A moto de Zé Dirceu, o “Caso Siemens” e o discreto
charme da hipocrisia
* Por Raul Longo
Freud demonstrou que
mesmo inconscientemente somos todos hipócritas. Cada um esconde a realidade de
si próprio e isto chega a ser saudável, pois não suportaríamos a verdade de nós
mesmos. Não saberíamos lidar com os segredos de nosso subconsciente. No entanto,
o indivíduo incapaz de distinguir o que é real do que é delírio é caso de
distúrbio mental, doença.
Doença que prejudica a
terceiros quando o mentiroso é um hipócrita consciente, intencional e movido
por interesses escusos ou confessos. Nesse caso, a hipocrisia é um distúrbio de
caráter que pode provocar disfunção mental e o desvio de personalidade em quem
nela acredita. Esses desenvolvem dependência viciosa no irreal e
impossibilidade de compreensão dos fatos.
A vítima da hipocrisia
chega a cometer atos insanos, drásticos ou depressivos. Há casos de
automutilação e até de morte, como ocorreu à enfermeira que se medicou contra
inexistente epidemia de febre amarela.
Outro psicanalista
alemão, Erick Fromm, demonstrou que distúrbios provenientes da sistematização
da hipocrisia podem se tornar pandêmicos, envolvendo toda uma sociedade e até a
humanidade em geral. Um exemplo clássico ocorreu na própria Alemanha quando a
sistematização da hipocrisia por um grupo político promoveu distúrbio mental em
toda a sociedade que passivamente permitiu o extermínio de milhões de pessoas.
Talvez pela lamentável
experiência com esse tipo de procedimento é que outra instituição germânica, a
Siemens Aktiengeselischaft, (Siemens AG), o maior conglomerado de engenharia da
Europa, resolveu denunciar o processo de corrupção de sua diretoria no Brasil,
envolvendo três sucessivos governadores de São Paulo: Mário Covas, Geraldo
Alckmin e José Serra, todos do PSDB. (vide aqui)
Apesar de a importância
superar centenas de milhões do que se supõe ter sido operado pelo que foi
chamado por um dos mais afamados corruptos do Brasil como o “maior esquema de
corrupção da história política do país”, a existência do esquema de desvio de
verbas públicas denunciado pela Siemens não é novidade. Em 2008, um ano
depois da morte de Antonio Carlos Magalhães, já havia o que se tornou
mundialmente conhecido como “Escândalo do Caso Alstom”.
O caso, envolvendo os
mesmos políticos do PSDB e os fornecedores das obras do Metrô da capital de São
Paulo em milionários desvios de verbas públicas entre os anos 1997 e 2001,
chocou a imprensa internacional. (vide aqui)
Mas, então envolvida na
indução de preconceitos ao governo e à pessoa do Presidente Luís Ignácio Lula
da Silva, a mídia brasileira não dispôs de muito espaço para o caso.
A Alstom foi condenada
pela justiça suíça ao pagamento de U$ 43,5 milhões pelo conluio com os
corruptos do PSDB brasileiro. (vide aqui) Mas no Brasil os envolvidos
continuam impunes e hipocritamente se pronunciam sobre como deveria ser
presidido o país, sempre com grande divulgação e apoio da mídia nacional. É o
que ocorre, por exemplo, com Fernando Henrique Cardoso, sogro de David
Zylberztajn que, então presidente da Eletropaulo, foi um dos principais
envolvidos no Caso Alstom.
Entre outros, esses
desfalques do patrimônio público nacional identificam e justificam parte dos
motivos que levaram o então Ministro da Economia a, na mesma época, dirigir um
pedido ao Fundo Monetário Internacional:
Brasília 13 de novembro
de 1998
Prezado Sr. Camdessus
O memorando de política anexo descreve as políticas econômicas e objetivos do Governo do Brasil para o período 1998-2001 para apoio das quais o Governo solicita do Fundo uma quantia equivalente a SDR 13.025 (US$ 18.023.210) na forma de um acordo stand-by por um período de 36 meses.
