A crítica que vale a pena
A crítica, seja lá a o que e a quem for – a uma pessoa, uma
ideologia, uma situação qualquer, uma pintura, um livro etc.etc.etc. – é, antes
e acima de tudo, ato de coragem. Sobretudo se quem critica o faz assiduamente.
Ou seja, se a torna atividade profissional. Quem faz essa opção tem que ter
nervos e estômago fortes. Deve estar consciente (e geralmente está) que fará
muitos desafetos (para não dizer, inconciliáveis inimigos). No fundo, no fundo,
ninguém gosta de ser criticado, mesmo que diga o contrário ou que tenha plena
consciência de que o mereça (o que, certamente, não revela a ninguém). Mais complicado
ainda é criticar artistas de qualquer arte, cuja característica principal
(salvo raríssimas exceções) é a vaidade, posto que em graus de intensidade dos
mais variáveis. Alguns são vaidosos ao extremo. Outros nem tanto. Mas todos, em
certa medida, o são.
É errado ter orgulho do que se é ou do que se faz? Depende!
Se não se incorrer em exagero, entendo que não. Defendo a postura do indivíduo
que raciocina da seguinte maneira: “Fulano, Sicrano e Beltrano são bons, mas
também sou”. Claro, se for de fato. Isso é mais do que mera vaidade. É
autoconfiança. Em contrapartida condeno quem se ache o suprassumo da
excelência, aquele que considere que ninguém pode sequer igualá-lo, quanto mais
superá-lo. Há muita gente assim e, por estranho que pareça, quase sempre são
pessoas que podem ser tudo, menos excelentes. Não são sequer competentes. Dá
para se prever no que essa vaidade exacerbada irá resultar, não é mesmo? Mais
cedo ou mais tarde, as circunstâncias acabarão esfregando no nariz desses
vaidosos extremados a verdade nua e crua. A decepção será tão grande, que
provavelmente irão recorrer ao álcool e/ou às drogas na tentativa vã de minorar
o que poderia ser evitado com um tiquinho só de autocrítica honesta e sensata.
Não se pode colocar todo e qualquer tipo de crítica num
mesmo e único balaio. Depende, por exemplo, de quem critica e de a o que tem
restrições. E, principalmente, de como o faz. O pressuposto mínimo que o bom
senso exige é o de que o crítico tenha conhecimento de causa do que se propõe a
criticar. Se não tiver... ficará claro que sua intenção é a de somente ofender.
Correrá, todavia, o risco de cair em ridículo (e dificilmente escapará disso),
caso quem ou o que critique não seja criticável. Outra condição é que
fundamente sua avaliação. Não deve, pois, criticar tendo por parâmetro
exclusivamente o gosto pessoal, na base do “não gostei”, ou do “gostei”. E no
caso de não gostar daquilo que está criticando (e nem toda a crítica que se
preze é, ou tem que ser necessariamente negativa), aponte as razões objetivas
para desgostar ou para gostar. Que mostre as falhas ostensivas, se for o caso
de fazer restrições, até para que o autor da obra criticada repare o erro (caso
ainda for possível a reparação).
Atendidos esses pressupostos, vem a parte mais importante de
tudo: o “como” criticar. Qual a linguagem a ser utilizada? Se você tiver
restrições a fazer a uma obra (ou a uma ideologia, uma causa, uma pessoa etc.
não importa), e se for instado a emitir opinião a propósito, profissionalmente
ou não (muitas vezes nem é), não precisa, por isso, recorrer a termos
ofensivos, chulos, e muito menos a ostensivos xingamentos. Sua crítica terá
muito mais força e credibilidade se feita de forma educada, respeitosa, ponderada
e inteligente. A menos que você queira desafiar o criticado para uma briga, o
que será outra coisa e terá que arcar com as consequências.
Alguns recorrem à ironia, achando que não irão ofender o
criticado. Depende. Este não é recurso para “amadores”. Exige talento de quem o
utiliza, pois é muito fácil, facílimo, descambar-se para a mordacidade e o
deboche, que equivalem a dizer ou a escrever impropérios, posto que não dos “cabeludos”,
já que em linguagem supostamente “elegante”. No caso de críticos literários,
pouquíssimos foram acatados pelos escritores cujos livros criticaram. Não digo
que não tenham existido. Existiram e ainda existem. Mas... são relativamente
poucos.
Eu, por exemplo, acataria de muito bom grado (e me sentiria
honrado) críticas aos meus livros ou textos esparsos vindas de Machado de
Assis, caso isso fosse possível. Claro que não é! Embora não tenha firmado
reputação nesse gênero, nosso maior escritor foi um dos primeiros (muitos
asseguram que foi o primeiro) a exercitar essa (convenhamos, antipática)
atividade. Preenchia todos os requisitos de uma crítica literária honesta,
inteligente, isenta, competente e, sobretudo, construtiva. Ainda assim...
granjeou uma grande legião de desafetos. Pena que tenha se constituído em rara
exceção.
Boa leitura.
O Editor.
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Perdi uma amiga escritora no instante em que disse que certa parte de um livro dela tinha menos qualidade do que a porção inicial. Era uma parte grande, com conversas "da roça", que muitos apreciam. Eu não. Ela não gostou, e me disse que eu não tinha capacidade de falar aquilo. A amizade, depois de inúmeros e-mails, gorou. Era excesso de vaidade dela, e, no caso, uma frágil amizade virtual não resistiu. Uma pena!
ResponderExcluirAcontecendo com o meu livro "Jesus", religiosos, irreligiosos (ateus) e o diabo a quatro!!!
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