Sobre quem “paga o pato”
* Por
Lula Miranda
Leio a notícia de que
o estado do Rio de Janeiro pode vir a fechar quatro bibliotecas-parque por
falta de recursos, o que causará, fora a imensurável perda do serviço à
comunidade, a demissão de cerca de 150 pessoas. Já havia lido, alguns meses
atrás, que União, estados e municípios haviam suspendido projetos de criação de
novas bibliotecas, bem como suspendido e/ou cancelado alguns programas de
aquisição de livros para distribuição aos alunos da rede pública.
Quem vai 'pagar o
pato' pelo cancelamento dessas ações ou programas?
Os empresários em
geral, particularmente os da Fiesp, não gostam de pagar impostos. Alguns destes
[a minoria, decerto], juntamente com os da FIRJAN e de outras federações e
associações de empresários, até sonegam, anualmente, bilhões em impostos.
Alguns até, como se sabe, compram julgamentos favoráveis no Carf – julgamentos
estes que poderiam lhes ser desfavoráveis e favoráveis ao Estado.
Eu detesto imposto.
Não aguento mais pagar tanto imposto. Creio que você também, caro leitor. Afinal,
como o próprio nome diz, não é algo que a gente escolhe pagar por livre
iniciativa: trata-se de algo imposto.
Porém, assim como
você, em contrapartida, e paradoxalmente, gostaria de ter um serviço público de
qualidade.
E, também, tal qual
todo mundo, não aguento mais o serviço precário prestado pelas três esferas do
Estado brasileiro: União, estados e municípios.
E o serviço é
precário, vale observar, em parte pela incompetência de alguns governantes,
decerto, mas, em grande medida, pela falta de recursos.
Pois, parece-me fácil
entender: falta de recursos resulta, em última instância, em falta de serviços
e equipamentos públicos de qualidade para a população. Esta é, portanto, uma
equação de fácil compreensão e assimilação.
E, vale salientar
ainda, essa "última instância" aí da equação, os chamados
"clientes" desses serviços que deixam de ser prestados, somos nós
mesmos: eu, você e a maior parte do povo brasileiro. Exatamente como no caso
citado dos livros e das bibliotecas. Mas poderia falar também na falta de
creches nos municípios brasileiros ou no péssimo atendimento nos hospitais
públicos.
Vale observar, porém,
que os empresários não sentem tanto a falta desses serviços porque estes podem
pagar pelos serviços prestados pelo Estado.
Isso nos leva então a
uma forçosa reflexão.
Afinal, a quem
interessa um Estado sem recursos, fraco, incompetente e inoperante?
A quem interessa o
chamado "Estado mínimo"?
A quem interessa um
Estado que seja um mau prestador de serviços à população?
Simples: àqueles que
anseiam pela privatização dos serviços prestados "gratuitamente" por
este mesmo Estado. Note-se que o termo gratuitamente aí está entre aspas, pois
esses serviços são pagos pelos nossos impostos. De "gratuito", portanto,
não tem nada.
Entendeu onde
devemos/podemos chegar? Percebeu que o discurso do empresariado não nos serve;
serve apenas aos interesses destes próprios empresários?
Ora, por que a Fiesp
diz, falseando a verdade, que, com a implantação da CPMF, é você quem vai
"pagar o pato"?! Afinal, quem é o pato nessa lagoa?!
Sim, não resta a menor
dúvida, se houvesse menos desperdício de recursos públicos e se ao menos a
corrupção fosse menor, sobraria mais recursos. Sem dúvida. Há que se concordar
com essa linha de raciocínio. Mas essas [a eficácia no gasto e o combate à
corrupção] são metas a serem perseguidas (e alcançadas) no médio e longo prazo.
Ao passo que necessitamos de mais recursos para hoje. Imediatamente. Pois
passamos por um momento de crise.
Parece evidente que,
com a crise econômica que abala o mundo e afeta também o Brasil, além de outros
países, bem como os estados e municípios, todos os Estados sofrem com a falta
de recursos para custear os seus gastos e manter funcionando a máquina a pleno
vapor.
Uma senhora, bastante
distinta, confidenciou-me, recentemente, sua história de vida, que é comum a de
muitas mulheres brasileiras. Contou-me que, quando se separou do marido, chamou
os filhos para uma conversa franca e lhes disse que, daquele dia em diante,
todos teriam que trabalhar pra ajudar na manutenção da casa, porque ela não
conseguiria só com o seu salário.
Assim é o Estado
brasileiro. Sem mais recursos, num momento de crise, não consegue dar conta de
prover o sustento de todos os seus filhos - notadamente dos mais carentes, por
suposto.
Portanto, advirto-lhes
uma vez mais, tento lhes fazer ver que, no final das contas, é exatamente o
contrário do que diz a "desinteressada" Fiesp.
Se a CPMF não for
aprovada, é você, cidadão brasileiro e consumidor dos serviços prestados pelo
Estado (saúde, educação, segurança pública, infraestrutura, lazer etc.), quem
irá 'pagar o pato'.
*
Poeta e cronista
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