O memorando de política anexo descreve as políticas econômicas e objetivos do Governo do Brasil para o período 1998-2001 para apoio das quais o Governo solicita do Fundo uma quantia equivalente a SDR 13.025 (US$ 18.023.210) na forma de um acordo stand-by por um período de 36 meses.
Michel Camdessus era
então o Diretor Gerente do Fundo Monetário Internacional, mas seu sucessor,
Horst Köhler, recebeu outra carta assinada pelo mesmo Ministro Pedro Sampaio
Malan:
Brasília 23 de agosto
de 2001
Sr. Horst Köhler-
Diretor Gerente Fundo Monetário Internacional
Prezado Sr. Köhler:
O memorando anexo
descreve as políticas econômicas e os objetivos do Governo do Brasil para o
restante de 2001 e para 2002 e em apoio às referidas políticas e objetivos o
Governo solicita um Arranjo Stand-By junto ao Fundo para um período de 15 meses
no valor de DES 12 144.4 milhões (equivalente a cerca de US$ 15 650 milhões).
E um ano e seis dias
depois, o Ministro de Fernando Henrique Cardoso, remeteu uma terceira carta ao
Sr. Köhler:
Brasília, 29 de agosto
de 2002
Exmo. Sr.Horst Köhler
Diretor-Geral do Fundo
Monetário Internacional
Washington, DC 20431 — EUA
Washington, DC 20431 — EUA
Senhor Diretor-Geral:
No Memorando de Política Econômica (MPE) anexo, descrevem-se as políticas e objetivos estabelecidos pelo Governo do Brasil para os meses restantes de 2002 e para 2003. Em apoio a essas políticas e objetivos, o Governo do Brasil vem solicitar um Acordo Stand-by com o Fundo, com prazo de 15 meses, no valor de DES 22 821 milhões, montante equivalente a cerca de US$ 30 bilhões, dos quais US$ 10 bilhões seriam desembolsados no âmbito do Programa de Financiamento de Reserva Suplementar.
No Memorando de Política Econômica (MPE) anexo, descrevem-se as políticas e objetivos estabelecidos pelo Governo do Brasil para os meses restantes de 2002 e para 2003. Em apoio a essas políticas e objetivos, o Governo do Brasil vem solicitar um Acordo Stand-by com o Fundo, com prazo de 15 meses, no valor de DES 22 821 milhões, montante equivalente a cerca de US$ 30 bilhões, dos quais US$ 10 bilhões seriam desembolsados no âmbito do Programa de Financiamento de Reserva Suplementar.
Para quem tem
interesse, esses documentos podem ser lidos na integra por este endereço (vide aqui) onde se inclui também o
pronunciamento do então Presidente Fernando Henrique Cardoso sobre as medidas
de contenção econômica e aumento de impostos à população, em atendimento as
exigências do FMI para a liberação dos empréstimos que jamais resultaram em
qualquer benefício à população em saúde, educação, mobilidade urbana, melhoria
de estradas ou qualquer outra aplicação em infraestrutura. E ao final daquele
governo a população também teve de cobrir o prejuízo R$ 42,5 bilhões do apagão
energético.
Apesar da continuidade
do congelamento de salários e o aprofundamento do alarmante índice de
desemprego, as medidas e o pronunciamento de FHC foram efusivamente enaltecidos
pela mídia brasileira. Desde a campanha à presidência de Collor de Melo a
população brasileira não era tão exortada à admiração de uma personalidade
política através dos meios de comunicação.
Em contrapartida, ao
sucessor de FHC se rendeu o maior esforço de degradação de imagem pública de
que se tem notícia da história da política internacional. Nunca um governo
sofreu tão sistemático, intenso e coeso ataque da mídia. Nem mesmo Getúlio
Vargas foi tão denegrido pela imprensa e sofreu tanto opróbrio de seu
arquirrival, o jornalista Carlos Lacerda. Até mesmo Hugo Chávez, um dos
presidentes mais duramente atacados pelos veículos de comunicação de seu país,
em visita ao Brasil espantou-se com o empastelamento à imagem de Lula da Silva
pela mídia brasileira.
