Graça
desprezada
* Por Pedro J. Bondaczuk
O homem, este animal imperfeito, misto de divindade
e de fera selvagem, teve o supremo privilégio de conviver diretamente,
fisicamente, cara a cara com Deus, em uma das suas três expressões, há dois mil
anos. Mas não soube aproveitar essa generosa oportunidade. Selou, por
conseqüência, o destino deste belo e mágico planeta azul, que poderia ser
infinitamente melhor do que este mar de lágrimas em que todos nós estamos nos
afogando.
Tivesse, um pouquinho que fosse, de sabedoria;
soubesse distinguir o eterno do efêmero e o sagrado do profano; possuísse
capacidade mínima de amar de verdade os semelhantes, e a humanidade viveria
hoje num paraíso terrestre, radioso e belo, desde essa especialíssima ocasião.
Jesus Cristo teria sido alçado, automaticamente, de forma natural e espontânea,
sem quaisquer dúvidas ou mínimas contestações, até por questão de lógica, à
liderança suprema do mundo. E a História dos dois últimos milênios não teria
sido escrita com tanto sangue e nem teria jamais como fundamento bilhões de cadáveres.
Guerras cruéis e insanas teriam sido evitadas.
Ninguém morreria de fome. Haveria um reino indestrutível, de paz, justiça e
harmonia. Mas há dois mil anos, o homem perdeu essa chance de redenção,
enquanto espécie. Optou pelo caminho mais difícil, criminoso e perverso.
Todavia, graças ao generoso sangue de Cristo, que
morreu para redimir os que nele cressem e buscassem seguir seu exemplo de paz e
de amor, a humanidade ainda não está perdida. Tem uma chance, ao dispor de
qualquer um. Porém o caminho da salvação
é sumamente estreito. E pouquíssimos vão conseguir passar por ele. Terão
sucesso, apenas, justamente os que, pelas leis e critérios humanos em voga,
pelas condições sociais e materiais que ostentam, são os mais humildes entre os
humildes. São escarnecidos e perseguidos pelos pretensos poderosos, pelos
idiotas que não se dão conta nem mesmo da sua óbvia mortalidade.
Não sabem, esses insensatos, que numa fração
infinitésima de segundo, até mesmo sem nenhuma causa orgânica, seus corações
podem deixar, subitamente, de pulsar. E todo seu orgulho e empáfia se
transformam, então, em nada. Seus corpos, malhados, sarados, bem nutridos e
sadios, viram, subitamente, uma massa asquerosa e gelada, de carne inerme e sem
vida, que apodrece, fatalmente, em poucas horas. Estes jogam fora a vida
espiritual, por causa da aposta estúpida e sem sentido na material. Têm toda a
chance possível para fazer a opção correta. Mas não fazem.
São dotados, por exemplo, da capacidade plena de
raciocínio, bastando que a exerçam e desenvolvam. Mas não a exercem. Têm acesso
a toda a sorte de informação, científica, filosófica, teológica, etc. Mas não
sabem aproveitar. Contam com o livre arbítrio para determinar que caminho
trilhar. Mas, por razões que se constituem mistério, optam pelo mal, que os
leva à destruição. Aferram-se a uma doentia auto-idolatria e julgam-se maiores
e mais importantes do que são. Com sua atitude, condenam bilhões de semelhantes
a uma vida horrorosa, de sofrimentos imensos e inenarráveis, no plano material.
E são condenados, em troca, à absoluta extinção, física e até mesmo da memória
de que sequer existiram, no campo espiritual.
"Foi inútil a passagem de Jesus Cristo pela
Terra?", perguntariam os pobres de espírito, que não sabem e não querem se
refugiar na fortaleza da fé. Claro que não! Deus, em sua presciência,
"sabia" (Ele tudo sabe, muito antes de qualquer coisa acontecer), que
a grande maioria da espécie humana não só não reconheceria seu Filho, como
escarneceria dele. Humilharia o protótipo da bondade. Mataria o Deus de Amor,
pregando-o numa cruz. "E por que não interferiu?", voltariam à carga
os incrédulos (ou os apenas vacilantes). Para que o exemplo supremo de
abnegação e generosidade, que é o de dar a própria vida para salvar a do próximo,
permanecesse como testemunho da vontade divina de redimir o homem, sem,
contudo, abolir o livre arbítrio.
Este é o verdadeiro significado do Natal. Essa é
ocasião propícia para lembrar de quando o Criador, generosamente, deu à
humanidade o maior presente que possa ser dado a alguém: a oportunidade da
conquista da vida eterna. Mas não esta mesquinha existência terrena, como a
conhecemos, repleta de sofrimentos, violência, doenças e maldades de toda a
sorte.
Antes da sua ceia, reflita um pouquinho, um instante só,
por mínimo que seja, querido leitor, no valor simbólico desta data. Caso se
sinta realmente tocado pelo espírito de solidariedade, característico do Natal,
faça um gesto de bondade, qualquer um, por pequenino que seja, em relação ao
semelhante. Dê uma esmola, por exemplo. Mas espontânea e se sentir vontade. Ou
dedique um amável sorriso ao aflito e desesperado. Ou dê uma simples palavra de
simpatia e de compreensão ao excluído. Faça qualquer coisa! Não importa o
tamanho do ato, mas o espírito que o move. Mas não se omita! Aja assim e verá
como vai se sentir melhor. Simples, não é mesmo?!
E um dia, quando não se sabe, a Terra será redimida.
E os versos do poeta Thiago de Mello, em seu poema "Os Estatutos do
Homem", deixarão de ser mera poesia ou utópico ideal. Vão se transformar
em radiosa verdade: "O homem/não precisará nunca mais/duvidar do homem/que
o homem confiará no homem/como a palavra confia no vento/como o vento confia no
mar/como o ar confia no campo azul do céu..." Feliz Natal para todos!!
* Jornalista,
radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual
Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do
Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe,
ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma
nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance
Fatal” (contos) e “Cronos & Narciso” (crônicas). Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk
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