Meu
amigo, Charlie
*** Por
Márcia Savino
Você
vai ficar na saudade, minha senhora*. Não sei de quem a
letra fala, não dá pra saber. Sei que ver um teatro lotado de gente
cantando as músicas do repertório de um show, emociona. Mais ainda
quando acontece no interior. Nunca me imaginei sentada na plateia de
um show de Benito de Paula. Se bem que naquela fase da vida em que a
canção de fundo foi minha alma canta, vejo o Rio de
Janeiro**, eu, guardasse, perdido comigo, em alguma
gaveta**, o bordão do friburguense apaixonado: “Eu sou homem
da montanha...*
Esperava
conhecer um pouco mais do repertório, mas vi que sabia muito pouco.
No entanto, minha ignorância não atrapalhou a experiência, que
teve novidades. A massa sentada no escuro deixou de lado o habitual
recato e deu vazão a emoção, cantando harmoniosamente música após
música, verso após verso. O que foi muito bom, por, pelo menos,
dois motivos: o coro estava suave e afinado; o som estava péssimo.
Mas tudo bem, “hoje é carnaval”**.
Desde
a abertura, as caixas de som vibravam ruidosamente. E o artista
repetiu a entrada. Constatei, subitamente, que ele não tem uma voz
maravilhosa e está longe da vocação para showman, embora fizesse
umas piadinhas engraçadinhas das quais o público ria muito. Mas
deixo claro que gostei, se não, não escreveria sobre, até porque,
como bem diz um dos versos, se não for amor, não diga nada, por
favor*. Lindo, não? É, como eu disse, bonito, ver as pessoas na
plateia cantando as músicas de Benito. Há versos muito inspirados
que ficam na saudade.
No
balanço das ondas a gente se equilibra e, no embalo do palco,
navega. Minha visão de plateia de cidade do interior como a minha é
que ela aplaude até espirro de artista. Não haveria mesmo de ser
diferente com o músico que ainda hoje melhor representa sua terra.
Venho muito aqui, mas não canto, disse ele sorrindo. E repetiu a
entrada pra ver se o som se acertava, claro. E também para sentir de
novo o calafrio da acolhida. Foi bonito.
Família
acompanhando no palco, familiares na plateia e... de surpresa, entra
o filho do artista, compositor e pianista tímido e talentoso,
generoso nas palavras, que trata o ambiente pelo viés do parentesco,
como um neto crescido que pede à audiência: Bença, vó! A grande
família de Benito de Paula reúne um pedacinho do coração de cada
friburguense. Ficou claro ali. É por isso que repetiu, algumas
vezes, que já sabe aonde vai gravar seu dvd. E avisou sutilmente:
preparem os gogós! Ou, como diz o verso de outra canção: prepare
o seu coração...**
Se
nunca tinha me visto na audiência de um show do cantor, os anos
vieram e me fizeram um pouco mais acostumada com a vida que, de
tempos em tempos, nos dá a chance de rever nossos valores e fazer
coisas que nunca pensamos fazer antes. Ou, de gostar de coisas, de
pessoas, de livros, de ideias, de músicas e melodias que, algumas
vezes, detestamos ontem. “Vou levando a vida do jeito que ela me
levar”*, diz outro verso cantado pela multidão.
No
meio das surpresas, percebi o mérito maior no talento do artista.
Ele é sambista. Como há um hiato de muitos anos desde o lançamento
dos sucessos, disso eu não me lembrava. E se, como diz outra letra
de um baiano, cantado por um compositor vizinho, chamado Martinho -
“quem não
gosta de samba, bom sujeito não é”** -
então, gente, Benito é um bom sujeito. E que foi trazido ao palco
aqui por um certo Jaburu para cantar e embalar sua terra.
Moço, aumente esse samba que o verso não para!*. Bonito, Benito!
Moço, aumente esse samba que o verso não para!*. Bonito, Benito!
*
Frases com um asterisco são versos de canções de Benito de
Paula.
** Frases ou expressões com dois asteriscos são, pela ordem: Tom Jobim em Samba do Avião; Milton Nascimento e Ferreira Gullar em Bela, Bela; Zé Keti e Pereira Matos em Máscara Negra; Geraldo Vandré e Theo de Barros em Disparada; Dorival Caymmi em Samba de Minha Terra, cuja memória que tenho é da letra na voz de Martinho da Vila.
** Frases ou expressões com dois asteriscos são, pela ordem: Tom Jobim em Samba do Avião; Milton Nascimento e Ferreira Gullar em Bela, Bela; Zé Keti e Pereira Matos em Máscara Negra; Geraldo Vandré e Theo de Barros em Disparada; Dorival Caymmi em Samba de Minha Terra, cuja memória que tenho é da letra na voz de Martinho da Vila.
*** Jornalista, formada em História e Comunicação. Trabalhou na
Assessoria de Comunicação da Firjan, Regional Friburgo.
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