Por outro lado, se pelo
que fizeram por seus povos Mahatma Gandhi e Nelson Mandela foram reverenciados
internacionalmente como até então nenhum outro político do mundo, nas manchetes
dos mais significativos veículos de imprensa do hemisfério norte e pelos
títulos e honrarias concedidas pelas mais tradicionais e respeitadas
instituições da Comunidade das Nações, foram superados por Lula da Silva, como
demonstrado nesta listagem, ainda que incompleta (vide aqui)
Entre o Estadista
Global de Davos (Suíça) e o bêbado que com uma caneca de chope brindou a
abertura da Orktoberfest de Blumenau; o Homem do Ano do Le Monde e a anta de um
colunista da revista Veja; o Prêmio Chatam House do Reino Unido e o
“apedeuta”; o brasileiro comum foi colocado em traumático embate de
compreensibilidade que afetaria a capacidade cognitiva de qualquer ser humano,
por mais preparado que fosse.
Dessa forma os chamados
formadores de opinião pública se confirmam como meros difusores de estupidez,
ignorância, racismo e demais preconceitos deformadores do caráter, da percepção
e da sensibilidade coletiva. Como resultado, mesmo daqueles de que se espera
maior capacidade de discernimento se observa total desinformação e alijamento
de senso crítico sobre os temas distribuídos pela correios eletrônicos. É o que
acontece com os que postam campanhas corporativas contra as propostas para
expansão do atendimento médico à população, onde se alega ausência de
investimento governamental na infraestrutura de saúde.
Ignoram que entre as
justificativas da maior evolução do Índice de Desenvolvimento Humano
apresentado pelo Brasil em uma década, o Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento, aponta: “No caso brasileiro, esta evolução do
IDH do ano passado para este ano contou com um impulso maior da dimensão saúde
– medida pela expectativa de vida –, responsável por 40% da alta” (vide aqui)
O embotamento de
raciocínio promovido pela degradante mídia brasileira impede não somente a
capacidade perceptiva como também a dedução associativa e aqueles que tiveram
de financiar uma das maiores dívidas externas do mundo ainda não conseguem
relacionar as décadas de desarticulação e sucateamento das redes de prestação
de serviços públicos, e o abandono de qualquer infraestrutura dos mais diversos
setores com consequente e calamitoso estado deficitário desses serviços por
todo o país. Deficiências que vem sendo recuperadas através de medidas
emergenciais como a contratação de médicos estrangeiros que justifiquem
investimentos consequentes e produtivos e não mera demagogia eleitoral ou para
desvio de verbas públicas como o exemplificado em (vide aqui).
Viciado em deglutir
mentiras regurgitadas pela mídia, e obstruído em sua natural curiosidade
humana, o lamentável brasileiro comum não consegue distinguir na origem do que
recebe e distribui pela internet aqueles que os estão lesando e enganando hoje
porque antes já o lesaram e enganaram inúmeras vezes, como é o caso de Barjas
Negri, citado na denúncia do link anterior e condenado pelo TCE de São Paulo
por irregularidades em 102 contratos enquanto presidiu o CDHU – Companhia de Desenvolvimento
Habitacional Urbano de São Paulo no primeiro governo de Geraldo Alckmin. Hoje,
ao lado de José Serra, ambos do PSDB e ex-Ministros da Saúde, é um dos líderes
da oposição ao programa “Mais Médicos”, conforme se pode ler(vide aqui).
