Estamos aqui para melhor servi-lo
* Por
Fernando Yanmar Narciso
Digam a verdade, não é
assim que sempre acontece? Com a economia movimentada pela classe C, todos
ávidos para torrar a grana que têm e a que não têm naquele eletrodoméstico
super-moderno que anunciam no intervalo do Jornal Nacional ou nos spams do
Facebook, ou naquele carrão de último tipo que tem sido a menina dos olhos de
tudo que é revista automobilística. Você vai à loja, faz o test-drive no que
deseja levar pra casa, assina todos os contratos que os Illuminatti esfregam na
sua cara...
Até aqui, desde que
mostre o dinheiro, você é o ser humano mais importante que já caminhou sobre a
Terra... Mas depois de fechar o negócio, você simplesmente morre para a loja.
Não querem mais saber o seu nome, reconhecer seu rosto ou ouvir suas
reclamações. Só querem saber do próximo na fila. Hoje em dia, com o “minucioso
e confiável” controle de qualidade do Inmetro, o mais provável é que nossas
compras já estejam com defeito dentro da caixa, antes do primeiro uso.
Você põe o
liquidificador novo na tomada e a máquina só falta liquefazer a si mesma. O
carro, que saiu aparentemente perfeito da concessionária, começa com um
irritante “nheco-nheco” no motor assim que o vendedor te entrega a chave. O
forno microondas poderia tranquilamente congelar uma garrafa de Skol em dois
minutos. Aquela fritadeira elétrica Philips Walita, que consegue até amaciar
mármore no comercial, só funcionava direito na mão do apresentador da Polishop.
Mas e o vendedor com
isso? Ele não tem culpa nenhuma, pois tem? Mesmo assim, o consumidor desapontado
precisa achar um bode expiatório para expiar sua fúria. E ele, por sua vez,
deixa as reclamações entrarem pelos ouvidos e saírem lá por baixo. Só se
interessa pelo próximo cliente. E mesmo que ele resolva, por caridade cristã,
prestar atenção nos seus calundus, o mínimo que ele pode fazer é indicar a
assistência técnica ou trocar o produto por outro, que se não tiver a sorte de
vir com o mesmo problema, vem com outro pior. C’est La vie!
“Ninguém tem menores
preços que os nossos!” “Mais barato é só aqui!” “O patrão ficou maluco!”
“Cobrimos qualquer oferta!” Blá, blá, blá... Às empresas de marketing, parece
que a única coisa que importa ao freguês é o preço do produto. É evidente que a
pessoa planeja sair da loja fazendo o máximo possível de economia, afinal ainda
tem as prestações do que comprou mês passado para pagar, mas e quanto ao resto?
E quanto à garantia, à pós-venda, o custo-benefício e, mais importante, a
QUALIDADE do que está sendo oferecido?
Acreditam mesmo que o
consumidor sensato não vai dar a mínima pra tais detalhes, bastando saber que
aquele liquidificador Arno, custando apenas R$ 59,95 à vista, pode ser dividido
em doze prestações de R$ 6,25, mesmo que isso represente um aumento de 10% no
preço final... Afinal, quem é que se interessa em produzir bens duráveis hoje
em dia? Meus pais são de um tempo que não existiam coisas descartáveis. O carro
da família era comprado e literalmente cada filho nascido aprendia a dirigir
nele. Ele pertencia ao dono por tantos anos que podia até fazer sua própria
declaração de imposto de renda, tamanho o entrosamento da família com ele. Caía
aos pedaços, enferrujava todo, o escapamento funcionava aos peidos de fumaça
preta, mas ele se recusava a nos deixar na mão. Como diziam os ingleses da
Rolls-Royce, o carro não quebrava, simplesmente “falhava em prosseguir”.
Noutros tempos, a única
marca de geladeira que todos conheciam e confiavam era a Frigidaire, fabricada
pela General Motors. Difícil era achar uma casa que não tivesse um exemplar da
marca, pois além de potente, seu corpo era construído como um tanque de guerra.
Era plugar na tomada e deixar o pau quebrar, funcionaria para sempre. Era uma
máquina tão resistente que até Indiana Jones usou uma para escapar de uma
explosão atômica! Cresci olhando para duas Frigidaires na casa de minha avó, e
se ela ainda estivesse entre nós, estaríamos tomando sorvete saído delas. Mesmo
com as grades enferrujadas, o barulho ensurdecedor e o motor soltando
quilômetros de CFC na camada de ozônio, nossos titãs gélidos perdurariam mais
que as baratas.
Porém, os tempos, há
muito, são outros. Digo, que empresário teria interesse em produzir uma
batedeira “imortal” hoje, ou um Hyundai tão durável quanto uma Rural? Não dá
para aumentar os lucros se o freguês entrar na loja só uma vez, por isso
praticamente todo o inventário do Bonzão e da Ricardo Eletro, mesmo fabricado
na Zona Franca, tem peças produzidas na China com catarro fossilizado,
projetadas para deteriorar logo ao saírem da linha de montagem. Por isso, se a
TV de LCD de 50 polegadas comprada semana passada já deu prego, não deixe de
nos visitar! Ninguém vende mais barato ou tem melhores prazos e planos de
pagamento que a nossa rede. REDE PEGA-OTÁRIO! AQUI O FREGUÊS TEM “SEMPRE”
RAZÃO!
*Designer
e escritor. Sites:
HTTP://www.facebook.com/fernandoyanmar.narciso
http://cyberyanmar.deviantart.com/
HTTP://www.facebook.com/terradeexcluidos
Verdade verdadeira, mas as lojas de eletrodomésticos, devido a veracidade dos fatos, não ficarão muito felizes com seu discurso não. Parabéns a todos, inclusive aos vendedores e principalmente aos otários.
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