O
contragolpe virá quando a esquerda descobrir o povo brasileiro
* Por
Raul Longo
Ao longo de sua
história a direita brasileira praticou diversos golpes contra a própria
direita. Pouquíssimos foram os governos da Velha República que conseguiram
levar a término o mandato único, pois o café transbordava o leite ou vice-versa
de acordo com os interesses dos clãs mais fortes. Aí veio Getúlio Vargas que
como Pedro II foi derrubado por ferir os clãs pelo simples fato de atender
interesses mínimos das camadas populares.
A popularidade
alcançada pela monarquia, sobretudo com a abolição da escravatura, não foi
suficiente para promover um contragolpe contra a república dos coronéis. Apenas
algumas mobilizações isoladas como a de Canudos na Bahia e os fuzilados na fortaleza
de Anhatomirim em Desterro, à qual Floriano Peixoto impôs uma homenagem a si
mesmo, dando à cidade o nome que até hoje se preserva: Florianópolis.
Já a popularidade
obtida pelo ditador que promoveu a primeira democratização social brasileira
instituindo leis trabalhistas, saúde e ensino público, impulsionando a economia
do país através das primeiras indústrias de base, resultou em ser levado
novamente ao cargo executivo através do voto popular que passou a ser
desrespeitado por alguns jornais de São Paulo e Rio de Janeiro.
Para ser mais exato “A
Tribuna da Imprensa” de Carlos Lacerda e “O Estado de São Paulo” da família
Mesquita. Um que outro adotou a mesma linha de defesa dos interesses
estrangeiros contra a política nacionalista de Getúlio, mas é falta de memória
ou desconhecimento da história dos que tentam comparar os esforços da Mídia de
hoje com aqueles tempos em que isso de Mídia praticamente inexistia e o que
havia de mais próximo era o grupo Diários Associados de Assis Chateaubriand.
Apesar de viver as
turras com Getúlio, amiúde trocavam favores, como quando Chatô obteve do
ditador interferência na legislação para manter a guarda de sua filha após a
separação matrimonial. Mas nem Lacerda nem Mesquitas puderam impedir a comoção
popular promovida pelo suicídio de Getúlio em 54. Um ato individual, mas é o
que se pode considerar como único movimento contragolpista de nossa história,
pois quanto ao de 64 somente arremedos como o das Ligas Camponesas de Paulo
Julião e do governo Miguel Arraes em Pernambuco. Movimentos suspensos por seus
líderes para evitar inútil derramamento de sangue.
Desde a criação da
estratégia golpista do Mensalão se ouve da própria militância e de integrantes
do próprio PT muitas críticas ao governo, afirmando que deveria tomar esta ou
aquele atitude, evitar isso ou aquilo. Culpa-se ao governo e ao partido pelo
que cada um considera o erro primordial e apenas para citar um exemplo dessas
duvidosas autocríticas, citam-se os que consideram contratação de Waldomiro
Diniz como origem dos motivos do golpe como se na testa daquele ex-assessor já
estivesse escrito: “Fui corrupto”, ou como se houvesse milhares de técnicos
experientes a disposição e dispostos a compor uma equipe de governo, ou como se
José Dirceu fosse amigo do Carlinhos Cachoeira. No entanto, raro se ouvir
críticas à manipulação da Mídia através de um fato ocorrido anteriormente no
governo Garotinho que sequer era aliado do PT ou do governo Lula.
E graças à esquerda
brasileira o golpe prossegue. Golpe iniciado lá na abolição da escravatura e
sempre presente e permanente a cada vez que algum governo brasileiro implanta
medidas de interesse popular.
O inverso de tal
situação se exemplifica na história de Cuba.
O Partido Comunista
Cubano, como todos os partidos comunistas, não concordava com a revolução
armada, mas desde a tomada de Moncada as esquerdas de Cuba se uniram em um
único propósito. Fidel, Che ou Raúl não foram conscientizar a população cubana
sobre estes propósitos de casa em casa. Evidentemente este foi um trabalho de
toda a esquerda daquele país.
Dizer que o povo
cubano era mais consciente do que o brasileiro é desconhecer a história e a
localização geográfica de Cuba ao lado da Meca do consumismo da qual se tornou
colônia tão logo finda a revolução da independência cubana da coroa espanhola.
Em Cuba não houve independência, apenas troca de colonizadores.
Sujeito ao tráfico de
drogas e intensa exploração do lenocínio, por décadas o povo cubano foi educado
à subserviência profissionalmente utilizada em cassinos e hotéis de turistas
americanos e a exploradores da mão de obra produtora de charutos, cana de
açúcar e rum. No entanto, apesar de 5 décadas do mais restrito bloqueio
comercial já imposto a um país de tão reduzido território, apesar das inúmeras
tentativas de assassinato de Fidel, os Estados Unidos não se estimulam a darem
um passo para invadir a Ilha mesmo após 2 décadas de finda sua única proteção
internacional: a União Soviética. Atravessaram o mundo para invadir Afeganistão
e Iraque e promoverem golpes em Líbia, Síria, etc.; mas o governo de Cuba está
preservado.
O programa Mais
Médicos tem permitido maior contato com cubanos, sejam da área da saúde ou os
que para cá vieram para administração do plano binacional. Estes, mesmo quando
inquiridos a respeito muito pouco se referem a Fidel ou Raúl Castro, tampouco
ao comunismo ou qualquer ideologia política, mas repetidamente e com muito
orgulho se referem a uma entidade: “nosotros cubanos.
Quando deixarmos de
ser da Europa ou dos Estados Unidos e nos descobrirmos em nossa consciência
como “nosotros brasileños”, talvez possamos vir a entender que o golpe contra o
Brasil não resulta de imaginárias deficiências de comunicação e políticas de um
governo que tem cumprido a risca com os propósitos de inclusão social e democratização
de oportunidades e acessos à educação e saúde e outras necessidades básicas de
nossa população, promovendo a retirada do Brasil do Mapa Mundial da Fome e
nosso IDH como jamais nenhum outro o fez antes.
Quando a esquerda
brasileira descobrir o povo brasileiro, talvez se conscientize do que realmente
seja ser de esquerda e só então poderemos promover o primeiro movimento de
contragolpe da história política do Brasil.
*Raul
Longo é jornalista, escritor e poeta. Mora em Florianópolis e é colaborador do
“Quem tem medo da democracia?”, onde mantém a coluna “Pouso Longo”.
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