A carta de despedida
* Por
Vitor Orlando Gagliardo
Após 50 anos de uma
carreira política marcada pela corrupção e abuso de poder, chegava ao fim a
vida do senador “Sou ladrão mesmo, e daí?”. Após todos os rituais fúnebres,
comoção pública e uma enxurrada de homenagens na mídia, era chegado o momento
da abertura do testamento.
O advogado da família,
o “Dr. Eu suborno o júri”, reuniu a esposa “Amélia que era mulher de verdade” e
os dois filhos do casal: o publicitário “Me paga que eu minto” e o empreiteiro “Palace
II”.
Com a voz embargada e
os olhos cheios de lágrimas, o advogado começou seu discurso.
- ‘O senador “Sou
ladrão mesmo, e daí?” era um grande político, homem, pai de família e um
verdadeiro amigo – nesse instante o advogado começa a chorar. – Ele não fez
necessariamente um testamento, mas uma carta de despedida. Vou lê-la nesse
instante.
Querida
família,
em
meus muitos anos de vida, deixei muitos inimigos e tenho medo que de alguma
forma, eles possam prejudicá-los. Pensando nisso, preparei esta carta com
algumas instruções:
1
– Caso necessitem de dinheiro, procurem o banqueiro “Juros 80%”. Ele me deve
muitos favores.
2
– Tenho muitos laranjas e empresas frias para justificar nossas 250 mil cabeças
de gado. Portanto, não se preocupem com o imposto de renda.
3
– Procurem o senhor “Fazemos qualquer negócio”, proprietário do BPL, Banco dos
Políticos Ladrões. Ele vai ajudá-los com a movimentação do dinheiro.
4
– Deixei dossiês completos contra inúmeros políticos. A senha do cofre é ‘quem
não chora não mama’.
5
– A PF está desconfiada que subfaturei obras públicas em minha gestão como
governador. Eles estão certos. Como vocês acham que comprei nossa mansão em
Miami? Enfim, procure o “Dr. Quebra galhos”. Com algumas notas de cem ele
resolverá esse problema.
6
– “Amélia que era mulher de verdade” saiba que sempre a amei, mas preciso lhe
fazer uma revelação: tenho seis filhos fora do casamento. A pensão é paga pela
empreiteira “Não compre que vai cair”.
7
– Para meus filhos ensino: ingressem no mundo da política e espero que coloquem
em prática todos os meus ensinamentos. Jamais se esqueçam: nunca digam a
verdade para o povo. Fale aquilo que eles querem ouvir e prometa o que jamais
cumprirá.
8
– Peço desculpas por todas as dores que causei. Menti, roubei, manipulei e até
matei, sempre pensando no bem-estar da minha família. Espero que possam me
perdoar, pois não me arrependo.
9
– Não esqueçam de cobrar meu troco de R$ 7,32 da farmácia “Remédio de pó de
farinha”.
10
– Esse documento precisa ser destruído após sua primeira e única leitura.
Inutilia truncat
(1)
(1) Acabe com as inutilidades.
*Jornalista
- govitor@yahoo.com.br
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