De raciocínios
inutilizados pela sistemática bestificação promovida pelos meios de
comunicação, apesar de meros e incógnitos pontos de distribuição de
preconceitos e ignorâncias esses solitários reprodutores de desinformação e
difusão de mentiras são os inoculadores de perigosa doença que, como ocorreu há
poucas semanas, pode se manifestar como surto psicótico coletivo sem que os
próprios surtados tenham a menor noção de serem portadores de um desajuste,
como no caso das lamentáveis vítimas documentadas nessas imagens (vide aqui).
No entanto, se
repetidores e distribuidores de mentiras e preconceitos são apenas os “mulas”
da ampla rede de tráfico de estupidez e boçalidade revelada nos meses de junho
e julho, qual o foco desta praga mental que se alastrou pelo país surpreendendo
o mundo?
Conforme se pode ler (vide aqui).
Nem todo o mundo ficou
tão surpreso, mas os financiadores de golpes internacionais dependem de focos
internos que disseminem a histeria para justificar suas intervenções através de
contratados corretores de potenciais econômicos nacionais de um país. E quando
um grupo de corretores pode ser atingido pelo próprio anunciante de um foco
dessa infecção que assola o Brasil, o cartel da falácia se põe em alerta e
recomenda “dupla
cautela”.
Assim se revela o
discreto charme da hipocrisia que não ocorreu aqui:
“A Folha cometeu dois
erros na edição do dia 5 de abril, ao publicar a reprodução de uma ficha
criminal relatando a participação da hoje ministra Dilma Rousseff (Casa Civil)
no planejamento ou na execução de ações armadas contra a ditadura militar
(1964-85). O primeiro erro foi afirmar na Primeira Página que a origem da ficha
era do arquivo [do] Dops. Na verdade, o jornal recebeu a imagem por e-mail.” –
Folha de São Paulo – edição de 25 de abril de 2009.
Nem no que é
demonstrado (vide aqui)
E também (vide aqui)
Tampouco teve qualquer
cautela para o que é reportado (vide aqui)
Ou a respeito da
publicação da foto-montagem que ilustra este texto e que apenas provocou uma
transferência da responsabilidade de um crime, como se lê adiante:
“Errei. Devo desculpas a José Dirceu. Na
semana passada, reproduzi neste espaço uma informação -assinada por um colega
com quem já trabalhei e que julgava ser um jornalista responsável-, dizendo que
o ex-deputado teria comprado uma moto Harley-Davidson V-Rod, no valor de R$ 90
mil. Dirceu não comprou a Harley e não sabe dirigir motos” – Barbara Gancia na Folha
de São Paulo.
Os “mulas” da rede de
tráfico de mentiras e vetores de inseminação de distúrbios psicóticos coletivos
se distribuem Brasil afora às centenas, e a Folha de São Paulo também não é o
único centro de difusão da doença que degrada parte da população
brasileira e neste inverno contaminou os jovens que, com 20 anos de idade em
média, não foram imunizados pela realidade de décadas anteriores e daí
apresentarem degenerações típicas de velhice mental precoce.
Além da Folha, alguns
outros grupos empresariais e suas subsidiárias também promoveram e promovem
demência, alienação, perda de memória, e neurose coletiva; forjando uma
sociedade caquética, depressiva e autodestrutiva.
Tem-se falado bastante
da bilionária sonegação de impostos por um desses notáveis grupos familiares
com discreto charme de hipocrisia, no entanto muito mais preocupante do que os
prejuízos econômicos, culturais ou comportamentais que provocam entre nossa
sociedade, são os prejuízos à sanidade mental e ao caráter do povo brasileiro.
Recomendável que com
esses focos da epidemia que ameaça a população do Brasil se tenha tripla
cautela e nenhum charme ou discrição na formulação de imediata regulamentação
de suas perniciosas e insalubres atividades. Ou no futuro se terá de recorrer a
psicólogos estrangeiros para garantir alguma saúde mental para a sociedade
desse país.
*Raul Longo é jornalista, escritor
e poeta. Mora em Florianópolis e é colaborador do “Quem tem medo da
democracia?”, onde mantém a coluna “Pouso
Longo”.
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