-mais", quero não
conhecer mais meninos geniais - fechada eu em "egocentrismos
ultrapassados"? Em longos projetos que desfraldam suas asas de grande
envergadura e persistem/resistem teimosos, cabeleira exposta ao vento, dentro
de mim?
Pois vínhamos todos,
ainda em tempos pré-cibernéticos, com memórias épicas, risos grandiloquentes,
grandes histórias contadas recortadas recontadas, entrelinhas destrambelhadas
no nosso subtexto? - Com Vieiras e Camões, Castro Alves e James Joyces, e
Tolstois, Flauberts e Dostoievskis, Shakespeares e Sófocles até (demasiados,
demasiados...) dentro de nós?
É a esse patrimônio que
nos agarramos ciumentos, nós, largados agora no pedregoso cimo do rochedo em
meio ao oceano - onde as ondas ululantes da Virginia Woolf, os ventos
encapelados de Emily Brönte, persistem ainda (ó benção da perversão literária!)
em vir nos buscar?
É uma imensa indigestão
literária? É o fim do mundo? (Ou seu começo apenas? Temo...)
Gostaria de ter tempo
para ter tempo. Tempo de pensar, de entender, de escolher. (Como já dizia
Vieira: "Peço desculpas por ter sido tão longo, por não ter tempo de ser
breve").
O parêntese, a citação,
serão os únicos recursos de que dispomos para resistir ao furacão que ameaça
nos varrer tão pronto? Por único abrigo temos, se tanto, um guarda-chuva preto
e rasgado que nos legaram - quem? quem? ora quem, esse aí ó, o covarde que nos
jogou sem mais no meio deste oceano, no alto do rochedo descarnado,
desamparados e enrolados nos nossos fios existenciais, envoltos em nossa
(inútil) papelada, nós, nós... nós QUEM MESMO?
* Escritora e jornalista, estreou na década de 50 no jornal A Gazeta de São Paulo. Como
jornalista trabalhou em vários jornais e revistas de São Paulo e Rio de
Janeiro, e em 1980 ganhou o Prêmio Esso de Reportagem pela Folha de São Paulo.
É detentora de quatro prêmios literários e tem cinco livros de contos
publicados, dentre os quais: O caos na
sala de jantar, Estudos de interiores para uma arquitetura da solidão e Faróis estrábicos na noite, além de
vários livros sobre jornalismo. Seus contos e artigos figuram em revistas
estrangeiras e em antologias brasileiras e do exterior. Foi diplomata de
carreira (turma de 1957) do Instituto Rio Branco, do Ministério das Relações
Exteriores. Atualmente reside em Campinas (SP), onde termina um romance
autobiográfico.
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