Poliglota
*
Por Luciane Evans
Rádinho
à pilha no ouvido. Torcida tensa. Timão em campo. Domingo e
dia de jogo em Governador Valadares,
no Vale do Rio Doce, interior de Minas. O sol escaldante exigia uma
boa gelada para ajudar torcedores a engolir as falcatruas
do juíz . E não é pra menos. Antes mesmo dos 5 minutos do
primeiro tempo, o homem já havia tirado dois cartões amarelos e
muitos apostavam que o vermelho não ia custar a sair.
O
que era tensão virou desespero. As duas torcidas (não cabe aqui
dizer quais eram os times) já estavam indignadas com a postura
daquele homem todo de preto, que achava que ter um
apito em mãos era o mesmo que ter o rei Pelé na
barriga. A coisa esquentou quando o juiz marcou um
pênalti que nem mesmo a torcida que seria beneficiada acreditou no
que via. No auge da baderna, os palavrões dos fanáticos
prejudicados ganharam o estádio.
Era
xingamento para tudo quanto é lado. "Vai roubar da mãe",
dizia um. "Viado que gosta de.....", gritava outro.
"Fedaputa sem vergonha, chupador...", esbravejava algum sem
noção. Bom, as frases eram disso para pior. Mas ninguém
contava com a astúcia de "Seu Joaquim" - homem pacato,
honesto, com três filhos marmanjos e uma moça prestes a se casar.
Com a sua bermuda surrada e o chinelo de dedo tradicional do domingo,
Seu Joaquim, que não perde a paciência por nada nesse mundo, não
aguentou ver o timão levar de goleada por roubo de juiz.
Aliás, ninguém aguenta.
Mas
com Seu Joaquim foi diferente. A paciência perdeu o limite. E vendo
os companheiros soltando a franga (na melhor das intenções) ele
respirou fundo, pois a essa altura o sangue já estava quente.
Encheu o peito, levantou da arquibancada (ainda cambaleando de
raiva), olhou para o juiz e com todo o ódio que lhe cabia
lascou o palavreado: "Seu poliglota!!!!!!!!". Ninguém mais
disse uma palavra sequer.
*
Jornalista.
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