quarta-feira, 30 de maio de 2018

Declarações moribundas - Lisa Alves


Declarações moribundas

* Por Lisa Alves

Éramos filhos de gerações – que não geravam ações, apenas a experiência de erros que não deveriam ser repetidos.
 
Éramos muitos: fardados, naturalistas, modistas e contra tudo que fosse dito proibido.
 
Éramos luz e trevas ao mesmo tempo – e ainda assim ajoelhávamos nas catedrais espirituais em busca de alguma salvação.
 
Éramos príncipes, plebeus e as vezes democratas que sacudiam as ruas com placas e faixas reivindicando alguma mudança na consciência coletiva.
 
Éramos trabalhadores e acreditávamos que a carga horária do dia nos tornaria a futura elite do país.
 
Éramos bárbaros – matávamos por comida e por um pouco de fogo e sexo
 
Éramos pré-colombianos, pré-greco-romanos, pré qualquer coisa escrita pela história oficial. – e ainda tiveram a ousadia de nos catequizar, estuprar e classificar nosso chão de Brasil Colônia.
 
Éramos revolução industrial: fábricas, camponeses em áreas urbanas, favelas crescendo, densidade demográfica, fome, miséria e falta de saneamento básico.
 
Éramos anarquistas, comunistas, populistas e fazíamos reuniões politico-intelectuais sem ao menos sentirmos no paladar o gosto do feijão requentado. (ou até a falta do mesmo)
 
Éramos padres e madres – rezávamos antes mesmo do sucumbir do sol e em noites enluaradas éramos insistentemente perseguidos pela voz do Demônio da Luxúria.
 
Éramos Ladys e gentlemans – frequentávamos as melhores festas, fumávamos charutos contrabandeados e no final do mês nossos cheques especiais estavam estourados.
 
Éramos artistas marginais – escultores, pintores, escritores e compositores. Até o dia em que a Industria Cultural levantou uma cerca e transformou as grandes obras em linhas de produção.
 
Éramos leais militares – direita, esquerda, volver! Nossa marcha era conduzida pelo patriotismo, idiotismo e porquê não dizer: fascismo!?
 
Éramos a pequena burguesia – cidadãos médios, assalariados, diplomados, comungados e porquê não dizer: conformados!?
 
Éramos tudo isso – um bando de ações que mataram as gerações.
 



* Poetisa e jornalista.

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