Novembro de 2016
* Por
Frei Betto
Todo final de ano, a
mídia faz o balanço das principais notícias dos 12 meses anteriores. A tragédia
de Mariana e os massacres terroristas em Paris (Charlie Hebdo e Bataclan) sem
dúvida merecerão destaque.
Em novembro de 2016,
um ano depois, os dois fatos voltarão a ser destaques na mídia. Não é preciso
ter bola de cristal para adivinhar que seremos informados de que, em Mariana,
as vítimas que sobreviveram ao mar de lama continuam desamparadas, vivendo em
condições precárias, à espera do cumprimento de promessas do governo e da
Samarco que, um ano depois, não saíram do papel.
Enquanto isso, o
minério continuará a ser abortado do ventre de Minas, sem que as condições de
preservação ambiental estejam efetivamente asseguradas.
De Paris, veremos de
novo as fotos da mortandade causada pelo terrorismo. E, mais uma vez, as
imagens dos aviões em choque com as torres gêmeas, em Nova York, em 2001, para
enfatizar que ali se perpetrou o maior atentado terrorista da história.
Mentira. Os dois
maiores atentados terroristas foram as bombas atômicas lançadas pelos EUA, em
1945, sobre a população civil de Hiroshima e Nagasaki. Morreram 129 mil
pessoas, segundo os estadunidenses, ou 246 mil, de acordo com os japoneses. Sem
contar os efeitos colaterais indeléveis no corpo e na alma dos poucos que
sobreviveram.
Terão os aliados
ocidentais derrotado o Estado Islâmico até novembro de 2016? Se analisarmos os precedentes, paira a
dúvida. O Ocidente, frente ao inimigo, reage por uma única via: a lei do
talião, olho por olho, dente por dente. Assim, derrotada a Al-Qaeda e morto Bin
Laden, surgiu o Estado Islâmico com muito mais força, por dominar um território
entre o Iraque e a Síria, e muito mais ousadia cruel.
Há 16 milhões de
muçulmanos na Europa Ocidental, e não podem nem devem ser identificados como
aliados do terrorismo. Porém, são discriminados e tratados como cidadãos de
segunda classe. Como evitar que tantos jovens cresçam sem ressentimento e ódio
no coração? Como possibilitar a eles um sentido de vida que, de um lado, não
seja o de mero consumista em uma sociedade altamente competitiva e, de outro, o
de "mártires" suicidas do fundamentalismo religioso?
O Ocidente ainda não
fez mea culpa das atrocidades perpetradas no Oriente, movido pela cobiça do
petróleo. Por que os EUA e seus aliados europeus apoiaram, por tantos anos, a
família al-Assad, na Síria; Saddam Hussein, no Iraque; Kadafi, na Líbia; para
depois atirar essa gente na lata de lixo da história? Por que a CIA financiou
Bin Laden como seu principal agente no Afeganistão ocupado pelos russos?
O profeta Isaías
proclamou, sete séculos antes de Cristo, que a paz só virá como fruto da
justiça. Jamais do mero equilíbrio de forças.
Enquanto a busca da
paz for movida por ódio, preconceito e discriminação, a espiral da violência
crescerá. A tão apregoada democracia política, da qual o Ocidente tanto se
gaba, só deixará de ser mera falácia capitalista quando houver de fato, para
7,3 bilhões de pessoas que habitam a Terra, a sonhada democracia econômica.
* Frei Betto é escritor, autor de “O
que a vida me ensinou” (Saraiva), entre outros livros.
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