A maior derrota
* Por Daniel Santos
Encontraram,
afinal, o homem nas primeiras horas da manhã; não, com o olhar estupefato de
quem passara toda a noite defendendo-se das
feras da floresta, mas com a grave fisionomia de quem muito considerava.
E
ele chorava. Chorava quase como um bebê inconsolável, como uma dessas
criaturinhas a quem os mais velhos mimam em excesso e, um dia, sem quê nem por
quê, descobrem-se dolorosamente iguais aos demais.
Ele
sobrevivera nessas condições, arriado de perplexidade, com um tal desencanto
que parecia impossível recuperá-lo para a vida útil. Depois, se soube: num de
seus estratos mais profundos, alterara-se a identidade.
Nunca
negou que chorara por medo às feras, nunca negou que também a possibilidade de
morrer o comovera. Mas não fora só isso. Houve um segundo choro e, esse sim,
lhe deu a exata compreensão de si.
Assim
chorou, ao se perceber inapto para salvar a si mesmo, desprovido dos sentidos e
das aptidões que o mínimo animal dali trazia já no nascimento. Chorou a derrota
maior, humilhado pela incompetência.
* Jornalista carioca. Trabalhou como repórter e
redator nas sucursais de "O Estado de São Paulo" e da "Folha de
São Paulo", no Rio de Janeiro, além de "O Globo". Publicou
"A filha imperfeita" (poesia, 1995, Editora Arte de Ler) e
"Pássaros da mesma gaiola" (contos, 2002, Editora Bruxedo). Com o
romance "Ma negresse", ganhou da Biblioteca Nacional uma bolsa para
obras em fase de conclusão, em 2001.
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