Por
que não o jaleco branco nos bonecões de ar?
* Por
Marcelo Sguassábia
Sabe
aqueles bonecões promocionais de ar comprimido, que ficam de
chamariz na frente de alguns comércios de bairro? Estou pensando em
colocar um na calçada do meu consultório. De jaleco branco e
estetoscópio no pescoço, simpaticão como ele só. Não ria, por
favor. Eu nunca falei tão sério.
Com
essa crise mais crônica do que todas as piores doenças juntas,
precisamos sobreviver da mesma forma como sobrevivem quaisquer outros
honestos e bem intencionados prestadores de serviços. A diferença
entre um excelente médico e um ótimo mecânico, além do desnível
social normalmente observado, é que a nossa “rebimboca da
parafuseta” fica dentro de um organismo, e não em um motor. E quem
é bom no trato de rebimbocas orgânicas tem mais é que se valorizar
e buscar a merecida visibilidade. Sem dramas de consciência. Temos
de disponibilizar nossos préstimos de maneira não apenas objetiva,
mas também original. Cada vez mais original, se quisermos nos
destacar em meio a um imenso e competente exército de bons
profissionais labutando por um lugar ao sol.
Já
comentei com meus colegas sobre esse projeto. Alguns deles falam em
agressão à ética médica, consideram a ideia aberrativa e
promocional demais para a natureza da nossa profissão. Mas
argumento: o fato de ter um bonecão de ar comprimido em frente ao
meu consultório me torna um profissional menos sério, menos
qualificado ou menos comprometido com a idoneidade no exercício do
ofício?
É
muito bonitinho e elegante uma plaquinha discreta, em aço escovado
ou vidro jateado, na recepção de uma clínica projetada por
escritório de arquitetura. Concordo que é bem mais “clean” e
condizente com a nossa nobre atividade. Só que é quase inútil, não
cumpre a função de sinalizar e divulgar. Ninguém acha estranho um
imenso muro pintado com “Funilaria do Tião – a 200 metros” e
com uma seta vermelha apontando a direção do estabelecimento. Mas
se eu coloco uma tabuletinha de nada escrito “Psiquiatra – logo
ali”, vão querer me internar. E a comunidade médica da cidade vai
entrar com pedido de cassação do meu CRM.
Entendo
que o mesmo se aplicaria a outros profissionais da saúde, como os
dentistas. Uma clínica odontológica poderia muito bem ter um
molarzão de ar comprimido bailando pra lá e pra cá na fachada, com
raiz e tudo, bem branquinho para chamar bastante a atenção. Ou quem
sabe um sorrisão gigantesco, tipo aquele bocão dos Rolling Stones,
porque é isso mesmo que as pessoas buscam quando vão tratar dos
dentes.
Nos
Estados Unidos, é corriqueiro ver médicos promovendo verdadeiras
campanhas publicitárias sobre seus serviços. Normal. Só que aqui é
feio, apelativo, dá a impressão de estar se matando cachorro a
grito. Mas, afinal de contas, de onde vem essa equivocada noção de
que o nosso sapato branco deve ter sempre salto alto?
*
Marcelo
Sguassábia é redator publicitário. Blogs:
WWW.consoantesreticentes.blogspot.com (Crônicas e Contos) e
WWW.letraeme.blogspot.com (portfólio).
As normas de propaganda são muito rígidas.
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