A greve dos PMs
* Por
Marco Albertim
Ressalta na greve da
Polícia Militar de Pernambuco, o isolamento que o segmento sofre em relação à
população. Recife tornou-se refém do silêncio das ruas. Tanques e viaturas da
Força Nacional, com soldados empunhando fuzis-metralhadoras apontados para as
calçadas, deram conta do justificado espanto dos minguados transeuntes nas
ruas.
No sofisticado bairro
de Boa Viagem, os urutus foram aplaudidos e ouviram-se vivas ao Exército; a
manifestação reflete o medo a saques e a assaltos, junto à reprovação à
paralisação de uma força que tem presença ostensiva em centros vitais do
comércio.
A pauta tem como
reivindicação principal o aumento de salários de soldados e oficiais. A decisão
da greve ocorreu numa assembleia com presença maciça de militares em trajes
civis. Porém, no período eleitoral, quando a lei proíbe vantagens salariais na
administração pública. Decisão açodada, atabalhoada, em que pese a justeza dos
reparos que os militares exigem. Sintoma do açodamento deu-se com a fala da
tenente-coronel Conceição Antero, líder com destacada visibilidade na
corporação. Na assembleia, em frente ao Palácio do Governo, fez uso de um latim
popularesco, corrente em rodinhas de círculos amigos: “(...), se é para parar,
vamos parar essa porra.” Foi aplaudida pela turba ruidosa. Mas na noite da
quinta-feira, segurando o microfone, defendeu o retorno aos quartéis, apoiada
no compromisso do governo de que a reivindicação salarial será retomada em
janeiro. A greve teve fim sem a unanimidade do plenário no asfalto, tampouco
houve votação. Quando de sua decretação, a mesma oficial reconheceu no
microfone que a corporação tem que procurar o apoio da população. Não há sinais
de retaliação por iniciativa da cúpula militar. O comando do quartel reconhece
a defasagem salarial, a irrisória ajuda do vale-alimentação e a precariedade do
Hospital da Polícia Militar. Conceição Antero, diga-se, é ex-esposa do
comandante da corporação, coronel José Carlos Pereira.
A greve demonstrou
ausência de unidade numa categoria que ainda engatinha no enredo de greves,
inda que a hegemonia de oficiais e soldados tenha manifestado disposição para
ir adiante na peleja. E o Tribunal de Justiça decidira pela ilegalidade da
greve. O governador João Lyra Neto não arguiu sobre a precariedade do cofre do
Estado em conceder o aumento, ateve-se à Lei de Responsabilidade Fiscal e à
proibição de aumento no período eleitoral. Contudo, a iminência de descontrole
da ordem, franziu o cenho de Lyra Neto, ao solicitar a presença da Força
Nacional e se reunir com o ministro da Justiça, Eduardo Cardozo.
Nos três dias acampados
nas imediações do Palácio do Governo, centenas de motocicletas estacionaram ao
lado do Teatro de Santa Isabel. Dos ônibus, na ponte sobre o rio Capibaribe, os
ralos passageiros olhando com indiferença para a multidão de militares à
paisana; soldados de bermuda e tênis, homens e mulheres em torno de um carro de
som com músicas evangélicas; trilha nada comum ao contingente treinado para
vigiar e prender. A decisão de vestir a farda, junto com o cansaço, acentuou o
sentimento de desgaste, de perda. No dizer do cabo Miguel Neto, 24 anos de PM:
“Vou pedir à mulher para engomar a farda.”
Os saques às lojas
tiveram conotação de vandalismo. Não foram comandados por Associações de
Moradores de bairros pobres, tampouco tiveram a participação de acampados dos
sem-terra. A correria mostrou o frenesi do subproletariado, do lúmpen
apropriando-se da presa fácil. Mas não há como negar que também a mulher com
filhos a tiracolo arrematou o butim acessível. Celulares de última geração e
estrados de camas para quartos vazios de apetrechos para o descanso. Uma
parcela que os governos Lula e Dilma ainda não contemplaram.
*Jornalista e escritor.
Trabalhou no Jornal do Commércio e Diário de Pernambuco, ambos de Recife.
Escreveu contos para o sítio espanhol La Insignia. Em 2006, foi ganhador do
concurso nacional de contos “Osman Lins”. Em 2008, obteve Menção Honrosa em
concurso do Conselho Municipal de Política Cultural do Recife. A convite,
integra as coletâneas “Panorâmica do Conto em Pernambuco” e “Contos de Natal”.
Tem três livros de contos e um romance.
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