A detecção de limites
“O exercício contínuo e
disciplinado desenvolve, enquanto a falta de uso atrofia”. Quem nunca ouviu
essa afirmação? Ela é verdadeira e é comprovada pela experiência. Vale tanto
para o corpo, quanto para a mente. Claro que para ser eficaz e produzir os
resultados esperados, certas condições têm que ser satisfeitas. Exercícios são
saudáveis, sim, desde que cada um detecte, conheça e respeite seus limites.
Qualquer candidato a atleta tem, antes de começar a correr (ou a saltar, arremessar,
jogar, não importa), que ser submetido a rigoroso exame médico, para conhecer
suas condições físicas e determinar, por conseqüência, até onde pode chegar.
Ultrapassar esses limites é o suprassumo da burrice..
Afinal, só um sujeito
muito burro, que nunca tenha praticado com assiduidade sequer caminhadas, sairá
por aí tentando imitar um Usain Bolt, ou algum desses resistentes atletas quenianos,
acostumados a vencer maratonas, que nos parecem sequer se esforçar para tanto. Esforçam-se.
Suas performances são frutos, muitas vezes, de anos de treinamento. Se o
marinheiro de primeira viagem tentar imitar esses super corredores, corre o
risco de sofrer algum problema cardíaco (não raro, algum, infarto), ou de
agravá-lo, se já tiver algum, podendo até morrer em conseqüência disso. Tem que
começar do be-a-bá atlético, passo a passo, por etapas e sempre respeitando os
limites do seu corpo.
O mesmo vale para freqüentadores
de academias, cada vez mais populares nesta época de culto ao físico. Ninguém
vai, em um ou dois dias de malhação, modelar um corpo sarado, com uma barriga
tipo “tanquinho” e bíceps de causar inveja a qualquer fisioculturista. Não
deve, pois, chegar a esses institutos pretendendo levantar, por exemplo, logo
de cara, pesos que até halterofilistas bem treinados e medalhistas olímpicos
teriam dificuldades em erguer. Se o fizer... certamente terá severos
comprometimentos físicos.
E esse princípio, de
que “o exercício contínuo e disciplinado desenvolve e a falta de uso atrofia” é
válido, também, para o cérebro? Sim, e talvez mais até do que para o corpo. Exige,
todavia, que também sejam adotadas certas cautelas, ditadas pelo bom senso.
Antes de tudo, igualmente, é necessário que cada um detecte seus limites e não
tente, jamais, em nenhuma circunstância, ultrapassá-los, sob pena de, em vez de
desenvolver a mente e o raciocínio, provocar uma estafa, de conseqüências imprevisíveis,
mas sempre desastrosas ou, quem sabe, enlouquecer. Existe esse risco? Não posso
jurar que sim, mas presumo que exista
Ler, por exemplo, é
saudabilíssimo, em qualquer aspecto que se analise essa atividade. Mas a
leitura, para ser útil e desenvolver o raciocínio, requer certas cautelas. O
que, estão surpresos? Pois não deveriam! O primeiro cuidado, óbvio, a se adotar
refere-se à iluminação adequada, para não comprometer os olhos. Quase ninguém
tem essa preocupação, que considero elementar. Outra cautela é restringir a
leitura a certo número de horas, em que seja possível manter a concentração,
sem se tornar distraído ou dispersivo. Se o sujeito ler, por exemplo, por doze,
quinze ou vinte horas consecutivas, não só não conseguirá apreender tudo o que
o texto tem de bom a lhe oferecer, como corre o risco de ficar com uma baita
dor de cabeça, quando não coisa pior.
Todo exercício,
portanto, requer uma série de cautelas para, de fato, desenvolver, tanto o
corpo quanto a mente. E para ter o efeito que desejarmos, exige (respeitadas as
condições e cuidados que apontei), assiduidade. Não podem ser feitos só
ocasionalmente, quando nos der na veneta. Além do que, a carga de exercícios,
quer física quer mental, não pode ser cumulativa. O sujeito que deixou de
correr algum dia, ou de se exercitar em uma academia (quando for o caso) ou de
ler, escrever ou meditar, não pode fazê-lo em dobro, no dia seguinte, achando
que poderá repor o que não fez quando deveria fazer. Não é assim que as coisas
funcionam. Tem que ter autodisciplina e constância para se exercitar
diariamente. Poucos têm.
No meu caso, embora não
seja sequer esboço de atleta, não permito que meu corpo se atrofie. Não pratico
corridas e muito menos malho em alguma academia, é verdade. Limito-me a
caminhadas, estritamente nos limites do meu organismo. Mas faço-o todos os
dias. Isso, óbvio, no que se refere a exercícios físicos. No aspecto mental,
mantenho rígido programa de leituras, com duração máxima de duas horas diárias,
todavia sem interrupção em nenhum dia, seja sábado, domingo ou feriado. Nem
sempre me sinto disposto a ler, e ainda mais por esse prazo fixo de tempo. É
aí, porém, que entra o fator autodisciplina. Com vontade ou sem ela, acomodo-me
em uma cadeira, nem muito confortável e nem com falta de conforto, providencio
a iluminação adequada, e leio, pelas programadas duas horas, que é (suponho) o
meu limite.
Não sou, porém,
paradigma de constância e muito menos de disciplina, que possa ou deva ser
imitado, pelo menos no que se refere a outra atividade que exerço com
constância: à escrita. Bem, escrever, escrevo, rigorosamente, todos os dias (e
vocês são testemunhas disso, pelo menos quem vem me dando a honra de me seguir
nos últimos oito anos). Quando diante da telinha em branco do computador, perco
as estribeiras, esqueço toda noção de tempo, ignoro quaisquer limites e boto a
prudência para escanteio. Escrevo, escrevo e escrevo, obsessiva e
compulsivamente, enquanto me der na veneta. Deveria determinar meu limite para
isso, claro. Não determino. Já houve ocasiões em que escrevi por oito horas
consecutivas. Claro que foi contraproducente. Não raro, tive que refazer esses
textos por completo, com calma, em dias em que adotei a desejável moderação,
por serem malucos e incoerentes. Não respeitar limites, portanto, é, no mínimo,
contraproducente. Pense nisso.
Boa leitura.
O Editor
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk.
Bom conselho, lógico, começar devagar, ir ampliando aos poucos. Em relação ao exemplo da academia,achei primário e exagerado, mas deixa pra lá...risos...Sobre aconselhar exercícios, eu faço isso todos os dias, e para velhinhas que nem levantam da cadeira e estão gordas. Peço para que andem em volta da mesa, depois da casa e por fim do quarteirão. Cada um precisa ter seu início conforme sua condição, É óbvio, agora quanto a persistência, poucos a mantém. Estudar até enlouquecer, já muitos casos, assim como ler e reler o mesmo livro várias vezes. Sobre escrever durante tanto tempo assim, como você cita o seu caso, deve ser raro. Nunca li em parte alguma coisa semelhante.
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