Tarde na roça
* Por Mateus Modesto
Sentado num banquinho, sem
camisa, estava esperando o tempo passar. Na frente da casa, mastigava alguma
coisa que o distraía. Coçava a cabeça suja e branca, quando descoberta do
chapéu.
O sol já ia, mas o calor continuava.
Sentado, com uma calça maltratada pelo tempo, mais que o seu rosto pelo sol, e
com umas alpargatas pretas, iguais a seus pés, ele acompanhava o vôo dos
pássaros, a caminhada das formigas, o sono do cachorro. Assim como o cão não se
incomodava com as moscas pousando nas feridas dele, o bom senhor não se
importava com o fedor de fumo que estava impregnado em seu corpo, fruto do
trabalho com a planta e do bode que acabara de acender.
“Seu José”, dizia o moço que
passava. A resposta era um levantar de braços. “Seu José”, dizia a senhora
cheia de sacos. Outra vez o levantar de braço. “Tarde, cumpade”. Seu José agora insinuava levantar da cadeira, mas não
insistiu no cumprimento.
- Vamo chegando, vamo
chegando, Zequias. Maria, me traz um banquinho pro cumpade, pra mode nós prosear...
E ali permaneceram. A conversa,
de poucas palavras, mas longa, ficou restrita somente no trabalho na roça, no
casamento da filha de Seu Zequias e do tempo quente, sem chuva, dos últimos
dias.
Maria trouxe um café para
acompanhar a conversa. Em duas canecas sem asa, rachadas, Maria despejava a
bebida feita naquele instante. Zequias agradeceu e teceu elogios à senhora:
- Gostoso...
- Isso porque ocê num provô o bolo de fubá... Uma
delícia! – dizia Seu José, todo orgulhoso. Minha senhora é muito prendada. Tem
mãos maraviiosas...
Maria dava um sorriso sem dentes.
Resolveu ficar por ali também, mas sentada no chão, na porta, tangendo o
cachorro que dormia em sua entrada e caçando um pedacinho de pau ou talo de
planta para ocupar a boca.
Seu Zequias só demorou o tempo do
cafezinho. Ele ainda ia seguir longe, caminhar um bocado. Quando se fora, Seu
José ficou só. Ninguém passava. Só o tempo. E nessa, o sol deu lugar à lua.
Assim como o caminhar das formigas dera lugar ao canto das cigarras, e o
silêncio dera vez ao som da televisão.
* Jornalista
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